Temos enfatizado o nosso ponto de vista que o dólar não tem por que sinalizar tensões em torno das questões eleitorais, já que entendemos que o Brasil está imune à crise cambial, dispondo de uma situação de excepcional conforto, ancorada na magnitude de suas reservas cambiais e instrumentos operacionais objetivos para suprir a liquidez para demanda por proteção cambial e/ou no mercado à vista.
Aliás, não fosse a “memória” de épocas passadas que ofuscam esta realidade presente, não deveria nem ter tido espaço e ênfase para que se instalasse um movimento especulativo que apreciou a moeda americana em, no mínimo, 10% do seu valor normal e precificado para o momento tenso face aos inúmeros fatores internos e até mesmo externos que estão no radar como impactantes.
Os especuladores conseguiram conduzir o ritmo de formação de preço da moeda americana induzindo-a com cenários antecedentes reminiscentes, até porque a demanda real de proteção cambial e seus demandadores estão alheios a este movimento pós junho, de vez que de há muito estão com “hedge” protegendo seus interesses, e assim sendo não tem com o que se preocupar muito.
Por outro lado, o Banco Central do Brasil parece ter plena consciência desta realidade presente, tendo cometido somente um ato falho semanas atrás quando se arvorou a realizar oferta de 30.000 contratos de swaps cambiais, mas ainda bem que não deu continuidade aquela ação errática.
Evidente que por mais que seja tolerante, o BC tem consciência de que a duração da especulação por um período maior pode contaminar os preços relativos da economia e desencadear pressão inflacionária.
Contudo, se realizar qualquer tipo de intervenção sem que haja efetiva e concreta demanda estará incorrendo em erro e sancionando algo que não existe no momento, sem alcançar resultado eficaz.
O BC sabe disto e se mantém alheio ao movimento, observando sem intervir, num jogo de paciência, pois sabe muito bem que o movimento especulativo está desprovido de fundamentos e pode ter uma derrocada muito rápida e as eleições já estão a tão somente 24 dias.
Até mesmo na Bovespa onde se esperava movimento mais agudo de realização parece estar presente a postura paciente de observar sem realizar, pois perspectivas desfavoráveis em relação à gestão prospectiva do candidato que as pesquisas apontarem como preferido podem criar cenários desfavoráveis para a retomada da atividade econômica e mais para o conjunto de fatores desfavoráveis que afetam o país e assim, criar um ambiente negativo para o mercado acionário.
Mas até na Bovespa, onde os investidores estrangeiros devem estar com seus recursos protegidos, não há precipitações.
Houve como já salientado anteriormente, movimento mais acentuado de investidores em carteira saindo do país, mas por motivos claros e bem entendidos.
O fluxo cambial divulgado pelo BC ontem, tabulado até o dia 6 da semana passada dá evidência de que não há nenhuma fuga de capitais do país e que os números confirmam a absoluta normalidade.
O fluxo cambial foi positivo no comercial em US$ 154,0 mi e negativo no financeiro em US$ 1,012 Bi, resultando fluxo cambial líquido negativo de US$ 858,0 mi, nada atípico para a época.
Os bancos que detinham posição comprada líquida ao final de agosto de US$ 160,0 mi com o impacto do fluxo cambial líquido negativo de US$ 858,0 mi, ficaram com posição vendida de US$ 698,0 mi. Contudo, como tem US$ 2,150 Bi vigentes de tomada de financiamento de moeda estrangeira com recompra do BC, ainda tem um diminuto “colchão de liquidez” da ordem de US$ 1,452 Bi.
O país ainda tem a “contabilizar” no fluxo mediante contratação do câmbio correspondente o montante líquido de exportações (físico-contratado) de US$ 13,810 Bi menos o montante líquido de importações (físico-contratado) de US$ 7,196 Bi, o saldo líquido de US$ 6,614 Bi que será agregado contabilmente às posições dos bancos quando efetivadas as contratações dos câmbios.
O montante do “colchão de liquidez” em poder dos bancos em suas posições da ordem de US$ 1,452 Bi poderá induzir o Banco Central do Brasil à realização de leilões de linhas de financiamento em moeda estrangeira com recompra, com o intuito de deixar a liquidez do mercado à vista bastante confortável.
Importante e oportuno ressaltar que os bancos também podem optar pela manutenção de posições vendidas e ancorá-las em linhas de financiamentos em moeda estrangeira fornecidas por banqueiros externos.
Tudo é uma questão de facilidade e custo.
Acreditamos que, cada vez mais, tendem a ficar reduzidas as possibilidades dos movimentos especulativos prosperar com o intuito de apreciar o preço da moeda americana, ancorada em fatos enaltecendo o eventual contexto negativo oriundo das pesquisas eleitorais.
A despeito de eventuais movimentos voláteis o viés de depreciação do preço da moeda americana deverá ganhar consistência, como tendência.
Nossa convicção na probabilidade desta percepção decorre do fato incontestável de que o Brasil está solidamente defendido na questão cambial, seja quem for eleito Presidente da República.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO