O fato do BCB comprar com seus leilões de compra diários no mercado de câmbio à vista o montante de US$ 1,106 Bi, na 1ª semana de novembro, num ambiente de fluxo cambial negativo de US$ 1,406 Bi, passa quase desapercebido do grande…
O fato do BCB comprar com seus leilões de compra diários no mercado de câmbio à vista o montante de US$ 1,106 Bi, na 1ª semana de novembro, num ambiente de fluxo cambial negativo de US$ 1,406 Bi, passa quase desapercebido do grande público que continua acreditando que é o “intenso” fluxo cambial positivo que aprecia o real e não as estratégias do próprio governo.
As posições “vendidas” dos bancos, grandes potencializadoras da apreciação do real, como consequência, subiram de US$ 12,8 Bi no final do mês de outubro para US$ 15,3 Bi no dia 5 de novembro.
Afinal, o que vale: a retórica forte e a criação de normativos e tributos por parte do governo focando a contenção da apreciação do real, ou, a continuidade da ação extremamente contraditória do BCB induzindo a continuidade desta apreciação?
A disparidade entre a palavra e a ação conspiram contra a credibilidade de propósitos das autoridades monetárias brasileiras, no que diz respeito as efetivas preocupações com a apreciação do real ante a moeda americana.
Há uma mistura maléfica de política cambial travestida de política monetária, este é o fato concreto, que objetiva apreciar o real. Esta é uma realidade duradoura na dinâmica do governo, visando fazer do preço da moeda americana “coadjuvante ou mesmo âncora principal” do controle da inflação, já que só o efeito da taxa SELIC não é o bastante, mas há um evidente contraditório quando o próprio governo, ignorando o que pratica, fica buscando atalhos para segurar a apreciação do real, já que não tem condições de alterar a política fiscal, cambial e de juro no curto prazo.
É importante observar que está ocorrendo uma retração no fluxo financeiro, podendo ser atribuído aos efeitos inibidores do IOF sobre o volume de fluxo de recursos direcionados para aplicação em renda fixa. Este fato ratifica a percepção presente de ausência crescente dos estrangeiros nos leilões do Tesouro em novembro, o que determinou o cancelamento de dois dos quatro marcados. O sinal está indicando que o IOF está inibindo não somente o capital especulativo de curto prazo, mas também o bom capital de longo prazo já que a retração do investidor estrangeiro está se generalizando.
A retração não beneficia a formação do preço da moeda americana, mas sim o BCB que assim compra menos dólares para agregar às reservas cambiais porque menos dólares ingressam, o que é verdadeiro num contexto em que retirasse do mercado à vista com seus leilões de compra somente os excedentes do fluxo cambial. Contudo, o BCB continua comprando mais do que o excedente e ainda, inexplicavelmente, mesmo quando não há excedente no fluxo cambial, estimulando os bancos a ampliarem a utilização de suas externas, focando com isto a apreciação do real que lhe interessa como antídoto as pressões inflacionárias.
Tudo leva a crer que o BCB não pode deixar o real ser depreciado neste momento, já que há maiores pressões inflacionárias decorrentes da alta nos preços das “commodities” que alavancam os preços dos alimentos, pois perderia um forte aliado, se não o principal, no enfrentamento destas pressões e a SELIC isolada não tem força convergente suficiente sobre o comportamento da curva inflacionária, e, naturalmente, colocaria em “check” a pretensão do governo encerrar o mandato mantendo-a inalterada.
Este quadro conflitante conspira contra a efetividade e credibilidade sobre propósitos das medidas adotadas e que venham a ser tomadas pelo governo, que assim, mantido o contraditório, somente diminuirão o fluxo cambial e aliviarão o “caixa” do governo que terá menos dólares para comprar para as reservas cambiais, mas não afetará a formação do preço que tem mecanismos governamentais ativos para conter a apreciação do real e ao mesmo tempo mantê-la, o que, em regra, pode sustentar o preço e evitar que suba para não comprometer a inflação.
Hoje tem início em Seul, Coréia do Sul, a cúpula do G-20, e a despeito de esperar-se fortes discussões a respeito das inúmeras divergências entre os países, não nutrimos expectativa de sucesso de alinhamento envolvendo as mais importantes .
Obama desembarca em Seul com pouco a oferecer e com o ímpeto de derrubar a tese de “guerra cambial”, sustentando que o “quantitative easing 2” foca a revitalização da economia americana e não a desvalorização cambial que decorre diretamente da fragilização da economia dos Estados Unidos. Não tem apoio do Congresso americano com o seu novo perfil para adotar medidas fiscais e há agora um fato novo no contexto, os republicanos são mais protecionistas e podem vir a estimular a retaliação dos produtos chineses. Então, poderemos ter um acirramento da disputa comercial, podendo o dólar ser mais depreciado o que atingiria a China no comércio entre ambos e no mercado de “commodities” que subiriam drasticamente de preço penalizando a indústria chinesa.
Os Estados Unidos têm interesse prioritário em resolver os seus problemas internos de reativação do consumo interno, base de seu PIB, e sabem que sem sinais de recuperação de sua economia o mundo global não consegue se realinhar.
Como a sociedade americana foi fortemente penalizada pela crise iniciada em 2008, precisa “substituir”, mesmo que temporariamente, a queda do consumo interno por consumo externo e então entra na trilha que todos buscam: “vender mais e comprar menos”.
Esta equação não fecha, pois envolveria incremento de mercados internos em países que se fizeram grandes somente exportando, e é muito difícil alterar esta matriz no curto prazo.
A lógica sugere que a China desempenhe, mesmo que temporariamente, o papel tradicional dos Estados Unidos na economia mundial, mas os chineses não estão aptos para tanto, visto que tem um mercado interno fraco.
A “guerra” no fundo é comercial e pelo restabelecimento da atividade econômica com recuperação do emprego e da renda. O câmbio é só uma peça do tabuleiro.
As ameaças chinesas de diminuir o “financiamento” dos déficits americanos com compras de títulos do Tesouro, tendo até rebaixado o “rating” americano, só levam o dólar a maior desvalorização.
É notório que o mundo financeiro ainda não tem uma nova moeda, única ou com referencial coletivo, para suceder o dólar, e, qualquer movimento de deslocamento desvalorizaria abruptamente o patrimônio de todos. Ainda prevalece o sentimento de que o dólar pode não estar bem, mas qualquer outra alternativa poderia ser pior, visto que a grande maioria das economias está “capengas”.
Por isso, o discurso do Ministro Mantega renovando uma proposta antiga de mudar o dólar por uma cesta de moedas ganha manchetes, mas não deve ir além de uma manifestação para ganhar espaço e criar um fato, pois continua ainda se configurando inviável.
Em síntese, podemos ter agora mais claramente dois “players” fortes desvirtuando o cenário do comércio exterior, a China e os Estados Unidos.
O Brasil foi a Seul fazer coro juntamente com os demais países, exceto Estados Unidos e China, mas precisa entender que se o “quantitative easing” não vingar terá mais inflação, este é a consequência concreta, pois as “commodities” terão os preços elevados e não poderá apreciar compensatoriamente o câmbio para equalizar a relação, pois corre o risco de desindustrializar o país. Seremos cada vez mais coloniais nas exportações com produtos em alta e importaremos cada vez mais do exterior. Se der certo, a economia americana tenderá a se recuperar e com isto ressurgirá um grande comprador e o dólar se valorizará mundialmente.
No comércio exterior ainda somos pequenos e fundamentalmente exportamos “commodities” alimentos e minérios, e o mundo é comprador tranquilo destes itens.
O Ministro Mantega, ontem, deu evidente demonstração de que, apesar de não tê-la feita no atual governo, sabe certinho a lição sobre o que precisa ser feito na área fiscal para que o juro seja reduzido e o câmbio mais equilibrado.