Não precisaria ser visionário, mas tão somente realista, para antever o resultado da cúpula do G-20, que confirmou alinhamento nos temas genéricos e muitas boas intenções, que certamente não serão cumpridas, nos temas fundamentais…
Não precisaria ser visionário, mas tão somente realista, para antever o resultado da cúpula do G-20, que confirmou alinhamento nos temas genéricos e muitas boas intenções, que certamente não serão cumpridas, nos temas fundamentais.
Notoriamente é inquestionável neste momento a prevalência dos interesses individuais em detrimento do interesse coletivo, como tivemos oportunidade de colocar semanas atrás em nossas abordagens sobre o tema.
Grandes não querem ficar menores e menores estão querendo ficar grandes, e esta disputa envolve inúmeros vetores que passam fundamentalmente por atitudes estratégicas defensivas num certo sentido e muito agressivas em outros.
Envolve as atividades econômicas dos países atores principais do mundo globalizado que precisam ser revitalizadas e mudanças de comportamentos por aqueles que pleiteiam entrar no circulo de importância e influência.
Os Estados Unidos tem sido o grande “clearing” do mercado global e com esta posição acumulou passivos comerciais expressivos e, consequente deste contexto, chegou ao ponto máximo de suporte a esta situação e, tendo entrado numa crise financeira oriunda de seus próprios descuidos e irresponsabilidades em relação ao mercado financeiro, viu seu mercado interno fragilizar-se, precisando então focar a intensificação de suas vendas ao mercado externo e a contenção das compras.
Ocorre, que os grandes beneficiários da bancagem do déficit comercial pelos Estados Unidos, China, União Européia, com ênfase a Alemanha, e Japão tem mercados internos poucos expressivos e que não dariam sustentabilidade a mudança da matriz em que se fizeram grandes, pois teriam que “devolver” para os Estados Unidos, no quadro atual, as condições para que restabeleça a vitalidade de sua economia, na medida em que deve demorar a recuperação do seu mercado interno, base do seu PIB.
Com base nos dados do FMI de 2009, os PIB global era de quase US$ 58,0 Tri e a União Européia representava 28%, com destaque para Alemanha com 5,8% e França com 4,6%; Estados Unidos 24,6%; Japão 8,7% e China 8,5%, ou seja este grupo representa 70% do todo.
Discussão de gente “grande” entre os Estados Unidos de um lado com os seus 24,6% e os demais 45,4% do outro lado, mas dependentes dos Estados Unidos para consolidarem seus superávits comerciais, colocados em risco pela forte desvalorização do dólar, que retira lhes competitividade e potencializa a competitividade americana.
O “Plano de Ação de Seul” determina que as economias do G-20 devem mover-se no sentido de um “sistema de taxas de câmbio mais determinado pelo mercado” (nota: fundamento do mercado flutuante) e que os países devem “abster-se de desvalorizações competitivas de moedas” (nota: aqui praticamos o inverso, valorizamos o real, como política de governo para conter pressões inflacionárias).
O Brasil que em 2009 representava 2,7% do PIB total, e que tem o seu PIB fortemente construído por seu mercado interno, tem pouco a ver com este enfrentamento de gigantes, e, hoje, potencialmente é exportador de alimentos e minérios, algo desejável pelo mundo, mas que não é bastante para colocar o país em lugar de destaque no comércio exterior, pouco tem a ver com esta disputa acirrada diretamente.
Quanto a recomendação contida no “Plano de Ação de Seul” no sentido de que o sistema de taxas de câmbio seja mais determinado pelo mercado, no nosso caso se aplicaria na interrupção da mistura de política monetária com política cambial, induzindo a apreciação do real para utilização com “âncora” de controle inflacionário.
Indiretamente, sofre consequências decorrentes de suas próprias imperfeições, qual seja a adoção de uma taxa de juro absolutamente incompatível com o seu grau de risco que atrai capitais especulativos, e, por sofrer pressões inflacionárias decorrentes dos preços dos alimentos, principalmente, já que com o dólar desvalorizado no exterior o preço das “commodities” agrícolas se elevam rapidamente, já que passam a representar reserva de valor.
O Brasil foi a Seul, procurou ganhar e construir manchetes pontuais as quais não está correlacionado em termos efetivos.
O Ministro Mantega, depois acompanhado pelo Presidente Lula, buscou numa antiga aspiração de Lord Keynes de ter uma moeda referencial mundial o mote para sustentar pronunciamentos, mas esta é uma questão que o mundo tem examinado e ainda não identificou uma solução mais viável do que a moeda americana. Não conseguiram fazer uma manchete com a mesma repercussão da cunhada pelo próprio Ministro Mantega, que foi a “guerra cambial”, da qual afinal se existe, a rigor, o Brasil não é um participante.
O dólar por si só revela problemas mas é mais fácil perceber-se a causa e até identificar-se qual é o caminho da solução. O que seria se juntássemos todas estas moedas desvalorizadas e valorizadas querendo ser desvalorizadas num “balaio” só, ponderando pelos percentuais de participação no PIB mundial dos países? Volatilidade e insegurança de não identificar de imediato os vetores determinantes. A bagunça seria bem maior.
Ao Brasil pós G-20 resta voltar para casa e fazer a “lição de casa” que o Ministro Mantega evidenciou, em Seul, conhecer bem, a despeito de não tê-la praticado no longo período que está à frente do Ministério da Fazenda.
Nossos problemas, como costumamos afirmar, estão aqui mesmo e se continuarmos buscar culpados externos estaremos ganhando tempo mas perdendo tempo útil para nos redirecionarmos na execução de uma nova matriz para política fiscal, juro e câmbio, em especial.
No caso brasileiro, se não exportamos mais o culpado é o próprio governo, pois se não induzisse a apreciação do real, certamente poderíamos exportar um pouco mais e não estaríamos correndo o risco de desindustrialização ou de ter uma indústria que passará a desempregar e a passar a estampar tão somente a sua marca em produtos semi-acabados oriundos da China.
No curto prazo, acreditamos que o governo tenda a adotar medidas para continuar contendo a apreciação do real, pela ponta do Ministério da Fazenda, e atuação no mercado de câmbio à vista pelo BCB para não deixar a apreciação ser relevante ou contingenciando a para não comprometer a inflação. O contraditório deverá prevalecer por não existir outros caminhos e o governo certamente não deseja elevar a taxa SELIC até o final do seu mandato.
Mas é fundamental que o “novo governo” comece a emitir sinais alinhados e coerentes de que fará a “lição de casa” que não foi feito pelo antecessor, focando menores gastos público, maiores investimentos em infra-estrutura, redução do juro e eliminar a utilização do câmbio como âncora do controle inflacionário.
De imediato é possível que o atual governo continue adotando medidas paliativas para conter a apreciação do real. Precisa ter cuidados com as opções que adotar, pois tendo em suas reservas cambiais, grande volume de dólares especulativos ingressados no país, se errarem poderá provocar debandada de recursos externos, já que o capital especulativo não costuma perdoar os países que, até a véspera, os acolhiam de forma tão generosa.
É preciso ter cautela ao tentar coibir as conseqüências do nó presente da taxa de juros com a taxa de câmbio. Será necessário uma calibragem fina, objetiva e sem discursos prévios para ganhar manchetes.
O mercado de câmbio convive no momento com o sentimento de que algo novo virá, e, se for para vir, que venha logo, evidentemente não com o perfil duradouro, mas tão somente temporário até que se conquiste os acertos com uma nova diretriz no próximo governo.