A despeito dos mercados procurarem reduzir a relevância dos dados da economia americana divulgados ontem, é inconteste que o cenário prospectivo sugere mudanças no mercado internacional, tendo como eixo a melhora da economia dos Estados Unidos, se antecipando às expectativas presentes até recentemente.
Embora a nota do FED/FOMC ao término de sua reunião finalizada ontem tenha ainda mantido um tom favorável ao afrouxamento monetário, acreditamos que esta linha de pensamento expressada envelheceu precocemente na data de sua divulgação face aos novos indicadores divulgados, devendo ocorrer doravante uma rigorosa observância do comportamento da economia americana até a próxima reunião do FOMC em setembro, e, se novos dados confirmarem a retomada da recuperação da atividade, geração de emprego e renda, inevitavelmente a perspectiva de mudanças na política econômica americana estará muito mais próxima do que o previsto pelos agentes dos mercados.
Na reunião do FED/FOMC encerrada ontem houve a decisão de redução de mais US$ 10,0 Bi nas recompras previstas no QE3 que agora serão de US$ 25,0 Bi mensais, sendo que este programa tem seu encerramento previsto para o mês de outubro. Importante ressaltar que nesta reunião ocorreu a discordância do Presidente do FED da Filadélfia, Charles Plosser, que é partidário de uma política mais apertada.
A rigor, pelas inúmeras manifestações que ocorrem fora do ambiente das reuniões por parte dos Presidentes regionais do FED está evidente que há uma ansiedade para que a política monetária seja alterada, até porque este fato afeta demasiadamente os preços dos ativos no mercado global.
Movimento antecedente mesmo aos novos dados econômicos americanos foi detectado e posto em matéria pelo jornal econômico britânico FT, reproduzida hoje pelo Valor, apontando que os Bancos do Estados Unidos estão se preparando para o risco de saída de US$ 1,0 Tri.
Estes movimentos de ajustes e acomodatícios ante a perspectiva de um cenário mutante no curto prazo sugere, também, que os movimentos de reversão de capitais não rigorosamente especulativos alocados em países emergentes comecem a ser redirecionados para o mercado americano de forma gradual e antes que as alterações da política monetária americana se torne fato concreto.
Esta reversão deve atingir os países emergentes que naturalmente sofrerão impacto de depreciação em suas moedas, e este movimento pode começar a se acentuar já a partir deste mês de agosto.
Por outro lado, há os países emergentes, como o Brasil, que receberam também grande volume de capitais especulativos e estes já revelavam tendência de reversão principalmente dos países que revelam cenários agravados por incertezas.
O Brasil recebeu grande volume destes recursos forjados a partir de operações de “carry trade” como consequência da postergação havida ao inicio deste ano na expectativa das mudanças de política econômica por parte do FED que abriu um intervalo de tempo que permitia os movimentos de capitais especulativos buscando rentabilidade.
A propensão de saída destes recursos já era real e com a mudança de expectativa quanto às mudanças da política monetária americana virem a ocorrer num espaço mais curto de tempo esta tendência deverá se acentuar.
Temos então um cenário prospectivo que sugere intensificação de saída de recursos e, por outro lado, não há expectativa de que possa ocorrer incremento nos ingressos, muito pelo contrário deverão, tudo leva a crer, retroceder como reação natural a um semestre em que será realizada a eleição presidencial no país, já tendo ocorrido relevante antecipação das captações de recursos externos por parte das empresas brasileiras, que agora devem perder intensidade.
O país recebeu ao longo deste ano até o dia 25 último o montante de ingressos de US$ 410,2 Bi e ainda assim tem um fluxo cambial negativo de US$ 534,0 M.
Tudo leva a crer que é bastante consistente a tendência de elevação substantiva deste fluxo cambial negativo ao longo do 2º semestre, como consequência da intensificação de saídas de recursos estrangeiros e retração nos ingressos.
Os bancos estão dando suporte à liquidez faltante decorrente da insuficiência acumulada de fluxos de recursos externos, acumulando posições vendidas de US$ 18,426 Bi, valor que implica em endividamento de curto prazo para lastro e que já representa 4,85% das reservas cambiais brasileiras.
Este cenário prospectivo tende a exercer pressão sobre a formação do preço da moeda americana.
Não se vislumbra no curto prazo reversão da tendência de fluxo negativo, portanto não haverá, ao que tudo sugere, condições de cobertura por solução de mercado deste montante de posições vendidas dos bancos.
Com baixo crescimento do PIB e inflação alta a atratividade do país sofre repercussões negativas, podendo até ocorrer queda nos IED´s.
Além disto, surge agora outro ponto extremamente delicado e de desconforto para o país por ser muito observado pelas agências de rating: o superávit primário fora do ponto sugerido pela revisão realizada com comprometimento do governo.
No 1º semestre deste ano o governo registra o pior superávit em 14 anos. O resultado do superávit primário foi de R$ 17,2 Bi, equivalente a pouco mais de 21% do comprometimento do governo que é de US$ 80,8 Bi para este ano. Inegavelmente que este resultado retrata o baixo crescimento da economia brasileira, mas também o fato da política fiscal ter continuado expansionista, com as receitas crescendo 7,2% e as despesas 10,6%. Evidentemente o governo melhorará esta performance, provavelmente com receitas pontuais e não com arrecadação face a dinâmica da atividade econômica.
Mas, o que consideramos relevante neste contexto é que é um novo desafio, visto que as agências de rating estão fortemente focadas no cumprimento da meta de superávit fiscal por parte do governo, principalmente após a revisão realizada, é que a perspectiva de não cumprimento pode levá-las a passar a considerar a possibilidade de redução do rating brasileiro, fato que seria bastante perturbador num momento em que vislumbra tendência no curto prazo de retração da liquidez no mercado internacional.
Como mencionamos, a cada dia surge um novo desafio envolvendo o setor externo, e isto pode ser um elemento perturbador para a política monetária no controle da inflação se o dólar vier a sofrer forte apreciação.