O FED americano na sua decisão da última quarta feita demonstrou-se hesitante ao deliberar, sem unanimidade, o corte de 0,25% na taxa de juro americana, fato inusitado nos últimos anos, já que não há convicção firme sobre as perspectivas para a continuidade da dinâmica forte da economia americana, e ao induzir o entendimento de que foi um “ajuste”, um fato pontual, ceifou as perspectivas otimistas das Bolsas americanas e, em parte, das bolsas do mundo todo, impactando rapidamente na curva de comportamento do dólar que se revigorou frente às demais moedas fortes do mundo global.
A economia americana tem perspectivas inseguras que envolvem os embates comerciais em que os Estados Unidos é parte, em especial com a China, e que podem impactar na sua dinâmica.
O BC/COPOM mostrou-se surpreendentemente decidido e confirmou as melhores expectativas ao impor substantivo corte na taxa SELIC de 6,5% para 6,0% e não só isto, deixou escancarada a tendência de novos cortes neste ano deixando a perspectiva efetiva de que irá a 5,5% ou até mesmo 5,0% pelo entendimento dos sinais postos.
Havia por parte de muitos analistas a expectativa de que o Comitê poderia ser mais cauteloso, reduzindo tão somente 0,25% aguardando a consumação da aprovação da Reforma da Previdência.
A nossa leitura a respeito da postura da autoridade é de que estrategicamente e de forma sutil com a decisão agressiva e sinalização de repeti-la nas próximas reuniões, o BC/COPOM, como governo, foi incisivo na “transferência da responsabilidade pela retomada da dinamização da atividade econômica de forma contundente para o setor privado”, ante um quadro em que ele, o governo, não tem recursos para adotar intervenções com investimentos estruturais.
Utilizando o “popular”, como já havia pontificado na reunião anterior atribuindo ao setor privado a incumbência de dinamizar a retomada da atividade econômica face à incapacidade governamental no momento, desta vez “transferiu de forma contundente esta obrigação, esta responsabilidade, ao setor produtivo ao fazer uma redução de juro agressiva como estímulo”, aliviando a pressão que vinha sofrendo diretamente de forma isolada, e, complementarmente a disponibilidade dos recursos do FGTS, segundo o governo, deverão promover um choque de demanda, afora outras medidas na mesma direção.
Mas, acreditamos que com esta estratégia alivia a pressão que vem sofrendo dada a inércia da atividade econômica e compartilha a responsabilidade com o setor produtivo ao qual está proporcionando condições, até evidências ao contrário, de condições para investimentos e redução de estoques com o choque de demanda do FGTS.
Ocorre que, na prática a teoria quase sempre é diferente.
A decisão do FED não é sugestiva de que haja direcionamento de recursos para emergentes como o Brasil, cujas perspectivas econômicas não são passíveis de recuperação tão rapidamente, visto que, como vimos ressaltando há capacidade ociosa em torno de 25% no parque produtivo e estoques, num contexto de baixa capacidade de consumo face aos 12 milhões de desempregados e com grande parte da população com alto grau de endividamento o que coloca em questionamento a eficácia da liberação de parte do FGTS.
Não basta o juro para que a economia do país ganhe tração e atratividade para investidores nacionais e estrangeiros.
O governo precisará ter recursos e estes podem vir das privatizações para dar o impulso na atividade econômica, gerando empregos, renda e consumo e na sequência o setor produtivo seguirá a mesma rota e o país entrará na fase de desenvolvimento.
Mas para tanto será necessário tempo, que pode arremeter estas expectativas para além de 2020.
Então, o país poderá ter um “sopro” de otimismo, mas não deverá ser sustentável.
Nos cenários consequentes, vimos a ocorrência de impactos decorrentes do novo cenário no câmbio, como por nós previamente destacado, fato que foi “menosprezado” por grande parte de analistas/economistas, qual seja os efeitos imediatos do estreitamento de juro interno com o juro externo, num “ambiente de fluxo cambial negativo”, afetando o cupom cambial e impulsionando o preço do câmbio a vista, a despeito do país ter excepcional volume de reservas cambiais e estratégias operacionais modernas.
Não acreditamos que o fluxo cambial tenha perspectiva de reverter a tendência negativa presente no curto prazo, e com o estreitamento dos juros interno com o externo ficam inviáveis fluxos de capitais especulativos (carry trade), qualquer pressão de demanda provoca efeitos imediatos na formação do custo do “cupom cambial” e a taxa do mercado a vista revela depreciação do real frente ao dólar.
Adicionalmente, com a decisão do FED e o contexto deixado pela manifestação do órgão pós reunião, o dólar no exterior inverteu o viés de desvalorização para valorização no mercado global.
A nossa BOVESPA deverá evidenciar volatilidade e poderá haver desapontamento com a não intensificação de fluxos externos como esperados, e, com a queda do juro este segmento também perderá atratividade, restando então o impacto negativo no câmbio com a desvalorização do real e reflexos na cadeia produtiva.
Embora haja quem espere que com o CDS do Brasil baixo, hoje 129,9 ante 123,0 no início da semana, o mercado de captação de recursos externos possa ser retomada pelas empresas brasileiras, face também a queda do juro externo, ainda não há convicção, parecendo mesmo que as empresas nacionais estão mais propensas a trocar suas dívidas externas por dívidas internas dada a liquidez presente e o nível de custos que estão sendo oferecidos.
Há baixas perspectivas para incremento dos fluxos de recursos externos para o país no curto/médio prazos, e desta forma o comportamento do cupom cambial deverá continuar sendo observado e sempre que pressionado o BC deverá atuar de forma contundente com todos os instrumentos possíveis.
O viés presente é de depreciação do real.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO