Há muito entusiasmo com o fluxo de recursos especulativos, o chamado “carry trade”, que podemos considerar o “lixo dos recursos externos”, já que nada produz e somente foca rentabilidade provocando exacerbações de preços dos ativos, até porque aumentam os volumes e dão vigor ao giro nos diversos segmentos do mercado financeiro.
E neste ambiente eufórico pouca atenção tem sido dada ao fato de que o déficit em transações correntes, contrariando as expectativas, vem mantendo o vigor e tendendo a continuar evoluindo negativamente para as proximidades de 4% do PIB, e este fato em si é que deixa o país vulnerável na visão de inúmeros analistas e instituições externas, afora outros fatores brasileiros que compõe um “conjunto da obra” pouco sombrio.
Este é um fator neutralizante de fluxos de melhor qualidade e pode ser determinante na não rolagem de parte dos US$ 84,0 Bi vincendos este ano de empréstimos de curto e longo prazo e empréstimos “intercompanies”. E isto já pode estar acontecendo, já que o saldo liquido do fluxo não é tão expressivo e ainda permanece insuficiente para regularizar o montante faltante do ano passado.
Por outro lado, a balança comercial brasileira vem evidenciando desempenho preocupante com um saldo positivo de US$ 112,0 M em março, mas fechando o semestre com saldo negativo consolidado de US$ 6,072 Bi, o pior da série histórica.
E ainda, temos um relevante saldo liquido a liquidar de operações de comércio exterior (importações – exportações) que está em torno de US$ 12,0 Bi.
O movimento de ingressos de capitais de baixa qualidade para o país, salvo o fato de contribuir para que o fluxo cambial no curto prazo não seja negativo no curtíssimo prazo, certamente tenderá a retroceder, caso a taxa cambial permaneça incompativelmente desajustada com a realidade, mantendo o real forte frente ao dólar americano.
Quando afirmamos que o mercado está olhando para um único lado é porque está focado no ingresso destes recursos e demonstra perda de foco no crescimento do déficit em transações correntes, e principalmente, no fato de que o saldo líquido do fluxo cambial não tem sido tão expressivo, o que deixa evidente que o volume de saídas é quase tão expressivo quanto ao ingresso de volumes de capitais especulativos.
Afinal, com os quase US$ 5,0 Bi líquidos ingressados pelo segmento financeiro neste trimestre, ainda não foi possível sequer reduzir parte do fluxo insuficiente de dólares no ano passado que estão sendo suportados pelas posições vendidas dos bancos em torno de US$ 13,0 Bi, financiadas por linhas em moeda estrangeira pelo BC, que assim não deixa evidente o comprometimento de algo em torno de 3,5% das reservas cambiais, pois afinal deveria ter vendido divisas à vista ao mercado e com esta estratégia protela a tomada desta decisão, esperando que o fluxo cambial revele melhora e resolva o problema.
Hoje saberemos como evoluiu o fluxo cambial liquido no período de 24 a 28 de abril e se o saldo fará jus ao intenso ruído que o mercado vem propagando em torno de fluxos intensos de recursos externos direcionados à renda fixa e a Bovespa.
O preço da moeda americana sofreu forte depreciação pós rebaixamento do rating do Brasil, o que se configura absolutamente incoerente, e embora muitos atribuam o fato à precificação do preço e ao intenso fluxos de ingressos de recursos para o Brasil, temos tido e manifestado o nosso entendimento contrário.
O rebaixamento da nota de crédito soberana na realidade pegou a grande maioria dos “players” de surpresa. A ocorrência já estava fora do radar, até do próprio governo.
Os bancos registravam expressiva posição vendida no mercado de dólar futuro e como a tendência natural era de alta, portanto expondo-os a perdas, mas ao mesmo tempo se acentuou o fluxo de recursos especulativos para o Brasil, que foram superlativados, foram habilmente utilizados como “pano de fundo” para justificar um movimento de apreciação do real num contexto tecnicamente antagônico, aproveitaram então para massificar este movimento e ao mesmo tempo, habilmente procederem a reversão rápida do posicionamento vendido no mercado de dólar futuro.
Desta forma, entre o dia 24 a 31 de março reduziram em US$ 7,4 Bi suas posições vendidas de US$ 14,7 Bi para US$ 7,3 Bi no mercado de dólar futuro, enquanto o mercado justificava, por estar olhando para um único lado, que o fator da apreciação do real era o fluxo cambial intenso.
Este movimento bem articulado pelos bancos sinaliza que têm perspectiva de que a moeda americana tende a retomar a linha de apreciação, ou seja, de alta do preço, por isso vem reduzindo as suas exposições em dólar ao risco.
E, se der tempo para continuarem com este movimento, certamente vão zerar suas posições vendidas no mercado futuro pela totalidade e até virar “comprados” em dólar futuro, após o que puxarão a apreciação do dólar, que será, também, a tendência natural.
É só continuar havendo oportunidade para que executem esta manobra completa.
A percepção continua sendo que os fluxos de recursos externos este ano continuarão insuficientes para financiar o déficit em transações correntes, seja pela queda da liquidez internacional e encarecimento e seletividade, seja pela perda de atratividade pelo país dos capitais produtivos face ao baixo crescimento, seja porque, apesar de todas as dúvidas da sra. Janet Yellen, deve ocorrer aumento do juro americano no ano que vem e o Brasil deverá sofrer reversão de capitais já ao final deste ano como reflexos iniciais.
Hoje o COPOM deverá elevar a taxa SELIC para 11,0% tornando o juro mais atraente para o capital especulativo, mas se o dólar não retomar o alinhamento com a apreciação de preço, provavelmente as operações de “carry trade” ficarão menos atraentes.
A rigor, não há dúvidas pelo mercado de que o preço do dólar retomará a tendência de apreciação, dúvidas que existem é sobre a sua tendência para o final do ano.
Nossa projeção continua sendo de R$ 2,60, afinal o país tem muito a pagar este ano e o contexto em perspectiva não é favorável.