Como costumamos afirmar “os números falam e precisamos ouvi-los”, e a situação atual no fluxo cambial sugere que não percamos de vista esta realidade.
A todos os exageros que se presencia no mercado de câmbio atualmente, como a excessiva apreciação do real, rapidamente se atribuí como causa o extraordinário fluxo de recursos externos para o país buscando as oportunidades de rendimentos na renda fixa e nas oportunidades em ações na Bovespa, mas são conclusões desprovidas de observação de visão mais abrangente sobre os fatos e os números do fluxo liquido cambial.
Temos sistematicamente chamado a atenção para o fato de que predomina a observação sobre o mercado de câmbio focando um único lado e por isso ocorre um otimismo desprovido de fundamentos sobre ingressos de recursos externos no país, pois há certo ceticismo sobre o volume quase equivalente de saídas de recursos externos que ocorre em concomitância.
O fluxo cambial líquido efetivo que vem sendo observado não sugere otimismo como se o país estivesse recuperando credibilidade junto aos investidores estrangeiros. A repercussão eufórica, que é diferente de otimismo, decorre do fato do recurso especulativo dinamizar o giro e os volumes de negociação de papéis de renda fixa e ações na Bovespa, pois focam tão somente rentabilidade.
Contudo, há uma intensa saída de recursos de qualidade do país que não está sendo observada com rigor e este é um sinal de que o país ainda está longe de recuperar a sua credibilidade.
Como temos salientado, há um passivo vincendo do setor privado de US$ 83,4 Bi, envolvendo empréstimos de curto e longo prazos e empréstimos” intercompanies”, que poderá ser rolado somente parcialmente, além de saldo líquido a pagar em torno de US$ 12,9 Bi na conta de comércio exterior (exportações-importações), o que não é pouco pois ainda há US$ 15,8 Bi em insuficiência de fluxo que está na posição vendida dos bancos no mercado de câmbio à vista, amparadas por linhas de financiamento em moeda estrangeira da ordem de US$ 13,2 Bi, algo como 3,5% das reservas cambiais.
Os números do fluxo cambial que na semana de 17 a 21 haviam causado demasiado otimismo naturalmente decorreram de fatores pontuais no quesito ingressos de empréstimos já conhecidos, por isso apontou fluxo liquido em março de US$ 5,469 Bi e no ano US$ 5,223 Bi até dia 21.
Tivemos oportunidade de salientar que era um saldo ainda bastante insuficiente face às necessidades do país acima mencionadas.
Na última semana, 24 a 28, o fluxo cambial foi negativo em US$ 2,738 Bi, do qual US$ 2,001 Bi no financeiro e US$ 737,0 M no comercial, e o superávit do fluxo no mês retroagiu a US$ 2,731 Bi e no ano US$ 2,485 Bi.
O país está proporcionando excepcional remuneração bruta, ontem elevada para 11%, e atraiu liquidamente somente US$ 3,954 Bi de fluxo financeiro até o dia 28 de março, quase ao final do fechamento do 1º trimestre.
Efetivamente não há com que se entusiasmar e criar perspectivas tão intensas quanto temos observado em várias análises. Estamos voltando a ser o “oásis do ganho fácil” para os especuladores internacionais com recursos oriundos de “carry trade” e estamos tendo fortalecida a percepção de perda de atratividade dos capitais externos produtivos, aqueles de boa qualidade, com o volume de saídas no mesmo período.
A necessidade do país para zerar o fluxo deficitário agora é de US$ 15,8 Bi líquidos, montante exato das posições vendidas dos bancos no mercado à vista.
O que está acontecendo na realidade é uma intensa troca de dólares de qualidade que saem do país por dólares especulativos que entram,, quase com o mesma intensidade, e que não vem sendo observado, pois o mercado está focado somente no fluxo de capitais especulativos que ingressa, sem a percepção do substantivo volume que está deixando o país.
Liquidamente o fluxo cambial não enseja expectativas favoráveis em perspectiva.
Como justificar então o preço da moeda americana recuar a R$ 2,25 numa semana em que o fluxo cambial foi negativo em US$ 2,738 Bi, tendo o país sido recentemente rebaixado em sua nota de crédito soberana?
Ocorrem outros movimentos, como nos mercados futuros que envolvem ajustes de posições que estimulam movimentos assimétricos e, por vezes, de difícil percepção pelos analistas que observam os mercados mas nele não atuam, movimentos estes que estão passando ao largo sem serem considerados, mas que não serão duradouros, após o que a apreciação da moeda americana passará a ser a tendência natural e sustentável.
Num período curto de 24 a 31 os “vendidos”´, praticamente os bancos, reduziram suas posições liquidamente em US$ 7,3 Bi no mercado de dólar futuro, isto não ocorre sem afetar o curso da formação de preço da moeda americana e é uma evidência de que, em perspectiva acreditam que o preço dólar será apreciado, por isso buscam reduzir suas exposições reduzindo riscos.
É preciso observar os fundamentos e nestes, seguramente, não há perspectivas para que o preço da moeda americana esteja depreciado frente ao real.
E, na margem, há riscos de mudanças no cenário internacional, em especial na política monetária americana, que poderão provocar intensificação de reversão de recursos que estão aqui aplicados.
Embora a taxa de juro no Brasil esteja elevada e possa até atingir parâmetro superior a que foi definida ontem pelo BC, não há a menor propensão de ocorrência de fluxos tão intensos a ponto de gerar fluxo cambial liquido expressivo este ano.
O BC elevou, como previsto, a taxa SELIC para 11%. Em nota, o BC afirmou que a decisão foi tomada “neste momento” e que, até a próxima reunião, irá “monitorar a evolução do cenário macroeconômico” para, então, “definir os próximos passos na sua estratégia de política monetária”. A decisão foi unânime.
Continuamos mantendo nossa projeção de que o fluxo cambial será novamente negativo este ano, portanto insuficiente, exigindo que o BC suplemente a liquidez concedendo linhas de financiamento em moeda americana ou dispondo efetivamente das reservas cambiais e vendendo moeda à vista para o mercado de câmbio.
E, em linha com esta percepção, nossa projeção continua sendo do preço da moeda americana a R$ 2,60.