Especulação, ainda que com fundamentos, ocorreu precipitadamente, agora ajustes!

É inegável que o “clima” em torno das perspectivas para o Brasil melhorou sensivelmente após a eleição do novo governo, e o fato provocou movimentos substantivos no mercado de juro, B3 e câmbio, alinhando-se ao presumível novo contexto.

Ainda que a economia real permanecesse frágil e os fundamentos ainda não fossem concretos, havia fundamentos teóricos para ancorar o otimismo que se instalou de imediato.

Desta forma, na ausência de fundamentos sustentáveis, mas de anseios fortemente estimulados, ocorreu um movimento especulativo no sentido de antecipar comportamentos, em especial do dólar e da B3, e isto promoveu alterações precipitadas nos preços e indicadores.

No nosso ver houve um erro, intencional ou não, fomentado pelos especuladores no “timing”, assim ocorreram reações imediatas da B3 e no dólar que, ao que parece, desmereceram as previsíveis ocorrências de retardamentos nas discussões das reformas imprescindíveis, com destaque para a Previdenciária, o que acabou por precipitar excessiva e intempestiva valorização da B3 e apreciação do real.

No momento ocorre algo como uma “revisão” das expectativas quanto às dificuldades e tempo de debates e embates em torno das reformas e uma conscientização de que o cenário para o Brasil é binário, se avançarem as reformas, ótimo, todo o esperado contexto positivo terá efetivas condições de se consolidar, porém, se não houver sucesso o otimismo retrocederá e poderá se reverter ao negativismo.

Toda a perspectiva ainda é de que os avanços serão alcançados, mesmo que parcialmente, mas há a certeza de que haverá lentidão e com a melhor expectativa resultados somente em junho ou julho, após fortes embates nas comissões do Congresso e no Plenário, envolvendo forte oposição corporativa dos setores afetados e com enorme viés ideológico.

Ocorre também com convicção a percepção de que os investidores estrangeiros não reagiram em conformidade com as expectativas de curto e curtíssimo prazo, que ajudaram a fomentar os fundamentos que alicerçaram o movimento que consideramos especulativo que procurou antecipar valorização excessiva da B3 e desvalorização do dólar.

Ainda houve alguma renovação de expectativas quando o FED americano revelou sua postura “paciente” doravante no trato do juro americano, mas ainda assim, os investidores estrangeiros mantiveram a postura de retração.

Há bastante evidência de que os investidores estrangeiros aguardarão que ocorra a materialização efetiva das reformas fundamentais e que se crie soluções para a crise fiscal que desgasta o país e que se estabeleça perspectivas concretas de retomada da atividade econômica.

Ocorrem movimentos de ajustes nos mercados futuros de dólar e da Ibovespa que retratam as percepções dos investidores estrangeiros e nacionais, mas ao mesmo tempo há clareza, observando-se o fluxo cambial, que não ocorre fluxo de recursos estrangeiros.

Então, à margem do contexto brasileiro que é o fundamental para o movimento de perda de ímpeto da B3 para atingir patamar no mínimo de 100 mil pontos e que não sustenta apreciação do dólar em nível abaixo de R$ 3,70, procura-se atribuir a fatores externos reflexos nos comportamentos dos indicadores internos, o que por vezes, são meramente citações, mas efetivamente sem peso neste momento no Brasil.

É verdade que o contexto da economia mundial é preocupante ao revelar tendência de perda de volume de negócios, e que no epicentro desta questão está o embate entre China e Estados Unidos, mas nem sempre os fatos em torno desta questão repercutem de forma correta por aqui, até porque as duas maiores potenciais na medida em que consigam se alinhar podem provocar algumas perdas competitivas para o Brasil.

Para “recuperar o ânimo” enquanto não ocorre o realinhamento das relações entre China e Estados Unidos, estimula-se a crença na expectativa de que a resultante seja uma China mais aberta comercialmente e os Estados Unidos menos protecionista, como fator para manter otimismo em torno da questão.

A ATA do Copom demonstra postura da autoridade monetária de sensatez, cautela e perseverança nas decisões como opção adequada para manter a trajetória da inflação, mesmo em contextos voláteis. Embora não sinalize isto, há percepção crescente de que a taxa SELIC possa vir a ser reduzida face ao viés cadente da inflação e acentuando-se a percepção de que o crescimento do PIB poderá ser inferior às expectativas.

O fato é que o novo contexto prospectivo da efetivação das medidas e reformas imprescindíveis para que os problemas fundamentais do país possam ter sustentável viabilização de soluções “prorroga”, em tese, e retarda os impactos de excessivo otimismo que foi propagado, provocando, então, movimentos corretivos e comportamentos voláteis.

O otimismo, com maior intensidade de sensatez, perdura, mas é imperativo que se dê tempo ao tempo, pois como salientamos o contexto Brasil é binário, embora não se considere factível retrocesso impactante, podendo ocorrer avanços menores do que os almejados pelo governo e fundamentais para o país.


Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO

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