Ao valorizarmos em demasia as incertezas presentes nos Estados Unidos relativas ao orçamento americano e às discussões políticas emperradas acerca do teto da dívida, que no próximo dia 17 atingirá US$ 16,7 Tri, e supostamente levaria o país à paralização, ou mesmo em torno da reunião do BCE na quarta-feira abordando política monetária, poderemos estar sendo levados a desfocar os relevantes problemas presentes nas nossas contas externas, que merecem especial atenção e tem impactos mais consideráveis na formação do preço da moeda americana no nosso mercado.
Amanhã ocorrerá a primeira de duas rodadas abordando discussão em torno do teto da dívida. O pressuposto é que o Congresso americano deve aprovar um novo orçamento até o dia 1º outubro ou desencadear uma paralização do governo. No dia 17 de outubro, o Tesouro americano, segundo o secretário Jacob Lew, atingirá o teto de US$ 16,7 Tri, a partir do qual o governo não teria condições de honrar seus compromissos.
Embora teoricamente possa se vislumbrar um entrave relevante, quem em sã consciência pode admitir que os republicanos no seu jogo político sejam tão irresponsáveis ao ponto de paralisar a capacidade de pagamento do governo americano? Evidentemente que este tema alimenta as especulações, mas a sua probabilidade de ocorrência é muito próxima de zero.
O jogo político dos republicamos tem sido este ao longo do governo do Presidente Obama, “apertar sem espanar”, pois em última instância o que estaria sendo atingido é o país Estados Unidos, e este todos os políticos protegem.
Na questão do BCE não se espera quaisquer mudanças de política ou anúncios de efetivas ações que poderão ser ventiladas como possíveis se as circunstâncias recomendarem. É provável que o Presidente Draghi destaque que a recente melhora de confiança, além de outros dados, fortaleça a visão de uma recuperação lenta no 3º trimestre.
Visto o quadro externo com a sensatez adequada, a despeito da perturbação em torno da questão americana, certamente potencializada pelos movimentos especulativos sempre presentes, há de se convir que os conflitos políticos de forma alguma vão conduzir o país a um quadro que possa ficar inadimplente dado o fator limitante da expansão do teto da dívida.
O Congresso deve aprovar um orçamento de curto prazo até a meia-noite nesta segunda-feira para evitar a paralisação do governo.
A oposição republicana ao financiamento do Ato de Cuidado Econômico [Affordable Care Act] criou um impasse com a Casa Branca e o Senado controlado pelos Democratas, que disseram que não apoiarão nenhuma lei de orçamento que interrompa os financiamentos ou altere a Obamacare. Esta é uma questão política, e desta forma deverá ser resolvida politicamente, visto que afeta grande parte da população americana. Os republicanos estão valorizando a obstrução para seguramente conquistarem algum mérito perante a sociedade.
Então, devemos mesmo é focar nas nossas questões e fragilidades internas presentes, que, em tese, é que merecem atenção e são reais, efetivas, quantificáveis e que precisam ser observadas, pois os fundamentos da formação de preço da moeda americana estão atrelados a este contexto.
Temos repetido quase que cotidianamente que a grandeza do nosso déficit em transações correntes ante os IED´s insuficientes e a balança comercial tendente a saldo zero ao final do ano, criaram um “gap” expressivo de necessidade de ingressos de capitais estrangeiros para complementar a necessidade de financiamento do país.
Com a recente decisão do FED de protelar o início do desmanche do seu programa de incentivo monetário ficou aberta a possibilidade de migração para o Brasil de capitais especulativos em busca de rentabilidade, tendo em vista que a taxa de juro no Brasil tem perspectivas ascendentes.
Esta perspectiva provocou uma queda mais do razoável no preço da moeda americana no nosso mercado, conduzindo-a a níveis abaixo de R$ 2,20, que vem se recompondo e deve colocar o preço do dólar no intervalo entre R$ 2,20 a R$ 2,25.
Somente um desapontamento mais intenso com o fluxo de capital especulativo para o país no curto prazo poderá provocar o deslocamento deste eixo de variação.
O que ocorreu na sexta-feira foi reflexo da disputa entre comprados e vendidos na BM&F e que ainda hoje poderá provocar alguma volatilidade, contudo, projetamos a taxa sendo operada no entorno de R$ 2,23, bastante equilibrada e também conveniente para o BC não ter perdas com as chamadas de margens nos “swaps cambiais” num patamar mais baixo e irreal do preço da moeda americana.
Para o final do ano, como já destacamos algumas vezes, nossa projeção é de R$ 2,30.
O Boletim FOCUS projeta o IPCA para o final do ano em 5,82% e para os próximos 12 meses em 6,21%, o que parece bem centrado face o arrefecimento do preço do dólar, que é projetado para o final do ano em R$ 2,30, em linha com o nosso pensamento.
A SELIC continua projetada para 9,75% e o crescimento do PIB em 2,40%, sendo que para este acreditamos seja um pouco menor, mas tendente a 2,0%.
A projeção do déficit em transações correntes foi elevada de US$ 78,0 Bi para 79,0 Bi, mas acreditamos que possa ultrapassar os US$ 80,0 Bi este ano, enquanto para os IED´s a projeção foi mantida em US$ 60,0 Bi, que também poderá ficar um pouco abaixo. O saldo de balança comercial é projetado em US$ 2,0 Bi, mas o mais provável é que fique em torno de zero. Estes dados é que deixam evidente que o país precisa de incremento de fluxos líquidos de recursos externos, mesmo que predominantemente especulativos.