“Sell off” na Bovespa provoca queda, mas queda do preço do dólar fere coerência

Faz muitos anos que utilizamos pela vez primeira a assertiva que “nem tudo que ocorre no câmbio é exatamente como se imagina”, e estamos num destes momentos, pois as projeções gráficas e estudos técnicos não conseguem captar os fatores e vetores diversos imperceptíveis nestas análises, que acabam por ter elevada influência na formação do preço da moeda americana no Brasil.

O Brasil neste momento “não precisa” de fatores externos para ter a Bovespa devolvendo seus lucros acentuados recentes e elevar o preço da moeda americana de forma mais compatível com o cenário macroeconômico extremamente afetado pelo contexto político e jurídico absolutamente confusos.

Não há estudo gráfico ou técnico que consiga captar os impactos perceptíveis tão somente pelo “feeling” e domesticamente considerados na formação do preço a partir de expectativas prospectivas forjadas com mais rigor e menos ufanismo de otimismo.

Desde o início do ano temos salientado que havia menosprezo nas análises, o que agora já tem merecido alguma “descoberta e maior consideração” por alguns setores , de que os capitais estrangeiros especulativos que aportaram no país e que impulsionaram a pujante alta da Bovespa eram forjados através de operações de “carry trade” facilitados pela abundante liquidez internacional e razoável margem diferencial de juros, especialmente entre o real e o dólar, e que visavam basicamente obter rentabilidade especulativa de oportunidade.

Sinalizamos inúmeras vezes, indo contra a maior parte das opiniões eufóricas, que a queda da nossa taxa SELIC, para a qual o mercado financeiro ainda almeja mais uma redução de 0,25%, coincidindo com a elevação da taxa de juro americana, provocaria o estreitamento de margens e tenderia a “quebrar” o apetite pelo risco Brasil e poderia determinar o refluxo dos capitais estrangeiros especulativos aqui aportados.

Esta percepção que de a muito ressaltamos vem agora sendo melhor observada pelo mercado financeiro, que parece agora mais sensato no seu eufórico “status quo”.

Há oportunidades mais concretas e interessantes, até com níveis de riscos menores, em outros países emergentes.

Ontem ainda salientamos que vem ganhando expressão o volume de saídas líquidas financeiras do país, tendência que deve se acentuar, e que poderá, hipótese remota, em algum momento subtrair o resultado positivo que a balança comercial (exportações menos importações) vem proporcionando, valendo como alerta o indicador da FGV que aponta que o comércio exterior está menos dinâmico em 2018, com queda maior nas exportações do que nas importações.

Não deixamos de salientar ao longo do 1º trimestre que o euforismo ante comportamento da atividade econômica fugia do razoável e que não era tão expressivo quanto propagado, o que agora vem sendo confirmado pelo IBC-Br do BC e também abordamos que o sentimento em relação à inflação distanciava-se dos indicadores oficiais.

Demos ênfase à perspectiva de forte acirramento em torno das questões políticas, seus imbróglios gerando incertezas e dúvidas, afetando seriamente o contexto econômico que tenderia e continua sinalizando que, a despeito da queda da SELIC e até da inflação oficial a parâmetros inimagináveis, não há incremento efetivo nos investimentos (FBCF) e nem aumento recuperatório considerável no emprego, renda e consumo.

Evidentemente há fatores externos inúmeros, mas como dissemos o Brasil tem motivos e razões próprias para fundamentar um forte ajuste da Bolsa e do preço da moeda americana, fazendo sucumbir ante as realidades não detectáveis a não ser por “feeling” os estudos e projeções técnicas e gráficas.

Os fatores externos agregam preocupações para um país emergente como o Brasil, mas não podem e não devem ter atribuídas “culpabilidades” diretas pelos impactos que causam nos países emergentes. Afinal quem está reduzindo a taxa de juro num momento em que o mundo a eleva é o Brasil, que fica à mercê também de atitudes dos governos de países desenvolvidos sobre a manutenção ou não dos seus programas de liquidez, que pode sofrer reflexos das alterações para melhor das políticas tributárias dos países desenvolvidos, com ênfase ao ocorrido nos Estados Unidos, de vez que nada foi feito em termos de reforma tributária no Brasil. É preciso compreender que o mundo está em concorrência.

Os problemas de exportação de frangos e outros alimentos decorrem de “pecados internos” e ficamos à mercê das consequências de eventual agravamento da “guerra comercial” entre economias fortes.

Enfim, o cenário brasileiro fundamenta bem, quando olhado com rigor, a ocorrência de “sell off” na Bovespa, mesmo que ocorra volatilidade que será natural, mas não encontra respaldo para fundamentar que ao mesmo tempo ocorra apreciação do real.

Fica um sentimento de interferência sutil das autoridades monetárias na formação do preço da moeda americana no nosso mercado, ativo mais sensível ao cenário que pontifica incertezas e dúvidas, evidentemente com o intuito de evitar impactos inflacionários que poderiam “comprometer” os indicadores benignos que têm sido gerados.

Doravante, o cenário prospectivo eleitoral sugere momentos de intensa perturbação, incertezas, dúvidas e muita tensão política e, por que não, também no Judiciário.

Este quadro tende a conduzir investidores especulativos a sair de cena e os não especulativos a assumirem posições mais defensivas, inclusive nos investimentos produtivos, pois não há nenhuma convicção no momento de que governo o país terá em 2019.

Sensatez rigorosa deve ser a postura, reavaliação das projeções para o ano de 2018 mais compatíveis com a realidade, inclusive sobre a esperada próxima queda da SELIC, e certamente com um preço da moeda americana mais elevada.


Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO

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