Tudo leva a crer que o mercado financeiro sofrerá impactos naturais das questões intestinas políticas do governo, e, isto deverá provocar tensões e incertezas, e como resultante volatilidade, pois o fato ocorrido envolvendo o Ministério da Justiça e seu titular poderá ter repercussões as mais diversas internamente, mas inegavelmente merecerá atenção e considerações externas.
Como disse um antigo Presidente, acreditamos que agora será válida a colocação sensata de que “o tempo é o senhor da razão”, não sendo razoável julgamento ou formulações imediatas acerca do ocorrido.
Mas, de toda forma, será inevitável a predominância da tensão no mercado permeada por posturas imaturas de “torcida” e que em nada contribuirão para a absoluta necessidade de sensatez que o país precisa dada a severa crise em que está envolvido devido o coronavírus, e que agora pode ampliar-se e até envolver os poderes constituídos.
Naturalmente se espera uma intervenção mais contundente do BC para evitar irradiações mais severas ou mesmo contê-las no mercado de câmbio, em especial, onde se espera volatilidade e mas o esforço será de conviver o mais possível com os ruídos à margem dos negócios, e então, embora não haja possibilidades de forte retrocesso na taxa cambial, poder-se-á manter o foco nos efeitos colaterais positivos do preço do dólar exacerbado no Brasil.
O sentimento primeiro quando se observa a cotação do câmbio da moeda americana no nosso mercado é ruim, afinal neste quase R$ 5,60 por um dólar soa como um indicativo fora do ponto, considerando que a despeito do problema fiscal, da perspectiva de recrudescimento do PIB, queda de fluxos cambiais, etc… o país detém considerável volume de reservas cambiais que o colocam na condição de não conviver com perspectiva de risco cambial.
Naturalmente, até por isto o real tem certo charme e se presta a ser das moedas mais especuladas do mundo, o que não lhe concede nenhuma característica de reserva de valor.
A variação cambial desde os R$ 4,01 da virada do ano até o em torno dos R$ 5,60 atuais representa 40% de desvalorização, que até o presente não se prestou para incrementar o potencial exportador do país e nem a atratividade para investimentos estrangeiros.
Contudo, este movimento de depreciação da moeda local que foi motivado na sua origem pelo “mote” do Ministro da Economia do “câmbio alto vs juro baixo” e que foi “atropelado e acelerado” pela instalação de forte movimento especulativo motivado pelo apregoamento do câmbio alto e posteriormente pela piora do cenário externo que acabou levando o comportamento do preço da moeda também por motivos internos à situação de “total deriva”, absolutamente insensível as intervenções “profiláticas” do BC.
Ocorre que a crise globalizada decorrente do coronavírus vem provocando absolutas deteriorações das expectativas e os países ainda sem saber exatamente em que fase se está do grave problema que impôs ao mundo o isolamento e ao absoluto desordenamento buscam estratégias as mais diversas para evitar que tudo fique muito pior do que está na atualidade.
O Brasil, por sua atividade econômica já não vinha despertando atratividade ao investidor estrangeiro, mas, tudo leva a crer que está descobrindo um consistente “atalho” para tornar o preço da moeda americana elevado no seu “toque de midas” para atenuar o quadro nefasto que se propaga em perspectiva.
O Brasil é um país fortíssimo no agronegócio e na crise a demanda das commodities agrícolas se acentua e desta forma o dólar alto é forte incentivo às exportações que tem participação significativa no PIB brasileiro, além do que acelera inúmeras atividades da cadeia produtiva, transportes e inúmeras outras atividades.
Por outro lado, inibe as importações, que nas exportações do agronegócio impactam em torno de 15%, e é um fator limitante fortalecendo muito a indústria nacional em detrimento das compras externas. O Brasil deve acentuar suas compras da indústria própria em detrimento, em especial, da indústria chinesa.
Poderá criar perspectivas de retomada pela reativação de seu próprio parque industrial prestigiando os insumos internos, como exemplo auto peças que havia perdido para o mercado chinês e partes da indústria que deverá resgatar linhas de produção estagnadas e tenderá a gerar empregos e renda.
O dólar com preço exacerbado torna as ações brasileiras “baratas” mesmo num ambiente de incerteza econômica no curto prazo, mas atraente em perspectiva de médio/longo prazo e isto poderá determinar melhora do fluxo cambial.
Os números recentes, antes da ocorrência política no entorno do Ministério da Fazenda, já sugeria sinais efetivos de melhora do fluxo cambial e do fluxo para a Bovespa, com ambos tendentes a se reverterem para positivos, mas que agora não devem confirmar a tendência.
O Boletim FOCUS divulgado hoje, data base 24, eleva a projeção do PIB de negativo 2,96% para 3,34%, mantém a SELIC em 3,00%, IPCA em 2,20% e dólar em R$ 4,80. Naturalmente, são indicativos empíricos dada a incerteza que envolve a crise do coronavírus global e efeitos internos e as perturbações políticas internas.
O momento sugere posturas defensivas, nada é sugestivo de tendências fundamentadas, mesmos as sabidas que deverão ser negativas.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO