Os ânimos dos mercados globais estavam um tanto quanto negativos ante a perspectiva do inicio do desmonte do programa americano de incentivo monetário ao final deste ano e o término do mesmo em 2014.
Afinal, a “farra” promovida pelo excesso de liquidez predominante que alavancava o preço dos ativos financeiros, nem sempre ancorados em fundamentos críveis, estava por terminar e o bom humor e euforia dos mercados sinalizava estar chegando ao fim.
Contudo, bastou a ata do FOMC e a palavra mais cautelar do Presidente do FED, Ben Bernanke, revisar o imediatismo posto em sua declaração antecedente para o término do programa, projetando-o para um período provavelmente mais longo e identificado com alguns indicadores fundamentais, como o relativo ao emprego na economia americana, para que o “instinto animal” dos agentes e investidores fosse retomado, e de forma exacerbada ocorresse um ajuste forte de recuperação dos preços, nem sempre identificado com fundamentos.
Bolsas americanas e do resto do mundo saudaram a nova sinalização com expressivas altas. Até a nossa deprimida Bovespa, carente de razões e motivos sustentáveis, entrou na “onda” e consumou expressiva alta, mas não acreditamos que, afora a explicação de que os preços estão baratos e uma modificação de critérios contábeis pela Petrobrás, haja maior justificativa para que o movimento se transforme em tendência sustentável.
O dólar assumiu trajetória de depreciação no mercado internacional, enquanto as taxas de juros dos “treasuries” retrocederam, marcando o retorno de aplicações nestes papéis, que assim passaram a sinalizar valorização, fechando naturalmente a curva de juro “yeld”.
Enfim, os “bons tempos” estão de volta, se bem que por tempo incerto, mas a convicção é de que o término do programa seja mais prolongado do que estava previsto, até porque é crescente o sentimento de que o FED não poderá revertê-lo de forma abrupta, sob risco de anular os avanços obtidos. Na realidade, um pouso suave, absolutamente confortável para o mercado financeiro global, isto é o que se espera efetivamente.
Mas, se isto provoca otimismo imediato nos mercados financeiros, a crise econômica ainda continuará prevalecendo em ritmos desconformes nas economias ditas desenvolvidas, e, agora tendo também a parceria dos países emergentes, que mudaram de lado e atravessam momento de perspectivas não tão favoráveis quanto foram imaginadas, visto que “passaram recibo”, que são efetivamente dependentes das grandes economias, e isto serve inclusive para o emergente maior, a China.
Mas precisamos ter moderação em relação ao Brasil que atualmente enfrenta um momento muitíssimo complexo, talvez único, o que o diferencia de todos os demais países, e o coloca fora de foco nos radares dos investidores estrangeiros.
Tem crescimento pífio e inflação alta, o que obriga a elevação do juro e uma política econômica extremamente conflitante, pois almeja conter a inflação e, também, incrementar o crescimento. São contextos antagônicos, cujas ações se confrontam e impedem o sucesso, e que, a rigor, podem colocar o país num cenário de estagflação.
O consumo, que foi estimulado através da forte expansão do crédito para alavancar o crescimento, dá sinais de exaustão, tendo ficado no “zero” de crescimento em maio, mês que normalmente tem crescimento robusto devido ao Dia das Mães. O emprego já não gera números eufóricos como num passado recente e a indústria já começa a desempregar.
Tem uma política fiscal que por ser expansionista, confrontando com o discurso do governo, revela grande dificuldade para alcançar o superávit primário objetivado de forma confortável e incontestável e que é um fator de contingência para a capacidade de investimentos por parte do governo, num momento em que ressaltam inúmeras demandas estruturais, além das mais recentes demandas de forma incisiva por parte da população.
Como perdeu atratividade por parte dos investidores externos, pela deterioração de sua economia e o governo foi extremamente retardatário na liberação das barreiras tributárias que impôs ao ingresso de capital estrangeiro, atravessa um momento de “ressaca” de ingressos de recursos externos, por ter imaginado erroneamente que seria vítima de “tsunamis”.
O momento renovado do mercado internacional, face ao novo entendimento sobre as perspectivas em torno do programa americano, provavelmente desanuvie o entendimento a respeito do que ocorre efetivamente com o Brasil, derrubando a tese frequente de que tudo de ruim que aflige o país decorre dos movimentos no exterior, evitando que ocorra uma efetiva “mea culpa” a partir do olhar critico focando as nossas próprias fragilidades.
A expectativa de que o programa de concessões/privatizações para revitalização da infraestrutura possa atrair consideráveis volumes de investimentos externos, pode ter sido maculada com as acomodações realizadas recentemente nas tarifas de serviços para atender ao conclamo da população. É preciso observar até que ponto isto pode ter agravado o conceito de risco político e que efeitos terá sobre as decisões dos pretensos investidores.
Portanto, é preciso sensatez, visto ser bastante provável que o Brasil não conquiste fluxos externos na proporção de suas necessidades atuais, que seriam importantes e fundamentais para atenuar as pressões advindas do déficit em transações correntes em forte expansão.
Ontem, o BC flexibilizou mais uma vez e mais um item das barreiras normativas que dificultaram o ingresso de recursos externos no país.
Através da Circular 3.662 modificou a fórmula de cálculo do requerimento de capital para cobertura de risco das exposições em moeda estrangeira, ouro e outros ativos e passivos sujeitos a variações cambiais por parte dos bancos brasileiros.
Para o cálculo desta parcela a fórmula considera 3 fatores: Exposição direcional do banco; a correlação imperfeita entre moedas (tomado numa moeda e repassada noutra) e o fator que exigia capital em função de existir um descasamento entre as operações no Brasil e no exterior.
A modificação se deu no fator que exigia capital que teve a sua ponderação reduzida de 100% para zero.
Este fator representava o empecilho maior por representar elevado custo nas operações de captações de recursos realizadas por subsidiárias/filiais de bancos brasileiros no exterior e depois repassadas às suas Matrizes no Brasil.
Afora esta expressiva desoneração, há que se considerar uma a mais já que as operações realizadas pelas subsidiárias/filiais ficam sujeitas a consideração no custo o risco do país onde estão estabelecidos e não o custo Brasil, que tem sido elevado recentemente.
Trata-se de uma “janela” a mais para tentar buscar recuperação de fluxo de recursos externos para o país. “A priori” não vislumbramos grandes volumes, porém pode fomentar a arbitragem de taxas de juro para aplicações no Brasil, em empréstimos ou mesmo em aplicações diretamente em títulos do governo. Este pode ser um fator motivador.
No que diz respeito às perspectivas para o comportamento da taxa cambial no Brasil, entendemos que a mudança do contexto externo pode não viabilizar fluxos de recursos para o país, como já explicitamos, mas pode atenuar momentaneamente as pressões já especulativas com fundamentos que predominam no mercado futuro, onde os fundos estrangeiros realizaram movimento de alteração de posicionamento de vendido para comprados da ordem de US$ 15,0 Bi no período de 1 mês.
A formação de taxa cambial no Brasil foi afetada inicialmente por demanda efetiva de “hedge” no mercado futuro, sobre a qual o BC atuou ofertando “swaps cambiais”, ainda assim sem lograr pleno êxito. Contudo, neste momento há pressão, já com visível componente especulativo, a partir do mercado futuro, mas, também, no mercado a vista, onde a liquidez esta ficando escassa.
Em razão deste novo ponto de pressão é que o BC está liberando amarras para buscar viabilizar fluxo de recursos, como fez ontem e como já vem fazendo recentemente, com destaque para a liberação do compulsório sobre as posições “vendidas” dos bancos, que, ao que parece, o BC espera que passem a dar liquidez ao mercado.
Contudo, como já temos destacado, pode haver resistência por parte dos bancos para assumir posições vendidas num ambiente prospectivo ruim para o fluxo de recursos, o que obrigaria o BC a fazer leilões de oferta de dólares efetivos, o que não seria conveniente pelo risco de estimular forte especulação sobre o real.
Entendemos que a despeito da melhora de humor do cenário global, o Brasil colherá poucos benefícios e será muito difícil reverter a taxa cambial dos parâmetros presentes, embora as pressões especulativas possam perder um pouco de força temporariamente.