O Brasil visto em perspectiva em dezembro de 2012 já não é o mesmo neste janeiro de 2013, e o que surpreende a todos, incluindo o governo, é a intensificação das pressões inflacionárias e a forte reversão das expectativas otimistas que foram forjadas para este ano.
Saindo de um crescimento baixo da economia e inflação alta, o Brasil defronta-se logo ao início deste ano com um quadro altamente complexo que coloca em risco elevado as projeções favoráveis.
Tendo poucos pontos fortes para estimular o crescimento, quais sejam, juro baixo para impulsionar a economia e estimulo ao consumo via crédito, ancorado no ainda aquecido mercado de trabalho, e não podendo alterá-los sob risco de comprometê-los em seus objetivos, o governo, via Banco Central do Brasil, optou por enfrentar este quadro nebuloso e imprevisto no inicio do ano forjando a apreciação do preço do real ante o dólar, numa estratégia arriscada e que pode enfrentar fatores oponentes resistentes e até comprometer o contexto macroeconômico do país.
Medidas macro prudenciais também são inviáveis neste momento, visto que repercutiriam sobre o crédito e na ponta no consumo.
O governo, além da postergação negociada de reajustes de serviços pontuais para esta época do ano, reduziu as tarifas de energia elétrica; determinou um aumento de salário mínimo bastante discreto; etc…, a tendência de alta na inflação persistiu e, então, restou como opção a utilização do preço do dólar depreciado como uma “ancora de esperança”. Afinal, com o IPCA-15 de janeiro atingiu-se 6,02% de inflação nos últimos 12 meses e, provavelmente, com o IPCA de janeiro, o acumulado ficará neste entorno, devendo ser considerado que os reajustes dos transportes foram postergados para meados deste ano.
O dólar depreciado acentua as importações de bens finais e insumos pressionando para baixo o preço praticado internamente, se bem que no exterior também ocorreram alguns ajustes de preço em moeda estrangeira, e impacta também nos preços dos alimentos internamente, já que somos importante exportador de “commodities” agrícolas que devem repercutir a queda do preço do dólar.
Assim, resulta que temos uma combinação de política cambial e política monetária “heterodoxa”, com a SELIC, instrumento básico para influir sobre a inflação, sendo utilizada para impulsionar a atividade econômica, enquanto o câmbio, que é dito “flutuante” sobre o qual caberia ao BC se eximir de influenciar sobre o preço e no seu comportamento, passa a ser utilizado de forma mais acentuada como efetiva “ancora” principal, ainda que possa não ser admitida pelo governo, no esforço de provocar a reversão da tendência da inflação.
Esta prática de utilização da taxa cambial, real apreciado, para conter pressão inflacionária tem sido contumaz na ultima década, porém com o câmbio como coadjuvante da taxa SELIC, nunca isoladamente.
Mas, o cenário presente é um pouco diferente. O Brasil já não tem a atratividade externa que detinha anos atrás, o nosso fluxo cambial tem se mostrado fragilizado e com viés de piora, e este é um ponto de resistência a uma queda mais intensa do preço da moeda americana, e, além disto, o mercado de derivativos que era extremamente especulativo no Brasil tem amarras normativas vigentes que lhe tira a capacidade de artificializar facilmente a taxa cambial.
Desta forma, o governo pode desejar o preço da moeda americana desvalorizada, mas há fatores limitantes a isto presentes no próprio mercado.
Os bancos estão chegando ao final do mês “vendidos” no mercado de derivativos e, também, “vendidos” no mercado de câmbio à vista, e isto é atípico, sendo razoável que irão às compras e, por mais habilidosos que sejam, exercerão uma pressão de demanda que será um fator a mais limitante. No todo, quase US$ 12,0 Bi em posições “vendidas”, acentuadamente no mercado de cambio à vista.
Neste mês de fevereiro, os bancos deverão pagar ao BC algo como US$ 1,2 Bi das vendas que realizaram nas operações conjugadas de dezembro, e mais, US$ 2,8 Bi em março.
Terão que adquirir estes montantes no mercado à vista para entregá-los ao BC, ou noutra hipótese, terão que utilizar linhas externas para obter os dólares ou ainda, o BC poderá realizar novas operações conjugadas.
Ocorre que num cenário que pode estar sugerindo fluxo cambial negativo, os bancos, se não obterem cobertura diretamente do mercado, poderão utilizar uma das duas alternativas, porém poderão dada a incerteza, realizar o “hedge” e isto será pressão de compra no mercado de dólar futuro, que tenderá a elevar a taxa e contaminará a taxa do mercado à vista.
O BC poderá ofertar “swaps cambiais” no mercado futuro para dar liquidez a que realizem o “hedge”.
Vemos em perspectiva a intensificação das intervenções do BC buscando neutralizar pressão de alta na taxa cambial e, isto poderá chegar a necessidade de realizar leilão de venda de dólares à vista, utilizando nossas reservas cambiais.
Mercado de câmbio com taxa claramente artificial e com presença forte do governo interferindo nos preços representa efetivo risco para os investidores, e isto poderá inibir os ingressos de novos investimentos, de todas as naturezas, e precipitar a saída dos investimentos presentes ao primeiro sinal de que a taxa cambial possa subir.
O cenário para o mercado de câmbio está muito complexo, mas devemos ter em mente que o governo pode manipular a formação do preço até um certo ponto, não sendo algo tão fácil como vem sendo colocado, tendo em vista que o contexto atual – fluxo cambial negativo e mercado de derivativo com “amarras” – difere do cenário passado quando o governo utilizou a apreciação do real para conter a inflação e atribuía a causa ao intenso fluxo de recursos para o país.
É preciso muita atenção, a “areia é movediça”.