A estratégia motivadora por parte do governo, centrada no Ministério da Economia, que apregoou a busca incessante do “câmbio alto x juro baixo” acabou se consolidando de forma bastante desordenada, visto que nunca houve clareza no que poder-se-ia considerar “câmbio alto”, e desta forma foi acoplado ao intento um movimento especulativo de oportunidade que acabou por se atrelar ao movimento de depreciação do real frente ao dólar, e, sem definição de qual era o parâmetro, qualquer preço passou a atender o “câmbio alto” e se consolidar.
Neste cenário ocorreu o acirramento da crise do coronavírus que então acentuou os temores mundialmente generalizados, com forte impacto na economia global e elevada rejeição aos países emergentes, que no caso brasileiro se agregaram a baixa atratividade que o país já despertava perante os investidores estrangeiros.
Então, o país que já havia assistido ao longo de 2019 e em fevereiro deste ano a saída massiva de recursos estrangeiros aqui alocados, ficou um tanto quanto sem alternativas e não teve condições de reverter o preço da moeda americana já num patamar fora da curva, mas teve que aceitá-lo e conviver com o mesmo, contando com o cenário de inércia da atividade econômica que evitou a transmissão imediata para a inflação do impacto, como seria natural em tempos normais.
O BC fez a adequação da demanda do mercado à vista com leilões específicos e alardeou forte movimento de retomada de oferta de linhas e recompra de títulos soberanos em poder das instituições, mas que na realidade não visou a formação do preço do câmbio como foi entendido, mas sim focou prover de suporte à liquidez das instituições financeiras nas suas linhas de financiamentos externas, visto que houve sinais de escassez e forte elevação de custos visto que de 17/2 a esta data o CDS Brazil 5 anos subiu de 92 pontos para 354 pontos, e esta piora do conceito de risco afeta rapidamente os custos e acesso ao crédito no mercado externo.
Houve a deliberação do COPOM aparentemente sem convicção de corte de 0,5%, quando a maioria entendia que deveria ser 1,0% e alguns entendendo que deveria ser mantida inalterada visto que não há clareza de objetivos nos cortes no quadro endêmico e não reacionário da atividade econômica e, do ponto de vista, câmbio impulsionaria ainda mais o preço da moeda em alta que poderá, em algum momento, afetar a inflação do IPCA, já que o IGP-M já passou a repercutir intensamente.
O fato é que pouco ou nada resta ao BC senão suprir o mercado à vista com a sua necessidade evidenciada e monitorada dia a dia pela autoridade, não sendo razoável mais admitir-se a continuidade incessante da especulação que vinha ocorrendo, pois em termos de preço do câmbio já há pouco espaço para ficar pior, da mesma forma que não há como o BC sensibilizar a formação do preço com os instrumentos que detém, mas sim ao país resta conviver com este quadro de preço aviltado, que acabou por consolidar o “novo câmbio”.
A rigor, o único meio de apreciar o real ante o dólar será pela retomada das operações de “carry trade” arbitrando juro Brasil versus juro americano, mas os apelos atuais são por novo corte na taxa SELIC, o que distancia esta possibilidade.
Contudo, não podemos descartar a ocorrência em algum momento da rebeldia do comportamento do “juro futuro” e então haver a oportunidade da realização das operações de “carry trade” que exerceriam pressão de demanda sobre aos reais.
Afora isto, não vemos como o BC intervir com sucesso no mercado buscando alinhar o preço do câmbio, salvo restringindo-se a ajuste da demanda efetiva no mercado à vista ou no mercado futuro sem, contudo, alterar o perfil do preço, e as flutuações que venham a ser percebidas serão diretamente decorrentes do comportamento da moeda americana no mercado externo, pois o Brasil tem neste momento pouco ou quase nada a fazer em prol da sua moeda.
A estratégia errática sinaliza que o país ficou com o ônus e muito distante do bônus.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO