O cenário de final do ano está muito conturbado, quer no ambiente externo, quer no ambiente interno, com crescentes incertezas que afetam o comportamento dos mercados e os preços dos seus ativos.
No exterior continuam as dúvidas e incertezas no “vai não vai” entre China e Estados Unidos, uma relação conflituosa e imprevisível considerando-se a postura comportamental dos dirigentes maiores, e isto afeta o contexto do comércio global e já emite sinais de diminuição de volumes, em especial da própria China.
A economia americana que sinaliza estar “turbinando” emite sinais difusos a partir de questionamentos em torno das diretrizes que serão efetivamente adotadas pelo FED, já que houve clara perda de convicção na elevação do juro de forma contundente, ao mesmo tempo em que o mercado de T-Bonds vem sinalizando inversão nas curvas de juros, o que historicamente é prognóstico de que poderá ocorrer recessão num breve momento futuro.
A conclusão do Brexit envolvendo os ajustes entre União Europeia e Reino Unido se torna cada vez mais complexa e incerta, tendo sido postergado a votação programada e já não há tanta convicção de que prosperará ou não, e isto afeta os humores do mercado europeu com reflexos no mercado global.
Enquanto isto no Brasil, concluída a formação ministerial do novo governo restam inúmeras dúvidas sobre qual será o roteiro para as reformas, imprescindíveis para equacionamento da trajetória de superação da severa crise fiscal que afeta o país e que, sem solução, será o grande entrave para a retomada da atividade econômica, com geração de emprego, renda, consumo e principalmente aumento de arrecadação por parte do governo.
Haverá um novo Congresso Nacional a partir de fevereiro de 2019 e o governo ainda não tem convicção como apresentará a principal das reformas, a Previdenciária, se completa, se fatiada, se maior ou menor do que a proposta sem êxito pelo Governo Temer, enfim há certo ceticismo em torno da questão, e muita incerteza de como será a articulação política do novo governo com o novo legislativo.
A economia gera indicativos básicos como juro, que deverá ser ratificado em 6,5% no Copom desta semana, inflação pelo IPCA tendente a fechar o ano em 3,70%, considerados muito bons, mas agora, inesperadamente, convive com incertezas em torno do comportamento do preço do câmbio, algo imprevisto e absolutamente desprovido de fundamentos concretos.
Todas as projeções sinalizavam o preço do dólar, com absoluta tranquilidade, em torno de R$ 3,70 a R$ 3,75 para o final do ano, que permanece sendo a nossa até fundamentos críveis contrários, e o Boletim Focus, que apura a mediana de mais de uma centena de projeções de instituições do mercado financeiro, elevou esta semana para 3,78.
Como já destacamos exaustivamente, o Brasil, diferentemente de outras áreas tem um ambiente cambial absolutamente confortável, absolutamente imune a crise cambial, com contas externas em ordem, déficit em transações correntes baixo e um enorme volume de reservas que permite tranquilidade ao mercado de câmbio e que permite ao BC irrigar a liquidez do mercado futuro, com swaps cambiais, e do mercado à vista, com oferta de linhas de financiamento em moeda estrangeira com recompra.
Há a margem do curso do mercado de câmbio à vista, uma intensa disputa com grande cunho especulativo no mercado futuro de dólar e isto enseja mutações e pressões frequentes repercutindo os humores do momento.
Desde a última semana de novembro, o mercado de câmbio passou a revelar pressão impondo apreciação do preço da moeda americana frente ao dólar, na maioria das vezes assinérgica com o comportamento da moeda americana no cenário global, e nem sempre confirmando a tradicional retórica justificativa de aumento da demanda no mercado à vista.
É bem verdade que novembro apresentou relevante volume de saídas de recursos financeiros do país, mas o saldo do fluxo não foi expressivo demasiado a ponto de justificar a alta ocorrida.
O fato mais relevante e que representa realmente uma incógnita é a atuação do BC no mercado de câmbio, desapontadora mesmo ao longo desta valorização recente do dólar, visto que as posições vendidas dos bancos ganhou expressividade, algo em torno dos US$ 12,0 Bi, e o BC forneceu somente algo como US$ 5,250 Bi como financiamento com linhas em moeda estrangeira com recompra, havendo, portanto, um “gap” em torno de US$ 6,5 Bi carente de financiamento por parte do BC.
Evidentemente que os bancos podem fazer uso de linhas de financiamento concedidas por banqueiros externos, mas provavelmente mais onerosas, e isto pode estar até acontecendo, mas neste momento conturbado do mercado global seria muito conveniente que o BC fosse o fornecedor do lastro aos bancos para suporte de suas posições vendidas.
Hoje anuncia um discreto leilão de linha de US$ 1,0 Bi, muito aquém das evidências sobre necessidade do mercado, e é importante que se ressalte, poderia fazê-lo de US$ 5,0 ou US$ 6 Bi, sem alardes e sem propagações de “intervenção”, etc…, mas simplesmente atuando “profilaticamente” na irrigação de liquidez absolutamente necessária ao mercado de câmbio à vista.
Esta inércia e mudança de atitude de gestão da liquidez do mercado de câmbio por parte do BC surpreendem, em especial neste mês que sabidamente tem maior volume de demanda, e deixa “no ar” se a autoridade não pretende direcionar para o final do ano uma taxa cambial mais no entorno de R$ 3,80 ou R$ 3,85, mas isto poderia ter algum efeito residual sobre o viés cadente do IPCA, que o mercado já estima em 3,70% e o BC mencionou 4,0%.
Ou ainda, com o agravamento do cenário global conturbado e menos favorável para os emergentes, e mais, com as indefinições ainda presentes e incertas sobre as perspectivas para as reformas imprescindíveis e necessárias a serem alcançadas pelo novo governo brasileiro, teria havido um agravamento do prémio de risco Brasil contido no preço do dólar localmente e que também inibe a sustentabilidade de alta da Bovespa?
Enfim, há algo atípico na postura do BC! Espera-se maior atitude da entidade no quadro atual.
As 11hs a Bovespa insinuava recuperação após a derrocada de ontem, enquanto o dólar caia mais ainda se mantinha acima de R$ 3,90.
No exterior o índice dólar apontava 96,940 com queda de 0,25%.
O CDS Brasil 5 anos apontava 208 pontos, acima dos 204,9 de uma semana e muito acima dos 199,9 de um mês atrás.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO