Mês de julho chega ao final com sinais melhores na atividade econômica, mas com sustentabilidade ainda bastante vulnerável, visto que a pandemia do COVID está acentuadamente presente, embora o mercado financeiro, habilmente, não enfatize o fato para não ofuscar o otimismo, por vezes exacerbado.
O ICS (Índice de Confiança de Serviços) subiu 7,3 pontos alcançando 79 pontos e recuperando 62% das perdas dos últimos 4 meses, enquanto o NUCI (Núcleo de Utilização da Capacidade Instalada) melhorou 3,3 pontos atingindo 80,5 pontos.
São dados positivos.
É preciso ainda que se tenha dados mais precisos e atuais da atividade industrial, varejo e, principalmente serviços, por seu peso no PIB, para uma avaliação mais abrangente, e se forme uma visão mais firme, sem deixar de ser cética, prospectivamente, visto que a realidade da presença da pandemia do coronavírus no nosso país ainda é dantesca e pode impor riscos de retrocessos, que nem sempre estão sendo colocados no radar com o peso adequado.
Há também preocupação crescente com a questão fiscal brasileira com o Governo Central apontando déficit de R$ 194,7 Bi ante projeção de R$ 160,0 Bi no mês, acumulando R$ 417,0 Bi no 1º semestre, e este é um ponto relevante negativo e desestabilizador, visto que não se sabe exatamente o quanto o governo ainda será exigido ao longo da crise do coronavírus, que está se sugerindo além das perspectivas de tempo estimado, com contínua dependência do governo das classes sociais mais carentes.
Adicionalmente, não passa despercebido também a força do IGP-M registrando alta de 2,23% em julho, acumulando no ano 9,27%, e preocupante no país de várias inflações, sendo que esta reajusta contratos e serviços de todas as naturezas na economia, enquanto o IPCA não atinge 1/3 deste expressivo índice e é a base para corrigir salários. Desequilíbrios são inevitáveis e afetam diretamente a capacidade de consumo da população.
A crise provocou forte impacto no PIB americano do 2º trimestre da ordem negativos 32,9% e no México 17,3% e logo conheceremos o retrocesso provocado no Brasil, que vem projetando PIB anual negativo, bastante otimizado dado o cenário.
O fluxo cambial evidencia que o país continua não despertando atratividade ao investidor estrangeiro, e desta forma, as saídas financeiras negativas ainda demonstram vitalidade tendo registrado no mês até o dia 24 fluxo líquido negativo de US$ 4,809 Bi e no ano US$ 42,953 Bi.
O CDS é um bom sensor para ser acompanhado. Está em 216 pontos, recuando, e acreditamos que quando houver consistência nos dados da economia para evidenciar retomada sustentável efetiva poderá recuar a 150 pontos, não mais devido a questão fiscal, que poderá ser o ponto para que empresas brasileiras retomem de forma consistente a captação de recursos no exterior para seus projetos, e, com isto, melhorar o fluxo cambial para o país.
O nosso mercado cambial é, no momento, espelho e reflexo do comportamento do dólar no mercado global e assim repercute no preço as nuances das variações externas que são afetadas diretamente pela situação da economia americana e suas perspectivas e ações diretas do FED, porém, o Brasil não tem sido contemplado com a excessiva liquidez presente no mercado internacional e tem, no momento, formado o preço com baixa influência interna.
Após impactos mais severos nos primeiros meses do ano, onde agregando inúmeros fatores de impulsão do preço chegou até a transmitir a sensação de que estava fora do controle, a despeito do expressivo volume de reservas cambiais detidas pelo país, gradativamente vem adequando seu preço a novos patamares, já que se não há perspectivas de fortes ingressos de recursos estrangeiros, também não há de saídas, e desta forma oscila num intervalo aberto de R$ 5,00 a R$ 5,50, ou mais estreito de R$ 5,10 a R$ 5,40, mas o fato é que o preço se fez mais previsível, e parece atender ainda os anseios do governo estando no conceito “cambio alto”, visto que alguns órgãos internacionais, como o IIF Instituto de Finanças Internacionais, considerem que o preço deveria estar em torno de 15% abaixo do atual, algo como R$ 4,50.
Há no mercado uma impertinente volatilidade atribuída ao fator “juro baixo” e aos minicontratos que se presta a movimento especulativo, como fato novo no ambiente que oferece poucas oportunidades de ganhos mais expressivos aos investidores, salvo se se deslocarem para a B3, fato que ocorreu de forma substantiva e marcante face ao afastamento da renda fixa.
O BC tem observado, se diz não conclusivo acerca do fato, mas tem optado por não intervir, que acreditamos ser o correto, até porque os especuladores gostam de desafios e a volatilidade poderia ficar maior. A perspectiva é que a intensidade se torne cadente gradualmente.
Hoje poderá ser um dia com formação de preço atípica como decorrência da disputa em torno da taxa PTax, utilizada para os ajustes de contratos em dólares.
A B3 também é espelho e reflexo de Wall Street, por vezes repercutindo diretamente fatos somente pertinentes à economia americana, mas busca também prospectar papéis de empresas ou segmentos internos que conseguem sinalizar bom desempenho durante a pandemia, porém, por vezes, mitigando riscos que podem se tornar concretos num futuro próximo, e estiver sendo, nesta fase, meramente pontuais.
É inquestionável que a injeção de recursos realizada pelo governo no mercado pelos seus programas assistenciais provocou, motivou certos setores como varejo ao crescimento da atividade, porém não se tem ideia de quanto sustentável visto ter havido concentração de consumo em determinados supermercados ou lojas de departamentos, que pode ser disseminado futuramente, se houve renda e liberdade de mobilidade, sendo relevante que se acompanhe os níveis de inadimplência no setor de cartões de crédito.
Os estrangeiros retiraram até 29 o total de R$ 6,5 Bi da B3 e no ano perto de R$ 83,0 Bi, o que evidencia que o país ainda não despertou atratividade a despeito da expressiva liquidez no mercado internacional.
Causa certa curiosidade quando se observa a extrema carência de uma massa considerável da população que está em “estado de dependência total” da ajuda do governo, e se ouve do Presidente do BC de que a retomada da atividade econômica será puxada pela demanda reprimida, sem destacar com que renda.
A Reforma Tributária do governo agregando as outras duas já no Congresso deverão ocupar espaço nos próximos meses, mas não se tem perspectiva fácil de convergência política no Congresso, o que pode conspirar com as sugestões de “moedas de trocas” com desonerações que o governo acena para as negociações.
É relevante considerar que ainda estamos convivendo com a pandemia em desenvolvimento, não a subestimar e fazer de conta que não é tão grave ainda, e que há a necessidade de retomar a atividade econômica de forma prudencial, mas que nada será exponencial como se propagam reações a indicadores econômicos, é necessária absoluta sensatez.
Então, digamos, julho se encerra e “as coisas vão indo”, mas poderá haver muitas intempéries na trajetória de curto prazo, que tornam impeditivas projeções mais prospectivas sobre o médio e longo prazo.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO