Num cenário de expansão inflacionária consistente, o Governo procurou demonstrar calma ontem na reunião do Conselho de Desenvolvimento, sem descartar a preocupação, e confiança nas medidas que vem adotando, fortalecendo o viés…
Num cenário de expansão inflacionária consistente, o Governo procurou demonstrar calma ontem na reunião do Conselho de Desenvolvimento, sem descartar a preocupação, e confiança nas medidas que vem adotando, fortalecendo o viés tendente à utilização maior de medidas prudenciais e deixando claro, mais uma vez, que evitará elevações da SELIC.
Entendemos que o Governo precisa ser mais incisivo nas suas ações e mais rápido, caso contrário poderá ser surpreendido. Não há razão de conforto em constatar que a inflação atinge as grandes economias desenvolvidas, sendo, no momento, um fato mundial, visto que o Brasil é diferente, não teve os mesmos impactos da crise e tem uma memória muito recente de convívio longo com inflação elevada e indexação de preços, grande parte ainda presente e tem “vários” indicadores de correção de preços sendo utilizados, sendo os mais evidentes o IGP-M e o IPCA, sendo que o primeiro reajusta os principais preços de serviços e equivale ao dobro do segundo, que é considerado a inflação oficial pelo Governo.
O crédito aumentou 1% em março, e, o ingresso de volume em torno de US$ 31,0 Bi de empréstimos de curto prazo no país num “gap” de tempo entre a elevação dos depósitos compulsórios estabelecidos pelas medidas prudenciais de dezembro e a taxação com o IOF de 6%, praticamente neutralizou os efeitos de redução de liquidez. Por isso, o crédito e o consumo continuam aquecidos, pouco respondendo à elevação de taxas de juros.
Contido o fluxo cambial oriundo dos empréstimos de curto prazo com a aplicação do IOF de 6%, fluxo erroneamente destacado como grande procura pelo Brasil por investidores estrangeiros, mas na realidade captados por bancos e empresas brasileiras para arbitrar juros externos versus juros internos, realimentando a liquidez retirada pela elevação dos depósitos compulsórios, o fluxo financeiro neste abril está minguando ao revelar-se liquidamente negativo em US$ 440,0 MM até o dia 18 (liquidado em 20), compensados pelo fluxo comercial positivo de US$ 573,0 MM, que “salva” o fluxo cambial do mês até aquela data ao torná-lo positivo em US$ 133,0 MM.
Com este reduzidíssimo saldo positivo de US$ 133,0 MM, o BC retirou do mercado, neste abril, US$ 5,351 Bi à vista e mais US$ 440,0 a termo já liquidados, elevando o total de posição “vendida” dos bancos a US$ 14,5 Bi, uma “janela” privilegiada de captação de recursos de curto prazo sem tributação e que fomenta liquidez para a concessão de crédito, além de afetar o mercado de derivativos, na ponta induzindo a apreciação maior do real.
Evidente que BC continua na linha contraditória à retórica do MF ao continuar ampliando as posições “vendidas” dos bancos no mercado de câmbio físico, visto que persiste retirando do mercado volumes superiores ao do fluxo cambial.
Agindo desta forma, torna-se difícil concordar com o Ministro Mantega quando critica aos que reprovam as intervenções do BC no mercado de câmbio. Afinal, há na prática uma ação do BC fortemente indutora à apreciação do real, enquanto o MF propaga a preocupação com a mesma e salienta o propósito de apreciar o dólar.
Afinal, com tamanho contraditório, provavelmente pouco percebido por quem não convive com o cotidiano operacional do mercado de câmbio até porque esta “janela” não impacta no fluxo cambial, fica impossível acreditar que o Governo tenha o efetivo propósito de apreciar o preço do dólar, mas muito fácil de entender que o real apreciado está sendo utilizado como forte instrumento de contenção das pressões inflacionárias, evitando que o COPOM tenha que elevar mais a taxa SELIC.
Como já expusemos inúmeras vezes “comprar mais” ou “comprar tudo que puder” em determinadas situações não determina a valorização do dólar, mas sim a sua desvalorização, já que neste caso não prevalece o princípio de que levando-se o estoque do bem à exaustão o preço sobe, visto que os bancos utilizam suas linhas externas em dólares e utilizam este posicionamento para captar reais a custo reduzidíssimo e sendo a variação cambial o segundo item da formação do custo, apreciam o real para que os comprem futuramente, fisicamente ou com “hedge” a preço inferior.
Esta é uma estratégia longamente praticada pelo governo anterior, que voltou a ser retomada pelo atual, até porque o que está enfrentando de pressões inflacionárias tem grande parte de causa também nas diretrizes adotadas e praticadas pelo governo passado e, notadamente, tem uma posição pouco favorável à elevação da taxa SELIC.
Portanto, quando o Governo reafirma que tem como foco principal o controle da inflação, espera-se que adote medidas pontuais elevando os depósitos compulsórios a ponto de neutralizar a liquidez reposta pelo ingresso de US$ 31,0 Bi do exterior em empréstimos de curto prazo, e, de forma combinada, reduza bruscamente os limites de posições “vendidas” dos bancos, tirando a característica operacional e deixando-as em parâmetros baixíssimos para uso temporário.
Postura vacilante entre ser firme e contundente e o desejo de preservar o mercado consumidor interno para conquistar um PIB com queda não dramática pode provocar o descontrole da inflação, pois, se todos acreditarem que “tudo vai subir”, acaba subindo mesmo, já que a indexação e a memória inflacionária perduram muito fortes no país.
Os dados do BC continuam evidenciando que os exportadores estão com um estoque liquidado no exterior de US$ 23,8 Bi, porém aponta também que já pagamos todas as importações realizadas e já antecipamos US$ 3,9 Bi do que está para chegar, movimento este decorrente do baixo preço da moeda americana.
O sentimento presente é que, embora tenha o Governo agido de inúmeras formas sobre o mercado de câmbio e com medidas estruturais focando a liquidez e o crédito, ainda não se afastou muito do quadro inicial que assumiu, por isso a inflação continua forte e o dólar em depreciação, e que não venham com o argumento de que o dólar cai no mundo todo, porque aqui cai mais, e, comprovadamente, não em decorrência do fluxo cambial.
Afinal, o fluxo está quase negativo e o real continua em apreciação!!!