A reunião do G-20 que terá início amanhã em Seul, Coréia do Sul, encerrando-se na sexta-feira está ensejando muitas declarações prévias, que deixam evidente que este será um evento diferente das quatro cúpulas antecedentes, quando prevaleceu o…
A reunião do G-20 que terá início amanhã em Seul, Coréia do Sul, encerrando-se na sexta-feira está ensejando muitas declarações prévias, que deixam evidente que este será um evento diferente das quatro cúpulas antecedentes, quando prevaleceu o interesse coletivo em busca de soluções para as crises, sendo que agora, claramente, o interesse individual prevalecerá sobre o coletivo e há pontos assimétricos de difícil convergência para o consenso.
Por isso, temos destacado que esperamos decisões genéricas focando declarações de intenções, mas não temos expectativas de que os problemas centrais conquistem avanços efetivos.
A China, habilmente, promoveu ontem um movimento, no nosso entender intencional para esvaziar as pressões durante a cúpula, que ampliou a oscilação do Yuan e acabou por provocar queda do dólar, tendo como contraposição consequente a valorização das “commodities” no mercado global.
O yuan registrou a maior alta num único dia desde o fim da âncora cambial com o dólar em 2005, criando expectativas de que o governo chinês poderá deixar sua moeda se valorizar mais rapidamente, em linha com o pleito dos Estados Unidos e demais países exportadores. A moeda chinesa subiu 0,5% indo a 6,6424 yuans por dólar. No nosso entender foi um movimento pontual, estratégico pré-G-20, permitindo que a China chegue mais forte à cúpula no seu enfrentamento com os Estados Unidos. Ao mesmo tempo, ocorreu comunicado da Administração Estatal do Câmbio da China, em que anunciou que vai forçar os bancos a reter mais moedas estrangeiras e fortalecer o processo de auditoria das captações de recursos internacionais, blindando-se contra a entrada de recursos especulativos no país.
O Ministro Mantega, que até onde se sabe não é um “expert” na complexidade do câmbio, mas que conseguiu cunhar a expressão “guerra cambial”, maior do que o fato em si, parece que está lutando para permanecer no Ministério da Fazenda do novo governo. Chegou a Seul fazendo uma proposta “requentada” de substituição do dólar, como moeda de referência, por uma “cesta de moedas”, já inúmeras vezes ventilada mas de difícil aplicabilidade, visto que, inicialmente, “derreteria mais e muito rápido” o dólar que hoje concentra a grande maioria percentual das reservas cambiais do mundo. Destruiria o valor patrimonial efetivo das reservas, e, também porque as demais moedas ainda estão fragilizadas como reserva de valor face à debilidade predominante das economias dos países ditos desenvolvidos, o problema poderia tornar-se maior.
Mas o que mais surpreendeu nas declarações do Ministro Mantega, que deixa clara a sua campanha pró-permanência, foi a declaração em que assegura que os juros vão baixar a partir de 2011 com a redução de gastos públicos, o que contraria o receituário aplicado pelo Ministério da Fazenda atual capitaneado por ele. Claramente, parece estar querendo sinalizar um alinhamento não opositor ao que tem sido manifestado como foco relevante pela nova Presidente. É de se perguntar: E por que não o fez antes? Se assim tivesse agido, o dólar estaria mais equilibrado pois não teria sido necessário utilizar o seu preço depreciado para coadjuvar a taxa de juro no controle das pressões inflacionárias, em grande parte advinda dos gastos públicos excessivos.
Mas o alento contido na declaração é a evidência de que tem conhecimento absoluto do que deveria ter sido feito e não o foi, mas que necessariamente precisará ser implementado.
Dias atrás, destacamos que o Brasil poderá ser contra-argumentado em sua retórica para o G-20 e poderia ser arguido sobre as suas imperfeições, tais como, o real já estar depreciado como política de governo e não em consequência de fluxo de recursos externos e também por adotar uma taxa de juro incompatível, etc.
Oportuno, observar a entrevista ao jornal Valor do respeitadíssimo professor Barry Eichengreen, da Universidade da Califórnia em Berkeley, uma das maiores autoridades do mundo em sistemas monetários internacionais.
Ardilosamente, questiona o entrevistador “perguntaria aos meus amigos no Brasil: vocês estariam melhores se os EUA sofressem uma década perdida?”
Defende e fundamenta a atitude do FED americano e na longa entrevista destaca ainda: “O que o Brasil está vivendo agora é resultado do fraco crescimento nos EUA. Quando o crescimento nos EUA e nos países avançados é fraco, fica mais difícil para o Brasil exportar, e isso acaba refletindo no fortalecimento da sua moeda. Se alguém tem um vírus e a febre começa a subir, o problema é a febre ou o vírus? O problema é a moeda fraca ou o fraco crescimento econômico?
Eu diria “que é o fraco crescimento econômico.”, conclui.
Com isto volta ao entendimento prevalecente pós término do Acordo de Bretton Woods, quando as moedas passaram a repercutir preço alinhado com a situação econômica dos países. A idéia do professor sugere o entendimento de que a moeda americana se desvalorizaria normalmente pelo fraco crescimento econômico americano e não diretamente pelos pacotes que injetaram volumes expressivos de dólares na economia americana.
Se pegarmos um gancho nas observações do professor, e, retomarmos a avaliação das razões pelas quais o Brasil tem acentuado o fluxo de recursos quando os Estados Unidos injeta liquidez no mercado financeiro, aproveitando a colocação da febre ou do vírus, fica fácil entender que é o nosso juro elevado que atrai os recursos especulativos, sendo a causa, e não a injeção de recursos em dólares injetados pelo FED americano.
O Brasil precisa estar preparado para ser arguido sobre suas imperfeições e fragilidades, que levantadas invalidarão os argumentos contra a injeção de dólares pelo FED.
As consequências reais aqui são outras. O dólar se fragiliza, as “commodities” registram alta nos preços e sofremos pressões inflacionárias nos alimentos, em especial, e alguns outros insumos.
A intensificação do fluxo decorre de imperfeição nossa, portanto não é sustentável a tese de que os Estados Unidos sejam culpados pela apreciação do real. Real apreciado é política de governo, o problema é o acúmulo de reservas cambiais de má qualidade num ambiente em que o país não dispõe de poupança fiscal e o custo de carregamento é elevado.
No nosso entendimento, o governo brasileiro já deveria estar agindo com mais medidas para blindar o país no curto e médio prazo, pois no longo se espera por mudanças radicais na política fiscal, cambial e juro pelo novo governo, que promoverão a correção das nossas imperfeições.
Estaria sendo previdente, passando por novos normativos restritivos as operações com exposição em variação cambial, estímulos para captações externas em reais, novos tributos seja aumento e/ou abrangência da incidência do IOF e inclusão do IR, etc. e redirecionamento da dinâmica do BCB com seus leilões e suas estratégias de indução aos bancos manterem posições “vendidas” no mercado à vista.
Certamente chegaríamos com postura mais forte no G-20, mostrando que as novas medidas se fundamentam na proteção dos interesses do país face ao cenário externo, numa atitude alinhada com o discurso.
Aliás, nos parece que o mercado de câmbio está convivendo com esta expectativa!