O ex-Presidente do Banco Central Henrique Meirelles, ao longo de seu mandato durante o governo do Presidente Lula, usou e abusou em utilizar o preço da moeda americana depreciado para torná-lo coadjuvante combinado com o juro SELIC no combate às pressões inflacionárias oriundas de um governo que gastava muito e sem qualidade.
Em alguns momentos foi efetivamente a principal ancora do controle inflacionário.
No seu objetivo em foco conseguiu sucesso, haja vista que a inflação ficou comportada. Porém, o contexto apresentava um Brasil que atraia enormes volumes líquidos de recursos externos, o que conduziu o BC à necessidade de intervir no mercado além do que seria razoável com leilões de compra de divisas excessivas a ponto de tornar as posições de câmbio dos bancos no mercado à vista “vendidas”, de forma a ter o apoio dos mesmos à sua estratégia, visto que era altamente rentável para os bancos e bastante confortável, havia farta oferta de linhas de crédito externa e custos atraentes, o que lhes permitia excepcional oportunidade de na ponta final captarem reais e os rentabilizar no mercado interno.
Embora um sucesso no controle da inflação, inegavelmente deixou sequelas e danos enormes na economia brasileira. Provocou uma forte desindustrialização no país, desestimulou os investimentos privados, desestimulou as exportações a ponto do país se tornar um país de exportações coloniais e altamente dependente da China, e, introduziu no mercado interno brasileiro, como matéria prima, subproduto ou produto final, expressiva participação das importações em detrimento da indústria nacional.
Durante muito tempo foi fácil ganhar muito especulando no mercado de derivativos, visto que a tendência do preço da moeda americana com a estratégia montada era de apreciação do real, que era encoberta pelo argumento de que a causa era o fluxo cambial liquido excessivamente positivo, mas no fundo era consequência da estratégia engendrada. No extremo a relação paritária atingiu US$ 1,00/R$ 1,50.
Até que, de repente, os “ventos mudaram” e o movimento especulativo foi atingido duramente por outro movimento especulativo inverso e intenso e que provocou reversão expressiva e inúmeros grandes grupos envolvidos na especulação foram duramente afetados pelas consequências.
Atualmente, na gestão do Presidente do BC Alexandre Tombini, reiteradas afirmações de que a inflação convergirá para o centro da meta tem sido feitas ao longo de seu mandato.
A taxa SELIC fez a reversão de 7,50% para 11,00% e deverá ir um pouco além como tendência fortalecida pelo IPCA de 0,92% em março após 0,69% em fevereiro.
Há notórios sinais de que o BC está buscando, num ambiente adverso para o nosso setor externo, repetir a receita anterior e induzir o real à apreciação. Mas o contexto atual é absolutamente diverso do prevalecente no mandato de Henrique Meirelles, o que dificulta em muito a prática de estratégia similar.
A inflação está em torno do pico mais elevado da meta de inflação como tendência e resistente, e na realidade não fosse o represamento dos preços administrados de grande impacto, estaria bem acima dos parâmetros atuais. E não são pequenos os ajustes pendentes dos preços administrados que em algum momento terão que ser concedidos, antes de se almejar a conquista do centro da meta. Nenhuma expectativa de curto ou médio prazo para este enquadramento. A leitura detalhada do IPCA de março valida a projeção mediana contida na mais recente edição do BOLETIM FOCUS que foi de 6,35%, não se descartando contudo, que venha a superar o piso alto de 6,5%.
O fluxo cambial líquido do 1º trimestre é absolutamente insuficiente para as necessidades do país que já trouxe do ano passado em insuficiência da ordem de US$ 18,597 Bi, que estava reduzido a US$ 16,2 Bi com o fluxo positivo fechado até março e agora ampliado com o fluxo negativo registrado até 4 de abril a US$ 18,1 Bi.
Não é razoável buscar-se comparar o fluxo do mesmo período do ano passado, tendo em vista que o juro prevalecente à época era de 7,25% e atualmente é de 11,00%, ou seja, 375 pontos acima num ambiente em que os países desenvolvidos praticam juros negativos e os seus equivalentes emergentes juros bem menores. A atratividade da taxa de juro atual é muitíssima maior do que no mesmo período em 2013.
Por outro lado, os bancos estão “vendidos” no mercado de câmbio à vista em US$ 18,1 Bi não por indução do BC, como ao tempo de Henrique Meirelles que excedia as compras por parte do BC acima do fluxo positivo liquido, mas porque ocorre insuficiência de fluxo cambial e estão sendo ancoradas não por linhas externas fartas, mas sim por financiamentos concedidos pelo BC em moeda americana no montante de US$ 11,7 Bi que representam 3,1% das reservas cambiais e o restante com linhas externas.
Para os bancos a situação não é desconfortante, pois com posições vendidas captam reais e os rentabilizam com considerável ganho e o financiador do maior volume das linhas em moeda americana em que ancoram as posições “vendidas” é o BC. Mas até quando é suportável esta situação?
A rigor o BC deveria ter suprido o mercado de câmbio à vista com leilões de venda à vista para atender a liquidez que o mercado está sem capacidade de autogerar e retirar efetivamente as divisas das reservas cambiais, porém, certamente não o fez até o momento devido as repercussões que isto poderia causar sobre a formação do preço da moeda, pois deixaria evidente que o país não está atraindo suficiente volume de ingressos de recursos em moeda estrangeira.
Com um montante faltante de ingressos da ordem de US$ 18,1 Bi, é absolutamente falsa a ideia de que é o fluxo de recursos para o país, que na realidade em termos líquidos é irrisório, a causa da apreciação do real.
Com um montante faltante de ingressos de recursos no país da ordem de US$ 18,1 Bi é absolutamente falsa a ideia de que é o fluxo de recursos para o país a causa da apreciação real. Na realidade em termos líquidos o fluxo cambial atinge irrisórios US$ 2,058 Bi até final do 1º trimestre, porém já reduzido a míseros US$ 159,0 Mi até 4 de abril último, dado o fluxo negativo neste curto período de US$ 1,899 Bi.
De que fluxo está se falando para justificar a apreciação do real? Simplesmente em termos líquidos até 4 de abril não existe!
Com base nos fundamentos a tendência do preço da moeda americana no Brasil deveria ser de alta.
Há um forte equívoco nas observações que campeiam as abordagens pela mídia na atualidade, onde ocorre uma propagação, até com sinais de “orquestração” de que o país está tendo ingressos magnânimos de divisas.
Os números até 4 de abril foram divulgados hoje e temos um fluxo cambial liquido no ano de tão somente US$ 159,0 Mi, que aponta negativo comercial US$ 1,171 Bi e positivo financeiro US$ 1,330 Bi.
Na realidade há um fluxo forte de ingresso de capitais especulativos, algumas captações do setor privado e algumas expressivas “chapa branca” por empresas ligadas ao governo, mas, há também na contra ponta um movimento intenso de saídas de capitais estrangeiros do país. Ingressou no país neste ano US$ 181,255 Bi e saiu US$ 181,096 Bi.
Ocorre uma euforia na Bovespa, também por questões eleitorais, e no mercado de renda fixa, canais para os quais flui o capital especulativo entrante, mas este é um capital oportunista em busca de rentabilidade e que nada constrói para o país.
Isto é euforia pontual com capital de má qualidade buscando rentabilidade de oportunidade e que alavanca preços e volumes de giro, nada tem a ver com mudança de humor externo sugerindo que haja otimismo e recuperação de credibilidade do país perante a comunidade internacional.
Tanto é que o fluxo de saída de capitais, supostamente de qualidade, é muito intenso, algo que tem merecido pouca atenção da mídia. O Brasil tem muitos compromissos este ano, como empréstimos de curto e longo prazo do setor privado da ordem de US$ 83,4 Bi que poderão não ser rolados totalmente, saldo liquido a pagar de comércio exterior em torno de US$ 10,4 Bi, etc….
O olhar de observação externa sobre o Brasil não sugere mudanças, mas a cada dia agrega novos aliados críticos reavaliando o “status quo” do país, com ocorreu ontem com o relatório do FMI, reduzindo as perspectivas de crescimento do PIB.
O próprio governo projeta um déficit em transações correntes expressivo da ordem de US$ 80,0 Bi, e que tende a ser maior com a balança comercial já acumulando mais de US$ 6,0 Bi negativos e com um viés de que as exportações sejam cadentes por falta de atratividade dos produtos brasileiros e pela pressão negativa do real excessivamente apreciado e que as importações sejam crescentes.
O que impacta na formação do preço no mercado à vista é o fluxo cambial líquido, se positivo e expressivo tende a depreciar o preço da moeda americana e se negativo expressivo tende a apreciá-la, afora as intervenções do BC no mercado futuro de dólar tendendo à indução pró-apreciação do real com a oferta demasiada de “swaps cambiais” e situações atípicas externas.
Mas não podemos perder de vista que no caso do Brasil, atualmente, já há um saldo de insuficiência de fluxo cambial migrado e um fluxo inexpressivo este ano da ordem de US$ 18,1 Bi, que evidenciam o quanto o país precisa conquistar de fluxo cambial liquido antes que o fluxo comece a influenciar a apreciação do real , diferente contexto do tempo do ex-Presidente do BC Henrique Meirelles, quando eram induzidas por intervenções do BC comprando divisas além do excedente do fluxo e assim levando os bancos a formarem posições “vendidas”.
A estratégia de utilização do preço da moeda americana depreciada para juntamente com o juro repercutir neutralizando a espiral inflacionária aquecida configura-se como bastante temerária nas circunstâncias atuais.
Duradoura, provocará intensa volatilidade e com o real apreciado afetará novamente a indústria nacional promovendo a desindustrialização tão temida, com reflexos nos investimentos e acentuando as importações para substituir o produto ou insumos nacionais.
A Bovespa registrou uma alta expressiva e não bem fundamentada, mesclando expectativas eleitorais e alguns fatos adicionais, e por ter subido de forma rápida pode ensejar ao capital especulativo a oportunidade de realização e saída do país, valendo inclusive do atrativo do preço do dólar barato que possibilita a remessa de maior volume de dólares. Afinal, que atrativo existe além deste na Bovespa para o especulador internacional.
Por outro lado, a taxa cambial com o real excessivamente apreciado motiva os detentores de passivos vincendos este ano a anteciparem a contratação das operações de câmbio para as remessas, intensificando a demanda no mercado à vista, e, ao mesmo tempo, poderá se constituir em fator de desestimulo ao capital especulativo que foca a rentabilidade na renda fixa, pois fica com o risco de um ajuste abrupto da taxa cambial com depreciação do real, o que obriga a realizar “hedge” que poderá ter um custo redutor da rentabilidade objetivada.
Entendemos que o grande risco presente é de termos um fluxo intenso de capitais especulativos no curto prazo impactando em preços de ativos na Bovespa, mercado de juros, e demanda de renda fixa, que poderá desarmar-se uma vez atingido o objetivo do ganho fácil e rápido, retirando do país o fluxo cambial que trouxe sem ter construído um saldo de fluxo cambial liquido positivo, pois há um intenso movimento de saídas de capitais do país em ser devidamente considerado.
Poderá ocorrer então uma reversão forte impactando nos preços dos ativos, e deixando exposto tão somente a continuidade do volume de saídas que tenderá a construir saldo negativo do fluxo cambial, com enormes repercussões.
O dólar poderá então buscar a sua verdadeira tendência e preço e as perdas no todo neste caso não seriam pequenas.