É até compreensível, a autoridade monetária não pode fazer suas projeções com o “lança chamas” à mão, mas inegavelmente não dá mais para validar-se visão prospectiva ancorada num cenário de referência que utiliza Selic a 8% e dólar a R$ 2,10.
Como o cenário real sugere minimamente a Selic em 9% e dólar em R$ 2,20, com a ressalva de que estes dois pilares mesmo nestes patamares sugerem viés de alta, é necessário fazer ajustes nas projeções divulgadas.
O crescimento do PIB de 2,70% é projeção que já pertence ao passado, hoje a realizada pelo mercado financeiro e divulgada pelo Boletim Focus do BC sugere 2,46% e mesmo esta já parece fora do ponto.
A projeção da inflação em 6% é mais realista do que a até então vislumbrada pelo mercado financeiro e expressada no Focus, algo como 5,86%, mas a ideia de convergência para o centro da meta sempre propagada pelo BC para 2014, 2015, parece afastada da realidade, já que há inúmeros fatores à margem do “gerenciamento e alcance” das autoridades monetárias que impulsionam as pressões inflacionárias.
O Brasil cultiva fortemente a visão retrospectiva do comportamento da inflação e com isto realimenta a visão prospectiva, problema típico de um país que ainda convive com a memória inflacionária predominante por décadas, e ainda persistem em uso índices ultrapassados para indexar a economia.
Os salários vêm sendo reajustados num processo disforme com a produtividade, e isto só poderá ser corrigido com o esfriamento do mercado de trabalho e até algum sinal de desemprego. Há um claro descompasso entre o comportamento do mercado de trabalho aquecido e uma economia que apresenta crescimento pífio.
Enfim, o governo enfrenta um quadro extraordinariamente complexo que evidencia um quadro inflacionário ainda aquecido num ambiente em que o país precisa necessariamente reconstruir sua linha de crescimento. E, sabidamente, não é viável crescer e combater a inflação, pois sugerem medidas antagônicas. Insistir sem fazer a opção neste “Dilema de Sofia” tende a resultar em absoluto e duplo insucesso.
Como temos salientado, o modelo de crescimento do qual o governo se prevaleceu nos últimos anos está esgotado, embora persistido e com resultados que indicam insucesso no presente. Já não há a capacidade ociosa no parque industrial e nem a demanda reprimida que foi estimulada ao consumo com a facilitação do acesso ao crédito, que permitiram o crescimento com baixíssimo investimento.
Agora, o crescimento é totalmente dependente do incremento do investimento, ainda muito baixo para uma economia da dimensão da brasileira. E, esta necessidade passa pelo setor produtivo, mas também necessariamente pela infraestrutura do país, que esta sucateada e representa um custo adicional que conspira contra a competitividade do país.
O país desperta pouca atratividade no mercado internacional, perdeu o carisma turbinado por “virtudes” que faziam acreditar que o “país do futuro” havia chegado, e hoje é avaliado por suas fragilidades, o que nos deixa em desvantagem perante demais emergentes.
E dentre tantas, os olhares externos focam a política fiscal expansionista, com gastos de baixa qualidade, que poderá levar o país a não atingir as metas prognosticadas pelo governo, e, que contribuem fortemente para as pressões inflacionárias.
E mais, o crescente déficit em transações correntes que está sugerindo que o país seja levado a ter que utilizar parte de suas reservas cambiais para complementação do financiamento, de vez que poderá não vir a ser suprido totalmente pelas captações externas.
Erros foram cometidos devido à má observação preventiva dos sinais externos de perda de atratividade pelo país, e que sugeriam que as barreiras tributárias obstrutoras ao ingresso de capitais estrangeiros no país fossem retiradas já ao final do ano passado.
Tardiamente, e somente depois de instalada uma perspectiva desfavorável mais intensa de fluxos de recursos externos para o país, agravados pela expectativa de que a liquidez no mercado financeiro global venha a recrudescer face à redução gradual do programa americano de apoio monetário ao soerguimento de sua economia, o governo brasileiro decidiu desonerar os fluxos de capitais externos direcionados ao país e outros fatores limitantes operacionais.
O governo vislumbrou num momento passado “tsunamis” que não insinuaram sequer ocorrer, e hoje convivemos com um ambiente de “ressaca” de fluxos externos, de difícil reversão.
Nossa balança comercial, dependente das “commodities” e da China, sucumbe ante a realidade que sugere que o “boom” das “commodities” passou e a economia chinesa vai mais devagar, e assim, deve apresentar baixíssima contribuição para o fluxo liquido de recursos ao país, até porque, também, as importações continuam em elevação e direcionadas à complementariedade da oferta no nosso mercado interno, na forma de insumos e/ou produtos acabados.
O preço do dólar mudou de patamar ao final deste 1º semestre fruto de mais de contraditórios entre o aperto sugerido pela política monetária e certo conforto declarado pelas autoridades com o dólar em alta, que provocou uma afoita busca de proteção cambial (hedge) no mercado futuro de dólar, onde a liquidez está baixa, provocando alta exacerbada, fruto também de especulação havida por parte dos fornecedores de liquidez adicional à que o BC buscou promover com os leilões de “swaps cambiais”.
A isto se somou a leitura errática do discurso do Presidente do FED, que sinalizou possível redução do programa monetário americano para o final deste ano, com redução no ano que vem, mas com uma série de “condicionantes e condicionais”, que melhor observados posteriormente retiraram um pouco o espaço dos especuladores e tornou menos afoita a demanda.
O Brasil não teve, ainda, alta do preço do dólar decorrente do fluxo cambial no mercado à vista, que, contudo, está ruim, após dois meses de melhora face à negociação das safras agrícolas.
O preço do dólar, no nosso entendimento, tem propensão à alta gradativamente ao longo do ano repercutindo a queda do fluxo cambial líquido que impactará no mercado à vista, e que não é contornável pelo BC com as ofertas de “swaps cambiais”, que não são dólares, mas tão somente instrumentos financeiros indexados a dólares e juros em troca, e que se prestam a garantir taxa cambial fixada aos adquirentes.
Mas, como o preço subiu para o intervalo entre R$ 2,15 a R$ 2,20 precocemente por problemas de estratégia e contradições ocorridas entre declarações e posturas de membros do governo que alavancaram o preço, será difícil fazê-lo recrudescer, devendo haver volatilidade neste intervalo decorrente dos movimentos de aumento de oferta que depreciam os preços do dólar alternados por aumento de demanda que apreciam os preços, mixando também com movimentos menos afoitos de busca de “hedge” por parte das empresas expostas em moeda estrangeira.
Hoje, contudo, como é o dia da fixação do PTax que é utilizado para os ajustes nos mercados futuros, e, mais importante ainda por ser o fechamento do semestre das instituições financeiras, devemos ter pressão entre “comprados” e “vendidos” no mercado futuro, que contaminará a taxa do mercado à vista.
Natural que o BC interfira para evitar que esta disputa enseje distorções acentuadas no preço da moeda americana, como já ocorreu e pode continuar ocorrendo com oferta de “swaps cambiais”.