A mudança conceitual do investidor estrangeiro em relação ao Brasil foi subestimada pelo governo, e isto torna menos eficaz a reversão das normas restritivas ao ingresso ao capital estrangeiro, notoriamente tardia

É bem verdade que a recente pressão sobre o preço da moeda americana no nosso mercado de câmbio não pode ser atribuída à deficiência do fluxo cambial presente, que mantém a perspectiva de que será insuficiente, mas se mantém positivo desde abril último, amparado pela captação da ordem de US$ 11,0 Bi realizada pela Petrobrás.

Os bancos têm se mantido comprados no mercado de câmbio à vista, portanto, ainda não faltam dólares para atender a demanda. Ao final da semana passada detinham posição comprada em torno de US$ 7,0 Bi no mercado à vista.

O problema se agravou, nesta fase recente, a partir do mercado futuro.

O governo, no dia 4 de junho último, reverteu a zero a tributação de IOF de 6% incidente sobre o fluxo de recursos direcionados para renda fixa, objetivando atrair capitais de longo prazo e assim melhorar o fluxo cambial e mitigar as pressões altistas sobre as taxas de juros de longo prazo. Contudo, em linha simétrica não reverteu o IOF de 1% sobre o mercado de derivativos, procurando preservar para si a “gestão da liquidez no mercado futuro e o monitoramento da formação do preço da moeda”.

Houve então a evidência de que o Brasil está fora do radar dos investidores estrangeiros de longo prazo, mais propensos a sair do que a entrar no país, deixando evidente que, investidor, se houver, é com recurso especulativo.

O mercado pressionou, via apreciação do dólar, para que o governo liberasse o IOF de 1% sobre os derivativos. Esta alta, mixada com um ambiente externo de valorização do dólar que, contudo, não era a causa principal a afetar o comportamento local, provocou preocupações às empresas que detêm passivos expostos em moeda estrangeira, e, assim acentuou-se a demanda por “hedge” no mercado futuro, que estava travado e com baixa liquidez.

Os bancos, que já detinham posição vendida no mercado futuro de dólar, promoveram a liquidez para a demanda das empresas e com isto aumentaram suas posições vendidas neste mercado, fazendo repercutir na taxa os efeitos da pressão promovida pela demanda das empresas. Esta atitude dos bancos de suprir a demanda por “hedge” das empresas com o aumento de suas posições vendidas no mercado futuro de dólar, certamente, estava amparada na expectativa de que o governo, por inevitável, viria a desonerar o IOF de 1% dos derivativos, e isto determinaria a queda do preço da moeda americana, pois aumentaria a liquidez deste segmento.

Este é o nosso diagnóstico do ocorrido recentemente, por isso, nossa convicção é de que a taxa do dólar será depreciada gradualmente após a reversão da tributação com IOF de 1% sobre os derivativos, pois a liquidez no mercado futuro, que agora passará a ser intensificada pelo próprio giro do mercado,  deverá melhorar e, como usual, este segmento é que passará a formar o preço da moeda americana de forma mais direta, ditando o comportamento também no mercado à vista.

Este é um aspecto sobre o nosso mercado, que sofreu um estresse momentâneo e que foi precipitado por fatos pontuais, que envolveu inclusive algumas declarações contraditórias por parte dos representantes do governo, deixando transparecer certo descaso com o comportamento do preço da moeda americana, exatamente no momento em que o Copom intensificava o rigor no enfrentamento da inflação. Os efeitos causados poderão ser agora descontaminados da taxa cambial presente, e teremos uma relativa apreciação do real de imediato.

Contudo, há outro aspecto relevante e de peso impactando sobre as perspectivas do mercado de câmbio que é a tendência de fluxo cambial positivo cadente ante um déficit em transações correntes em ascensão. Este fato coloca o preço da moeda americana em perspectiva de alta, considerando que a liquidez internacional tende à retração e encarecimento com a eventual redução do programa americano de incentivo à retomada da atividade de sua economia. Este coloca em tendência gradual de alta a taxa cambial, se não houver melhora do fluxo, ao longo do ano.

Há também um forte movimento especulativo no mercado internacional em torno da eventual decisão do FED de reduzir o programa de incentivos, induzindo um comportamento e atitudes como se tudo fosse acabar de imediato, quando na realidade deverá, quando ocorrer, ser gradualíssimo para não desconstruir o que a economia, ainda moderadamente, começa a evidenciar de melhora. É preciso não superlativar este fato além da razoabilidade.

O fato concreto mais importante é que na medida em que a economia americana demonstra revitalizar-se, passa a atrair os investimentos internacionais em detrimento, principalmente, dos países emergentes, que passam a ter maior dificuldade de acesso a recursos externos.

Mas, o fato notório é que os sinais de perda de atratividade do Brasil, perante os investidores estrangeiros, ocorreu de forma antecedente a esta nova perspectiva de menor disponibilidade de recursos no mercado internacional face à redução do programa de incentivo americano. E, o governo brasileiro não os percebeu com acurácia ou se percebeu os subestimou.

Houve muita clareza já ao final do ano passado que os investidores estrangeiros passaram a acentuar o foco mais crítico sobre as fragilidades do Brasil e a considerar menos suas atribuídas virtudes.

Naquele momento, quando ainda havia ambiente favorável e não crítico e negativo como agora, além de liquidez abundante, o governo deveria ter retirado as barreiras tributárias impeditivas ao ingresso de recursos externos, visando restabelecer o fluxo de recursos estrangeiros para o país.

Não o fez, agora o faz de forma tardia e até com certa indecisão, quando já há sinais de que poderemos ter insuficiência de fluxos de recursos para financiar o crescente déficit em transações correntes.

Fica o sentimento de que o recurso que poderá ter interesse pelo Brasil é o especulativo, ao qual “as portas estão reabertas”, num momento em que a Selic deve continuar a ser elevada.

É importante separar os fatores de influência sobre o preço da moeda americana no nosso mercado de câmbio.

Um foi recente e pontual face às atitudes, envolvendo até contraditórios, e circunstâncias momentâneas ocorridas e que será corrigido no curtíssimo prazo, com a reversão tardia das normas restritivas ao ingresso de recursos externos que melhorará a liquidez no mercado futuro, podendo ser maior ou menor na razão direta de atrair investimentos especulativos.

Outro, envolve o cenário em perspectiva, consequente da ausência de atitudes “prudenciais”, face ao cenário adverso sinalizado para o Brasil já no ano passado, que deveria ter envolvido as medidas que foram adotadas neste mês,  e que poderá colocar em trajetória de alta gradual o preço da moeda americana.

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