O Banco Central do Brasil vinha comandando com eficiência a irrealidade de manter o real apreciado focando um impacto mais rápido na contenção das pressões inflacionárias, ação conjugada com a política de elevação da taxa de juro SELIC.
Contudo, tinha contra si a realidade das contas externas brasileiras bastante deterioradas e sem perspectivas de recuperação no curto prazo, que sugeriam tecnicamente preço maior para a cotação da moeda americana no nosso mercado, já que os números presentes do setor externo são bastante desconfortáveis.
O país tem necessidade premente de aumentar o fluxo cambial que se revela insuficiente e que registra um déficit em transações correntes da magnitude de 3,6% do PIB.
A taxa cambial deprimida pró-controle inflacionário impactava provocando a inviabilidade de fluxos de recursos especulativos forjados a partir da montagem de operações de “carry trade” com foco em arbitragens, que se tornavam desinteressantes para os especuladores.
Já há neste ano até setembro uma NFE (necessidade de financiamento externo) de quase US$ 17,0 Bi tendente a US$ 20,0 Bi ao final do ano, já consumada em US$ 11,0 Bi que se revela na insuficiência de ingressos líquidos que vem sendo suportado pelas posições vendidas dos bancos, numa estratégia de “substituição do papel que deveria estar sendo ocupado pela autoridade monetária” na geração de liquidez para o mercado de câmbio.
Este carregamento de posição vendida pelos bancos poupa o BC da necessidade evidente de vender dólares a vista ao mercado de câmbio retirando-os definitivamente das reservas cambiais brasileiras, que, contudo, flui para os bancos como linhas de financiamento em moeda estrangeira para lastrear as posições vendidas.
Esta estratégia funciona como solução temporária e procura ganhar tempo para ver se o fluxo cambial liquido para o Brasil melhora de forma a evitar que a autoridade monetária tenha que efetivamente se valer de parte das reservas cambiais para manter a liquidez do mercado à vista, o que seria altamente estimulante à especulação dada a evidência de fragilidade do fluxo de recursos para o país.
Auxiliava o Banco Central do Brasil nesta ação de conter a alta do preço do dólar à sua realidade no nosso mercado de câmbio, o fato de que a postergação do FED americano em dar início à redução do seu programa de incentivo monetário focado na atividade da economia dos Estados Unidos, criava euforismo no mercado global e sustentava a perspectiva dupla para o Brasil, quais sejam, a de que os recursos externos que estão investidos no país permaneceriam por mais tempo e ainda, que o país receberia novo fluxo de recursos atraídos pela rentabilidade num momento em que eleva a taxa SELIC.
Ocorre que o fato do FED não iniciar o “tapering” já não motiva otimismos por parte do mercado global, que alias sinaliza que passará a ajustar-se previdentemente à realidade que acabará por vir, o início da redução, e desta forma o Brasil vê reduzirem-se bastante a possibilidade de novos ingressos e aumentam as possibilidades de incremento das saídas, embora de forma gradual e não tão abruptas.
Este fato muda o cenário prospectivo de curto prazo e já demonstrou que tem potencial para anular a ação do BC em manter a apreciação do real, evidenciado pela alta ocorrida a partir do final do mês de outubro e sustentada ao inicio deste mês de novembro.
Por outro lado, o resultado fiscal apurado pelo governo em setembro com expressivo déficit deixou evidente que a apreciação do real teve um relevante peso, pois impactou sobre o montante das reservas cambiais brasileiras – um ativo financeiro – e deixou claro que as repercussões da estratégia para conter as pressões inflacionárias tem um “custo elevado” comprometendo o superávit fiscal que já está cambaleante.
O resultado fiscal de setembro, afora as adversidades do contexto Brasil com suas contas externas deficitárias e fluxos cambiais adversos, também serviu para alertar as autoridades monetárias quanto a impropriedade da continuidade da estratégia de apreciar o real por indução.
O desempenho fiscal do país também está deteriorado e a piora já provoca ruídos no sentido de que o país pode correr o risco de perder o conceito de “investment grade”, o que teria impactos substantivos nas contas externas do país, já que recursos de muitos fundos que estão aplicados no Brasil teriam que ser retirados pelas normas regulatórias dos mesmos que os impede de aplicar em países que não tenham este conceito.
No nosso entendimento não há mais condições do BC continuar com a sua estratégia de apreciar o real pró-controle da inflação.
O foco agora é não deixar a alta escapar do controle, visto que o fluxo cambial líquido tende a acentuar-se negativo, mesmo com o ingresso previsto de US$ 4,0 Bi do bônus do campo de Libra, o que exigirá que os bancos elevem ainda mais as suas posições vendidas ou o BC realize leilão de venda de divisas.
Como houve perda de tempo, os fluxos especulativos de recursos de operações de “carry trade” focando arbitragens, agora viáveis pela melhor adequação do preço da moeda americana, podem ser bem menores do que se espera dado o curto espaço de tempo para o inicio das discussões sobre politica fiscal nos Estados Unidos e a certeza de que num prazo não muito distante o FED iniciará a redução do seu programa de incentivo monetário.
Não é sem causa que os “comprados” já vêm aumentando suas compras especulativas no mercado futuro de dólar desde a ultima semana de outubro e continuam nesta dinâmica.
O Boletim FOCUS mantém a projeção de dólar ao final do ano em R$ 2,25, mas já parece superada, sendo mais razoável R$ 2,30 e a SELIC em 10%, que neste momento é consensual.