O mundo com o coronavírus mudou e já não está tão globalizado como antes, o que leva cada país a cuidar objetivamente dos seus interesses na busca de superar o agressivo quadro de retrocesso de suas economias, e surge a percepção de que concentrar produção de produtos em determinados países é um risco, colocando em check o conceito da globalização.
Certamente, no cenário pós coronavírus o mundo experimentará fortes alterações no intercâmbio comercial global, sendo certo que todas as economias serão mais defensivas para evitar surpresas como as que se evidenciam no momento.
O mundo não será o mesmo, é provável que se intensifique o nacionalismo.
Bem, feita esta colocação o que observamos no momento é que frágeis e inconsistentes sinais de contração no avanço da pandemia fomentaram otimismo centrado em algumas economias, mas principalmente na americana, e isto causou repercussões globais e até levou países com relevantes problemas fiscais, políticos e de atividade econômica como o Brasil a repercutir nos seus mercados financeiros um relativo euforismo descabido, pelo simples fato de Wall Street estar em New York e haver baixa sinergia concreta neste momento, pois os Estados Unidos tem foco objetivo em manter sua economia até onde possível preservada, e só não repetindo o contexto da Segunda Guerra Mundial quando cresceu e se consolidou exatamente por não ser bastante por sí só na atualidade.
Então, a nossa Bovespa debilitada pelo forte choque de retração da atividade econômica no país ancorada nos ventos de “Wall Street” assume um otimismo exagerado, relegando à segundo plano seus enormes desafios presentes, quer de natureza política quer de natureza econômica.
O Brasil convive com inúmeros e relevantes problemas e para os quais está se propondo gastar recursos que não tem o que levou à criação de um “orçamento de guerra”, que naturalmente sinaliza que o cobertor será curto, mas que é o possível, e acaba por revelar em conjunto todas as suas fragilidades e conturbações desestabilizadoras.
A Bovespa valoriza-se e na realidade há parcos fundamentos e sustentabilidade, o que recomenda rigorosa cautela, e o dólar sofre ajuste desvalorizando-se não porque haja perspectiva de melhora de fluxos, mas tão somente porque estava com preços em patamares absolutamente aviltados para um país que está bem defendido detendo suficiente volume de reservas cambiais.
Então, hoje segue o ajuste do preço e na realidade há diversos vetores que causam isto, e a despeito de ter-se enfatizado muito a importância política do evento “Mandetta”, consideramos que a manifestação do Presidente do BC afirmando que “se houver disfuncionalidade” a autoridade monetária poderá vender mais e neutralizando as expectativas de novos cortes na SELIC teve influência, afora o comportamento da moeda americana no exterior frente as moedas emergentes.
E, naturalmente, como afirmamos, ao fato do preço da moeda americana estar absolutamente fora do ponto no nosso mercado, o que deixa vulnerável a “pressão” de alta.
Como já salientamos, se o BC tão somente sinalizar a possibilidade, acreditamos que nem precise no momento inicial consolidar, de elevação da SELIC e venda massiva de dólares a vista se necessária, “derreteria” mais rapidamente o valor agregado marginal existente na taxa do câmbio.
No nosso entender, o momento requer um BC com maior postura de autoridade sobre o mercado do que de “trader”, mais incisivo e contundente, dominante da situação com “mão forte”.
Nos Estados Unidos foi notório o enquadramento promovido pelo Presidente Trump nas decisões do FED, que por fim, acabou reduzindo o juro como o Presidente desejava, afinal tempos atípicos justificam ações atípicas.
O risco país CDS 5 anos está em 339,3 pontos e isto deve repercutir em elevação do custo das linhas de curto prazo dos bancos para ancorar suas posições vendidas, além de impor maior seletividade por parte dos bancos estrangeiros na concessão, e portanto é imperativo que o BC intensifique a oferta de leilões de compra de títulos soberanos com revenda e, secundariamente, de linhas de financiamento em moeda estrangeira, para as instituições financeiras nacionais autorizadas a operar em câmbio.
Ocorre no momento uma enormidade de projeções as mais diversas em torno do Brasil, quanto ao PIB, a Bovespa, ao dólar, mas consideramos meramente achismos e empíricas, pois não há base fundamentalista consistente para tanto.
A pergunta do bilhão de dólares é: “Em que fase está a crise do coronavírus no mundo, e qual a perspectiva de retorno ao normal?”
Sem esta resposta, tudo o mais é “achismo”!
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO