BC/Copom precisam ousar no enfrentamento do momento, confrontando regras e dogmas

O Brasil convive com um momento absolutamente atípico a tudo que poderia ser imaginado, e neste ambiente controverso e quase que desconhecido em suas perspectivas de curto/médio/longo prazos as autoridades monetárias, na absoluta impossibilidade de paralisar a atividade do seu mercado financeiro como o está fazendo com o setor produtivo, precisa demonstrar-se resoluto e ousado e isto representa agir contraditoriamente às regras e dogmas usuais, pois o tempo difere de tudo que se presenciou no mundo, principalmente após ter se globalizado.

Cenários atípicos sugerem estratégias atípicas e reacionárias ao “status quo” que a passividade e práticas contumazes pouco criativas acabam estabelecendo e que provocam expressivos danos ao país.

O real é uma das moedas de maior giro no mercado internacional dada a sua liquidez, o que não a torna conversível, mas pelo fato de estar acostada a um país que detém reservas cambiais e estratégias operacionais bastante argutas, e isto lhe impõe exuberante desvalorização frente a moeda americana no mercado internacional.

A excepcional liquidez no mercado externo a faz quase que a predileta dos especuladores no mercado internacional e o BC neste ambiente fica totalmente à margem de qualquer intervenção mais incisiva, ao manter-se fiel à lógica das regras e dogmas contumazes, que possa afetar este comportamento.

Então, entendemos oportuno questionar se não é o momento do BC mudar do contumaz e contrariar as expectativas e ser efetivamente ousado mudando as regras do jogo.

O real foi conduzido, inicialmente, à abrupta desvalorização ancorado na tese colocada pelo Ministro da Economia do “juro baixo câmbio alto”, e sem definir paradigmas para o conceito “câmbio alto”, que assim passou a ter uma perspectiva “abstrata” do que se valeram os especuladores que “turbinaram” a pressão a partir do mercado futuro de dólar, mesmo ao início do ano onde o déficit do fluxo cambial ainda não era expressivo e tendo o real fechado o ano ao preço de R$ 4,01.

No meio de forte movimento especulativo instalado sob “os aplausos de muitos”, veio a crise do coronavírus e atropelou o preço deteriorando os ativos do mercado financeiro, “destruindo” os preços da Bovespa, do dólar e incentivando a redução do juro.

Houve o incremento de saídas de recursos estrangeiros do país, que perdeu totalmente qualquer mínima atratividade externa.

O mundo passou a avaliar o Brasil com outro conceito e o CDS 5y saltou de 91 pontos em meados de fevereiro para até 4 vezes ao longo de março, estando após romper forte a linha dos 350 pontos, no em torno de 270 pontos.

Isto impactou na disponibilidade de linhas externas de curto prazo para os bancos, que as utilizam para ancorar o financiamento das posições vendidas com que operam no mercado de câmbio, e, naturalmente seus custos.

O BC desde então se restringe a ação profilática de suprir as carências de liquidez no mercado à vista com oferta de moeda efetiva, rolagem de swaps cambiais vincendos e esporádicas ofertas novas, e oferta de linhas de financiamento externo e mais leilões de compras de títulos soberanos nominados em moeda estrangeira em poder das instituições financeiras, para desafogá-las do novo cenário externo adverso para linhas de curto prazo.

E assim, o preço da moeda americana frente ao real está à deriva, com o BC sem poder de influência sobre a formação do preço do câmbio, limitando as ações contumazes sugeridas pelo monitoramento passivo.

Neste contexto, não há como se realizar quaisquer projeções a respeito do preço do câmbio.

Contudo, consideramos que cabe ao BC mudar a postura, sair do trivial, e reagir de forma incisiva.

Como?

Primeiro, buscando desconstruir a tese do “juro baixo câmbio alto”, virando o jogo, o COPOM deveria elevar o juro rapidamente para algo em torno de 5%, criando atratividade para as operações de “carry trade” que despertariam interesse aos investidores estrangeiros, e criariam forte demanda pelo real que assim poderia reverter a tendência de desvalorização fortalecendo-se frente ao dólar.

Na margem, poderia até atrair investidores estrangeiros não ancorados no “carry trade” mas ansiosos por obter melhor rendimento, de vez que o mundo pratica juro próximo de zero ou negativo.

Adotando postura mais ousada poderia reverter o preço da moeda americana no nosso mercado para o em torno de R$ 4,50, naturalmente impondo perdas para quem especulou, porém não sem antes reduzir uma considerável parcela das reservas cambiais, talvez em torno de US$ 80,0 Bi, cumprindo o vaticínio do Ministro Guedes quando estimulou a estratégia do “juro baixo câmbio alto” de que vender reservas a R$ 5,00 seria uma grande tacada para o governo, que agora se prestaria a atenuar o impacto do déficit fiscal pelo menos para este ano.

Enfim, o momento é de ousar, surpreender, e não ficar repetindo práticas contumazes e rotineiras!


Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO

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