O ambiente na América Latina está conturbado por problemas políticos e econômicos, mas o Brasil vinha conseguindo se manter à margem dos desgastes consequentes, surpreendendo positivamente com a recuperação gradual, ainda lenta, da sua atividade econômica dentro de um ambiente antecedente que grave crise fiscal, cujo cenário foi atenuado com a aprovação da Reforma da Previdência e a sinalização do governo de continuidade na propositura das reformas essenciais e fundamentais, com sinalizações de incremento ao programa de privatizações.
A economia continuou gerando dados otimistas que sugerem um crescimento do PIB em torno de 1%, inflação baixa, juros em queda, enfim sinais consistentes de que o país vai retomando a atividade econômica e poderá readquirir a atratividade perdida dos investidores nacionais e, principalmente, estrangeiros.
O Brasil vinha sendo visto positivamente pela comunidade financeira global a ponto de ostentar um CDS de 120 pontos, e vinha conseguindo se manter à margem dos desgastes latinos de Argentina, Venezuela, Bolívia e Chile com seus problemas econômicos e políticos.
Entendemos que estava no momento de inversão do fluxo cambial, ainda que tenha sofrido a frustração do insucesso do leilão do pré-sal, que tenderia a retomar a performance positiva da qual o país está severamente afastado ao longo deste ano de 2019.
Com a retomada das perspectivas de recuperação da atividade econômica seria natural a melhora de fluxos externos para a Bovespa em especial, já que não há mais no país atratividade para o capital especulativo que era forjado em operações de “carry trade” ao tempo do juro elevado no Brasil, mas isto poderia assegurar capitais de melhor qualidade para o nosso mercado financeiro, e busca de oportunidades nos investimentos na infraestrutura brasileira dentro do programa de privatizações do governo.
Tudo sugeria uma trajetória segura na linha de recuperação da atividade e as consequências naturais de geração de emprego, renda e consumo.
Contudo, o desapontamento com os leilões do pré-sal deixaram a frustração dos ingressos de moeda estrangeira, mas isto naturalmente seria superado, porém decisões posteriores do Poder Judiciário reavivaram os riscos de insegurança jurídica no país, fator que provoca grande retração de investidores estrangeiros, e a isto se soma a decisão do Presidente da República tomar a decisão de criar um novo partido, às vésperas de um ano eleitoral e no momento em que necessitará forte apoio de base no Congresso para implementar as novas e fundamentais reformas que assegurarão a retomada da atividade econômica.
Então, por razões diferentes dos demais países latinos, o Brasil passou a chamar atenção pela auto criação de inviabilidades a consecução dos seus avanços, e provocou imediato movimento disruptivo na formação do preço da moeda americana no nosso mercado.
Como de costume tem se atribuído a razões externas como o embate infindável comercial entre China e Estados Unidos, algo que já faz parte do cotidiano e precificado pelo mundo todo em seus pontos negativos e que doravante só poderá gerar pontos positivos, já que está evidente que já não interessa para nenhuma das duas potências.
Enfim, há intranquilidades em várias economias mundiais as quais se atribuem reflexos ao Brasil, nem sempre bem fundamentados, e tivemos aqui no Brasil a “soltura” do ex-Presidente Lula, que a rigor não causou até o momento impactos maiores.
Com os fatos novos negativos agregados ao cenário Brasil de origem jurídico e político, acreditamos o país, com causas diferentes, passou a catalisar visão negativa e preocupante por parte dos investidores estrangeiros e conceitualmente no mercado financeiro global, ainda não retratado no CDS, e assim corre o risco de se deixar contaminar pelo “mau humor” externo em relação à América Latina.
O Brasil está com fluxo cambial negativo no ano pouco acima de US$ 20,0 Bi, mas o BC já retirou de suas reservas um pouco mais do que isto e forneceu ao mercado, então não há pressão de demanda não atendida que possa ser a justificativa da depreciação do real.
Por outro lado, o país detém expressivo volume de reservas cambiais superior às necessidades e o BC tem mecanismos operacionais adequados para sanar as demandas seja por liquidez seja por “hedge”.
Portanto, devemos deixar de lado a argumentação do comportamento da formação da taxa cambial no mercado brasileiro como consequente dos embates sino-americano e outros, ou mesmo do momento negativo da América Latina, mas focarmos mais pontualmente que as causas estão aqui mesmo, consequentes de cenários construídos dentro e pelo próprio Brasil.
Como os fatos recentes maculam com firmeza os avanços construídos pela melhora da economia e afetam as perspectivas, caem por terra as possibilidades mais imediatas de recuperação do fluxo cambial e tende a haver maior sustentabilidade da taxa do dólar no patamar atual, pois insegurança é algo com um peso enorme nas decisões dos investidores.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO