Temos ressaltado de forma enfática, o que não tem sido muito salientado nas análises contumazes, que o expressivo montante do auxílio emergencial, sob as mais diversas rubricas, distribuído pelo governo federal para a população mais carente ao longo desta crise da pandemia do coronavírus, teve expressiva participação nos sinais de melhora do consumo no varejo e na puxada na produção industrial verificada em maio passado.
Claro está que não foi a economia com sua própria impulsão que promoveu a sinalização havida, tanto é que o desempenho do item “serviços” revelou naquele mês considerável queda e relevante já que tem peso de 70% na composição do PIB, praticamente anulando o otimismo gerado pela indústria e o varejo.
Desempenho do varejo e da indústria pode ter sido uma anomalia promovida por injeção de recursos atípica para a população.
Adicionalmente, o IBC-Br de maio divulgado nesta semana pelo Banco Central do Brasil revelou-se positivo em 1,31% ante expectativa projetada em 4,4%, o que sem dúvida decepcionou e deixou evidente que a retomada efetiva da atividade econômica será um desafio bem maior.
Todos sabem da dimensão do déficit fiscal do governo que deve atingir os 100% do PIB, assim como é presumível que o governo não tenha condições de arcar com os programas assistenciais por mais tempo e não deve ser considerado no “novo normal”, muito pelo contrário deve ser um redutor nas considerações e projeções que se faça sobre a dinâmica futura da atividade econômica.
Desta forma se configuram como “empíricas” projeções sobre a consistência de recuperação mais rápida da atividade da economia, visto que sabidamente tudo indica que haverá mudanças profundas na dinâmica do emprego com grande tendência a aumento do desemprego, com reflexos diretos na renda que será também afetada por achatamentos, e, como consequência do consumo, pois é bastante provável que tenha ocorrido endividamentos, a despeito do auxílio emergencial, por grande parte da população.
A visão otimista de que a recuperação poderá ocorrer em “V” quando se avalia com ceticismo o cenário prospectivo se configura como propensa a inviabilidade considerando que o momento antecedente à crise já não evidenciava uma atividade econômica robusta, o que torna mais factível que a retomada ocorra em “U” e isto pode demandar até 2 anos.
Em realidade, a prevalência das incertezas ainda tem larga vantagem sobre as eventuais certezas, sendo a maior incerteza e mais impactante a duração da crise da pandemia do coronavírus que ainda está muito presente e em desenvolvimento no Brasil e se constitui fato extremamente relevante que não pode ser mitigado quando se busca construir visão prospectiva sobre o futuro imediato do país.
Neste ambiente o nível de insegurança predomina, embora na margem se procure construir cenários prospectivos otimistas forjados mais em anseios do que em fundamentos efetivos, e este fato cria relativa nebulosidade nas convicções.
Como consequência o nível de atividade da economia brasileira, exceto o setor do agronegócio que preserva dinamismo, “vai indo” até que se tenha percepção melhor sobre a longevidade da crise da pandemia do coronavírus no país e do efetivo legado de danos econômicos que vieram na esteira da pandemia, que poderá consumir mais tempo do que se imagina para recuperação, visto que a capacidade de demanda da população estará bastante deprimida consequente da deterioração do mercado de trabalho.
Por isso, mais uma vez ressaltamos que o governo mais do que se preocupar em criar novos impostos como a nociva e desestimulante CPMF, deve priorizar o programa de privatizações e infraestrutura para atrair recursos externos e com isto buscar dinamizar a atividade econômica e a geração de empregos e renda, agilizando os marcos regulatórios.
Enquanto não houver melhor percepção sobre como o país sairá desta crise, entendemos que o desempenho da Bovespa continuará muito vulnerável e a mercê de um ou outro fator pontual, ao mesmo tempo em que o dólar manter-se-á no intervalo entre R$ 5,00 a R$ 5,50, que são parâmetros bastante estáveis face às perspectivas para o segmento, mas é imperativo que o BC interfira para conter a expressiva volatilidade no câmbio que é altamente prejudicial aos negócios.
Fatores políticos internos e não econômicos e os embates comerciais China e Estados Unidos poderão estressar o comportamento do dólar no mercado interno e externo, mas meramente passageiros, até porque as divergências dos Estados Unidos com a China tem agregado o fator estratégico político que convém ao Presidente Trump, pois estando em desvantagem nas pesquisas precisa agradar o seu eleitorado.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO