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O difícil embate do BC com a pressão de alta sobre o preço do dólar, em tempos de escassez de fluxo cambial positivo e necessidade de preservação das reservas cambiais do país

Distante está aquele tempo em que o Brasil era o oásis financeiro do mundo, centro da atratividade maior dos capitais de qualidade e especulativos que buscavam rentabilidade fácil decorrente das oportunidades do nosso mercado interno e da elevada taxa de juro proporcionada pelo país, absolutamente assimétrica em relação ao seu conceito de risco, que em face à excelência o conduziu ao rating de “investment grade”.

Atualmente os tempos são outros. O país perdeu atratividade, o mundo global financeiro passou a analisá-lo mais pelas fragilidades e menos por suas virtudes, que hoje parecem ter sido bruscamente reduzidas na visão dos investidores estrangeiros. Vive, então, temporada de ressaca de fluxos líquidos de capitais estrangeiros, num ambiente que potencializa o déficit em transações correntes, que demanda volume substantivo de dólares.

Por outro lado, a inversão do cenário surpreendeu inúmeras empresas com passivos em moeda estrangeira, que em decorrência passaram a demandar “hedge” para proteção dos preços dos mesmos.

Primeiro, ocorreu a pressão maior no mercado futuro, demanda por hedge, a qual, atualmente, se agregou a demanda no mercado à vista, demanda para pagamento efetivo.

Num contexto como este não foi difícil o preço da moeda estrangeira galgar rapidamente o preço de R$ 2,30 e, convenhamos, poderá ir além deste ponto.

À margem deste cenário adverso há inflação resistente, crescimento nanico e deterioração dos fundamentos econômicos, em especial na política fiscal, que permanece expansionista por buscar a todo custo fomentar o crescimento, o que conspira contra os esforços da política monetária conduzida pelo Banco Central do Brasil.

O modelo de crescimento iniciado pelo governo anterior explorando a existência de lacunas propicia, ou seja, estímulo do consumo via estímulo creditício, focando a demanda reprimida das classes C e D, o que não exigiu grandes investimentos, por isso, não foram feitos pela indústria que consumiu sua capacidade ociosa e nem pelo governo na infraestrutura para aumentar a competitividade do país, acabou se exaurindo, com o agravante de que a complementariedade da oferta para atender a demanda foi realizada com importações, que, hoje, já representam algo como 25% dos insumos e bens de consumo presentes em nossa economia.

Houve retardamentos nas decisões de desbloqueio as medidas antepostas ao ingresso de recursos externos no país. Perdeu-se o ponto ideal e quando implementado já havia ocorrido a mudança de comportamento dos investidores em relação ao Brasil.

Na matéria de hoje no jornal Valor, Jay Dhru, diretor sênior e chefe global de ratings corporativos da agência de classificação de risco de crédito Standard & Poor’s, destaca que o fluxo de recursos externos vai voltar para os emergentes, mas é reticente quando se reporta ao Brasil. Destaca que fluxos de capitais são bastante influenciados por dois motivos: liquidez do mercado e fundamentos econômicos. E mais, que os fluxos de capitais para as economias emergentes não voltarão aos níveis anteriores, pois a desaceleração da China continuará a impactar o desempenho desses países. Destacou que no caso do Brasil outro fator que prejudica a retomada dos fluxos de capitais é a deterioração dos fundamentos da economia, o que reduz a atratividade dos bônus corporativos do país. E menciona que a desaceleração do PIB do Brasil e as incertezas políticas terão impacto no setor corporativo.

Importante lembrar que em junho a S&P revisou a perspectiva do rating soberano do Brasil (BBB) de estável para negativa, citando a decepção com a taxa de investimentos do país, baixo crescimento e política fiscal expansionista.

Afora todas estas percepções já sobejamente conhecidas, temos o mercado de CDS cotando o risco do Brasil em 186,00 pontos, praticamente “downgrade”, que deve ser acompanhado, pois embora seja um mercado especulativo, não deixa de expressar um sentimento em relação ao país.

O BC não tem tido vida fácil no confronto com este cenário desapontador do mercado de câmbio.

Foram revertidas quase todas as normas limitantes e tributárias para o ingresso de recursos estrangeiros, tardiamente é verdade, mas o foram a partir de junho último.

Os capitais estrangeiros de boa qualidade ou até de má qualidade têm a porta aberta outra vez, mas tudo indica que já não têm o Brasil no radar.

Os bancos tiveram retiradas as barreiras para operar com posições vendidas, com a pretensão de que passassem a ser os agentes fomentadores da liquidez que o mercado de câmbio está sinalizando precisar e podendo captar sem o fator onerante que existia recursos externos via suas agências/filiais no exterior para arbitrar no Brasil.

Os efeitos parecem abaixo da expectativa e assim perdura a fase de escassez de fluxos líquidos suficientes de recursos externos.

O BC já fez um dantesco esforço colocando em torno de US$ 32,0 Bi em “swaps cambiais”, que se presta a “hedge” por parte das empresas, e este instrumento já se mostra pouco eficaz para mitigar a tendência de alta da moeda americana, pois não sendo dólar efetivo, aquele que serve para pagar a conta, não consegue mitigar o novo segmento de pressão altista sobre o preço que é o mercado à vista, aquele em que se adquire dólar efetivo para pagar a conta.

Num ambiente em que há pressão de demanda por “hedge” é inevitável que ocorra presença dos especuladores que formam posições, no caso presente, “compradas” que concentram potencialidade para detonar movimentos oportunistas de forte especulação. Fundos nacionais e fundos estrangeiros detêm este posicionamento no momento.

O dólar tem um preço sustentável e fundamentado a R$ 2,30 e isto certamente afetará a inflação, seja qual for a estratégia de política monetária. Consideramos extremamente importante a declaração do Diretor do BC, Carlos Hamilton, reconhecendo esta realidade e mais, destacando que a inflação de julho foi um ponto fora da curva, o que deixa claro que o Copom não se deixará influenciar pelo euforismo excessivo, ocorrido dentro do próprio governo em relação à queda da inflação em julho.

Contudo, no embate no afã de conter ao máximo a expansão da taxa cambial, o BC precisa ir além da venda de “swaps cambiais” para atender a demanda por proteção, havendo agora a necessidade de suprir o mercado de câmbio à vista com dólares efetivos, aqueles necessários para realizar o efetivo pagamento do passivo em moeda estrangeira.

O BC tem evitado,de toda forma, realizar leilão de venda de dólares à vista.

Primeiro, porque seria um sinal claro de fragilização dos fluxos de recursos para o país, deixando evidente que os ingressos estão insuficientes para fazer face às saídas, e isto poderia provocar movimentos especulativos mais intensos sobre o preço do câmbio e teria reflexos sobre o comportamento dos investidores.

Segundo, por ser de toda conveniência que o país preserve suas reservas cambiais, aparentemente grandiosas, mas nem tanto se considerarmos que os recursos estrangeiros em portfólio no país superam o seu montante e eventuais manifestações ou reclassificações por parte de agências de rating, ou mesmo, receios por parte de investidores advindos da necessidade do BC ter de realizar oferta de moeda ao mercado à vista poderá provocar movimento de saída abrupta de recursos do país.

Certamente, o BC realizará leilão de linhas de financiamento para ancorar posições vendidas buscando estimular os bancos a assumirem a geração de liquidez ao mercado, mas mesmo que aceitem em assumir este papel necessitarão de “hedge” para protegê-las e este será um fator de alta do preço.

Acreditamos que evitar a realização de leilão de venda de dólares ao mercado de câmbio à vista seja o grande desafio posto ao BC neste momento. Os bancos poderão assumir a geração da liquidez, mesmo com alguma resistência, mas em realidade já não há estratégias seguras para evitar alta maior do preço da moeda americana.

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