Dólar depende mais de como o Brasil é visto do que da forma que se vê

A pergunta mais constante atualmente é o que acontecerá com o preço do dólar no mercado brasileiro.

E é natural que isto ocorra, tendo em vista que a formação do preço não está ancorada em movimentos efetivos de saída de divisas, mas sim em expectativas.

A formação do preço da moeda americana no nosso mercado já tinha motivos para estar mais elevada antes do anúncio da revisão da meta de superávit primário pelo governo, mas conseguia, a despeito da relativa volatilidade, não ser exacerbada.

Contudo, com a divulgação pelo governo da revisão que envolveu expressiva redução de 1,1% para 0,15% da meta de superávit e ainda com direito a abatimento do triplo da mesma caso ocorra frustração nas receitas, ficou evidente que a projeção para este ano é efetivamente deficitária. Por outro lado, ao apresentar projeções para 2016 a 2018 evidenciando que continuarão apertadas as metas, até certo ponto consideradas simples menções desprovidas de qualquer fundamento, tendo em vista que uma vez não havendo convicção nem em torno da projeção para este ano, as para os anos de 2016 a 2018 eram meramente citações ancoradas na “esperança” e não em fundamentos.

Este anúncio que surpreendeu o mercado financeiro pela magnitude em 2015 e por ter sinalizado apertos ainda de 2016 a 2018, criou, de imediato, a expectativa de que as agencias de rating que haviam sido complacentes com os descumprimentos em 2014, desta vez seriam implacáveis no “downgrade” da nota brasileiro, levando o país a perder o grau de investimento.

Sabidamente, há inúmeros fundos de investimentos estrangeiros com recursos alocados em ativos brasileiros e é de pleno conhecimento que não podem ter recursos aplicados em país que não detenham o grau de investimento.

Esta expectativa de “downgrade” e de saída obrigatória de recursos estrangeiros foi prontamente, ainda que de forma não exacerbada, precificada na formação de preço da moeda americana. Observe-se que a alta ocorrida não decorreu de movimentos efetivos de saída de divisas do país, mas sim da expectativa de que o cenário se tornasse mais negativo e com o “downgrade” viria a provocar a saída dos recursos.

Ontem, a agência de rating S&P se manifestou revisando para negativa a perspectiva dos ratings do Brasil, colocando vários pontos que deixaram bem evidente a forte propensão a no curto prazo estabelecer o “downgrade” do rating do país, o que determinaria a perda do grau de investimento. Provavelmente não o fez de imediato por sensatez já que decisão de tamanha relevância normalmente e antecedida de visita ao país para reavaliação, etc. de forma a ancorar a decisão, muito embora já tenha salientado a percepção de que em relação a avaliação realizada em março deste ano, quando reafirmou os ratings do Brasil, a avaliação presente era de que os riscos negativos para o Brasil tinham aumentado e que estava revisando a perspectiva para negativa porque apesar das amplas mudanças os riscos para execução cresceram.

Antes do anuncio da S&P o preço da moeda americana atingiu R$ 3,43, e, depois do anuncio passou a ceder até próximo de R$ 3,36, já que a despeito da manifestação da agência ter deixado o Brasil muito propenso a perda do grau de investimento, o fato não foi consumado.

Ficou claro que esta manifestação da agência é bastante negativa para o país, mas agora o mercado deslocou as atenções para a verificação do comportamento dos investidores estrangeiros com recursos no país, em especial os fundos com exigência de grau de investimento para permanência.

Como agirão os investidores? Esta é a nova expectativa que influenciará a formação do preço da moeda americana no nosso mercado, sem que se perca de vista as agências de rating.

Os fundos com exigência de grau de investimentos darão inicio à retirada dos recursos de forma previdente do país ou aguardarão a evolução dos fatos, incluindo o acompanhamento do comportamento do risco do país com base nos CDS. Evidente que se retirarem agora, ainda que gradualmente, conseguirão sair com mais dólares em razão da taxa cambial atual do que a prevalecente na ocorrência efetiva do “downgrade”.

Como agirão os demais fundos com a percepção da piora do país e elevação do risco?

Esta é a nova perspectiva que deve prevalecer e ditar o comportamento do preço da moeda americana no mercado brasileiro.

O agravante é que este deslocamento exigirá divisas efetivas e não mais “hedge” e isto poderá exigir a utilização das reservas cambiais. Poderá o BC utilizar a estratégia de fazer leilões de linhas de financiamento em moeda estrangeira aos bancos para que estes irriguem a liquidez, mas, num ambiente em que o país não desperta atratividade a capitais externos, esta prática não evitará que se apure sempre as reservas cambiais liquidas, portanto deduzindo das reservas cambiais contabilizadas pelo BC os montantes de posições vendidas dos bancos.

Por outro lado, a saída de recursos diminuirá a demanda por “hedge” permitindo que o BC diminua o estoque de contratos de swaps cambiais em poder do mercado. Este é outro aspecto relevante nem sempre bem entendido, o estoque de “swaps cambiais” só poderá ser reduzido na medida em que ocorra saída de recursos do país ou ocorra uma intensa melhora nos ingressos de recursos a ponto de tornar a liquidez ampla, o que não é o cenário que se espera para o Brasil no curto/médio prazos, já que o país está fragilizado em sua economia e não desperta atratividade.

O cenário das contas externas brasileiras tende a piora, e embora o FMI tenha se manifestado que a taxa cambial mais elevada poderá melhorar a posição externa do Brasil que é fraca, nos parece absolutamente improvável dada a baixíssima atratividade do país.

O cenário interno do Brasil dá evidência de que está propenso a uma forte recessão, com os indicadores mais recentes da indústria da construção civil, serviços, demanda por crédito, inadimplência, desemprego, etc… se acentuando negativamente.

A percepção é de que o pior está por vir, pois ainda estamos bem no inicio da recessão.

Já não se descarta a ocorrência de déficit primário neste ano e em 2016, da mesma forma que se tem como certa a retração do PIB este ano e não se descarta que seja negativo também em 2016.

Desta forma, nos parece factível que o preço da moeda americana atinja R$ 3,70 caso ocorra a perda do “investment grade” ou ainda que não ocorra, mas os fundos iniciem a retirada de recursos do país, fique entre R$ 3,50 a R$ 3,60.

O momento sugere que se foque no comportamento dos fundos estrangeiros que detém recursos no país, mantendo atenção à margem nas agências de rating.

O preço da moeda americana estará ancorada nas expectativas sobre este comportamento, estando, portanto, na dependência de como o país é visto pelos investidores e não como se vê.

Há pouco que o BC ou o governo propriamente dito possam fazer objetivamente, e em nada, contribui para mudar expectativas menções de que iremos crescer a partir do 4º trimestre deste, que a escalada do dólar reflete fenômenos passageiros e nem que se procure atribuir a fatores externos o momento desfavorável do Brasil. Aliás, compromete a credibilidade.

 

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