O cenário do mercado brasileiro com comportamento volátil não alterará a perspectiva de que o preço do dólar tende a ser apreciado e o Índice Bovespa tende a queda. As tendências têm neste momento fundamentos consistentes.
Os fatores externos de influência e impacto nos países emergentes, com destaque para o Brasil, devem ter continuidade, pois há inúmeros e importantes vetores que devem persistir afetando e provocando que o ambiente benigno que vinha fomentando o otimismo nestes países sejam revistos.
Um dado ou outro da economia americana que se demonstre volátil não altera a percepção de que está num crescente de atividade que fomenta a tendência inflacionária, tendo agora o agregado preço do petróleo em alta em decorrência dos conflitos geopolíticos promovidos pelo Presidente Trump.
Até agora o Brasil vinha desviando as atenções com argumentos de que tudo que aqui ocorre de negativo tem causa no exterior, atribuindo os eventos positivos as “conquistas visionárias” brasileiras de retomada da economia, queda da inflação, queda do juro, recuperação do emprego etc…, que nem sempre se confirmam com números.
Em realidade a extraordinária liquidez no mercado internacional, decorrente de inúmeros planos estratégicos dos países desenvolvidos para recuperação de suas economias, provocou certa confusão nos países emergentes, em especial no Brasil, alimentando a crença de que estavam atraindo capitais estrangeiros em consequência dos pontos positivos que reconheciam em si próprios. O fato é que com a elevada liquidez e com um ambiente externo sem conflitos e acirramentos ficou favorável à migração destes recursos focando a especulação nos países emergentes visando rentabilidade de oportunidade.
Contudo, o cenário sem conflitos e com calmaria ficou num passado recente. A crescente atividade econômica dos países desenvolvidos ainda que assimétricas, com destaque para os Estados Unidos, mercado financeiro de maior importância no contexto mundial e que tem plena influência em todos os demais, provocou a mudança de humores.
A “priori” se considerava que o risco de impactos desta mudança ocorreria de forma previsível, mas este contexto foi alterado de forma abrupta pelo ritmo da economia americana e as pressões inflacionárias sugerem que o FED será mais incisivo nas resoluções, e, ao mesmo tempo, o Presidente Trump envolveu o país em conflitos geopolíticos.
O mercado financeiro acabou por “atropelar” o FED e o rendimento dos T-Bonds de 10 anos, referência mundial, foi além dos 3% e isto em cadeia afeta todo o cenário mundial. Adicionalmente às questões geopolíticas agregaram mutações relevantes em commodities, em especial o preço do petróleo.
Ocorre então o “fly to Quality” com o refluxo dos capitais para o mercado americano. E este fato aprecia o dólar no mercado global.
E o Brasil poderá ser um dos mais afetados na mudança de análise do mercado global.
Tem um conflito entre a tendência local de redução de juro SELIC, que entendemos devesse ser interrompida pelo BC, e a elevação do juro americano, fato que impacta na perda de sua atratividade, que em grande parte é de origem especulativa com recursos arbitrados em operações de “carry trade”.
Cresce a percepção de que sua economia “patina”, que não há recuperação do emprego, o que impacta na renda e no consumo. Há inúmeros indicadores inflacionários, embora com metodologias diferentes, porém do mesmo país, como IPCA de 0,22% em abril, IGP-DI de 0,93% em abril e agora o IGP-M na 1ª prévia de maio em 1,12%, o que é no mínimo “estranho”. E a alta do dólar deverá pressionar a inflação de forma objetiva.
O mundo financeiro global já observa o Brasil com maior rigor. O CDS Brasil (Credit Default Swap), risco de calote, atingiu 200 pontos base ante a mínima do ano de 142 pontos, alta de 40%. Confrontado com outro emergente o México o CDS Brasil está 72 pontos mais alto.
A mudança do ambiente benigno externo agora passa a impor uma visão mais rigorosa e então ganha destaque que o Brasil real que não consolidou as reformas e se acentua a percepção de que os nossos riscos domésticos, incluindo as incertezas políticas, não vinham sendo considerados com o necessário rigor e estão sendo revisados, o que coloca em perspectiva um viés de alta do CDS Brasil.
A saída de capitais estrangeiros aqui alocados ainda não se dá de forma abrupta por termos mecanismos que estão “amortecendo” esta tendência, o que nos diferencia de outros emergentes, como os “hedges cambiais”, mas a saída deverá ocorrer de forma gradual. Esta estratégia inicial de proteção não implica demanda de divisas para saída, mas impacta na taxa de câmbio futura face à demanda por “hedge cambial” e esta contamina a taxa do mercado a vista, de forma direta.
Será relevante observar momentos de contenção de arrefecimento da demanda por “hedge cambial” para amenizar a alta do dólar, combinada com alta estimulada na BOVESPA, para que a rentabilidade na saída não seja fortemente afetada. Fatores extremamente pontuais proporcionam estes movimentos sinérgicos.
O contexto externo e agora mais visivelmente o interno mudaram o patamar do preço da moeda americana no nosso mercado, acreditamos de forma irreversível, e o viés continua de alta, mesmo com volatilidade, o que nos leva a projetar R$ 3,75 para proximidade de agosto.
O BC parece consciente de que esta mudança de patamar é fundamentada e consistente, assim não intervém de forma incisiva como grande parte dos analistas esperava, já que a resultante seria intensa volatilidade que é pior do que alta fundamentada. O BC sabe que tem capacidade de conter especulações. Oferta proteção com “swaps cambiais” para os passivos e poderá prover a liquidez do mercado com instrumentos apropriados, sabendo ter baixa capacidade de influenciar na formação do preço de forma efetiva, que seria um confronto que provocaria um câmbio “administrado” e não estável.
O novo contexto sugere que o Boletim FOCUS passe por revisão suas projeções.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO