Análise do Mercado – 19/11/2010

“Ruídos bons” advindos dos bastidores indicando que o novo governo da Presidente Dilma Rousseff pretende reduzir a dívida interna líquida para 30% do PIB até 2014, e, com isto, viabilizar taxa de juro real de 2% aa. ao final do seu mandato, é o caminho…

“Ruídos bons” advindos dos bastidores indicando que o novo governo da Presidente Dilma Rousseff pretende reduzir a dívida interna líquida para 30% do PIB até 2014, e, com isto, viabilizar taxa de juro real de 2% aa. ao final do seu mandato, é o caminho para a consolidação do Brasil com crescimento sustentável.

Naturalmente, estes objetivos passam por inúmeras mudanças radicais de gestão na política econômica, sinalizando a prática de austeridade e do gasto de governo seletivo e com qualidade.

O mercado financeiro somente está um tanto cético que esta tarefa de reversão do perfil de gestão da política econômica até agora mantida no governo Lula fortemente expansionista e com baixo foco na poupança, possa estar sendo delegado ao mesmo gestor, o Ministro Mantega, que em certo momento chegou a enfatizar que o gasto público não fomenta inflação.

Mas se admitirmos o princípio de que “marinheiro faz o que mestre manda”, não se pode desmerecer a capacidade do Ministro Mantega de “fazer diferente”, e, ao que tudo indica, a nova Presidente terá uma postura mais subordinante das diretrizes da política econômica do governo.

O governo, entenda-se MF e BCB, parece estar confortável com a taxa cambial entre R$ 1,70 a R$ 1,75, mas, inegavelmente, a fala do Ministro Mantega de que “não serão tomadas medidas no câmbio” proporcionou uma “relaxada” nas expectativas e fragilizou um pouco o preço da moeda americana.

No cenário externo, hoje, Bernanke, Presidente do FED americano, emitiu observações, por escrito, na Conferência Bancária em Frankfurt, promovida pelo BCE, defendendo a recente estratégia do FED para estimular o crescimento econômico e foco na redução do desemprego nos Estados Unidos. Salientou que os países precisam trabalhar juntos para corrigir os desequilíbrios globais como a recuperação da economia mundial a um ritmo desigual. Reconheceu os reclamos dos diversos bancos centrais, mas argumentou que é necessário um estímulo adicional dado aos níveis persistentemente elevados de desemprego nos Estados Unidos, especialmente entre aqueles que estão fora do trabalho por longo período de tempo. Destacou ainda que com a recuperação da economia mundial em ritmo irregular, o sentido de propósito comum diminuiu e as tensões entre as nações sobre políticas econômicas que surgiram e se intensificaram, potencialmente ameaçam a capacidade de encontrar soluções globais para problemas globais.

E por fim, atacou a China mencionando, “a subvalorização cambial por países superavitários está inibindo o ajuste internacional necessário e criando efeitos de contágio que não existiriam se as taxas de câmbio refletissem melhor os fundamentos do mercado”.

A impressão que ficou da fala de Bernanke é que os Estados Unidos vão manter posição forte na diretriz definida pelo FED, que há clara predominância dos interesses individuais em detrimento do coletivo, e, que a mutilação da flexibilidade das moedas repercutindo as condições econômicas de cada país, com ênfase para a China que mantém taxa administrada num cenário global em que predomina o câmbio flutuante, impede que os fundamentos predominem no mercado de câmbio.

A China, por sua vez, mantém o discurso de que a excessiva liquidez colocada pelo FED afeta o comércio exterior, e na realidade não tem como mudar sua atitude já que não tem mercado de consumo interno compatível com a sua grandeza.

Por outro lado, revela rigor na condução de sua política monetária aumentando o aperto visando combater a inflação, e duas vezes seguidas, cinco vezes no ano, já subiu as taxas de depósitos compulsórios e de juros uma vez e restringiu o crédito bancário. A partir do próximo dia 29 o depósito compulsório dos bancos será elevado em 0,5%.

Ainda decidiu o governo chinês que “as empresas estrangeiras pagarão os mesmos impostos que as nacionais, estabelecendo assim que as empresas estrangeiras e as nacionais concorrerão em igualdade de condições”, já as que consideram a China uma fábrica de mão de obra barata deixarão a concorrência por elas próprias, pois este não é o modelo de desenvolvimento que o país almeja.

Um sinal de aperto monetário na China leva à perspectiva de que o crescimento chinês possa ser menor e isto, para a economia global, supera em muito a queda do pessimismo em relação à crise da Irlanda, afetando a União Européia, que com os empréstimos novos têm somente o objetivo de evitar a quebra do país, porém continuará mantendo um explosivo déficit fiscal.

O mercado global repercute hoje este pessimismo.

Na realidade a Europa tem na sua zona periférica países em crise sistêmica e de difícil readequação aos parâmetros definidos pela comunidade, que colocam em risco a unidade da eurozona e que podem ensejar debandadas do Euro. Com a grandeza da indisciplina fiscal ocorrida e as dificuldades dos países em conviver com parâmetros rígidos, não há como vislumbrar-se o Euro sem volatilidade.

Ocorre então um constante efeito “gangorra” de sobe e desce da relação dólar com o euro e na margem com todas as moedas dos países ditos fortes, na medida em que um sinalize que está melhor ou pior do que o outro ou dos demais.

Parece que, contraditoriamente, o risco atual é dar sinais de melhora da situação econômica, pois num cenário de economias fragilizadas, as moedas do país que tem sinalização positiva logo se fortalecem e passam a inviabilizar a sustentabilidade do bom momento, prejudicando o comércio exterior.

O que parece mais evidente na economia mundial é que, muito mais do que se pretende denominar “guerra cambial”, a matriz do desenvolvimento dos países chamados ricos teve um grave problema de todos se beneficiarem da economia americana e terem desprezado o desenvolvimento de mercados internos fortes.

Mesmo que o FED não tivesse realizado programa injetando excessiva liquidez, nos parece bastante razoável admitir que com a fragilização da economia americana, esta realidade presente tornar-se-ia visível e o entrave ocorreria naturalmente.

Certamente a tendência é de agravamento do protecionismo com adoção das mais diversas práticas, mas tudo leva a crer que os países que cresceram sem desenvolver mercados internos e transferir parte da riqueza à sua população terão dificuldades maiores na recuperação, e esta situação poderá até afetar a economia chinesa que poderá perder dinamismo no seu crescimento.

Entendemos que é preciso avaliar o cenário internacional com um olhar muito além do que está se procurando resumir como uma “guerra cambial”, que na realidade parece um termo muito forte para uma realidade explicável em outros termos, pois as consequências da matriz imperfeita que viabilizou o crescimento de inúmeros países criaram uma deformidade nas relações de comércio exterior de difícil correção, podendo determinar um quadro mais grave.

 

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