Até recentemente havia forte convicção de que o preço da moeda americana fecharia este ano entre R$ 3,70 a R$ 3,75, compatível com o contexto brasileiro e considerando que o país tem robusta situação cambial, ancorada em contas externas controladas, déficit em transações correntes em níveis adequados, considerável volume de reservas cambiais, e ainda, que a autoridade monetária dispõe de mecanismos operacionais efetivos para, sempre e se necessário, suprir as demandas de liquidez no mercado à vista e futuro de câmbio.
Contudo, desde o mês passado o preço da moeda vem se fortalecendo no nosso mercado, sem que rigorosamente ocorra sinergia com o comportamento do dólar ante a cesta de moedas no exterior, e embora haja influência de fatores externos perturbadores e com algum reflexo nos países emergentes, nos parece que os fatores internos e incertezas que perduram no campo político e econômico podem ter agravado o prêmio de risco que naturalmente está embutido no preço da moeda no nosso mercado.
O COPOM mencionou ontem que estão sendo reduzidas as reticências em torno das reformas, ou seja, estão pesando menos, mas esta pode ser uma observação muitíssimo relativa, visto que não se sabe qual a formatação da reforma previdenciária que será proposta e nem como serão as reações do Congresso e que tempo este assunto poderá demandar. Enfim, é prematura a formação de juízo a respeito, prevalecendo na realidade o fato de que sem a reforma ficará mais difícil a equalização da crise fiscal, que é fator extremamente paralisante.
Por outro lado, o próprio COPOM vê um ambiente externo menos favorável dado o agravamento do conceito aversão ao risco em relação aos emergentes, o que inclui o Brasil.
Tem sido tema constante na atualidade as perspectivas de severa redução de fluxos de investidores estrangeiros para os emergentes em 2019, havendo mesmo menção por órgãos importantes de projeções bastante elevadas, face a brusca retração da liquidez do mercado global.
Há ruídos internos no cenário político doméstico com o Presidente do Senado ameaçando não votar o Orçamento de 2019 buscando assim evitar o veto ao projeto que prorroga benefícios fiscais para empresas instaladas nas áreas de atuação da SUDAM e da SUDENE, e que cria novos para a SUDECO.
Também ocorre a impertinência do Presidente do Senado de entrar com uma ADI junto ao STF caso o TCU decida dar aval à revisão do contrato de cessão onerosa da Petrobras e ao leilão de excedentes, sem consultar o Congresso.
“Picuinhas” internas de final de mandatos se configuram impertinentes em assuntos relevantes e afetam os ânimos.
A “pendenga” China-Estados Unidos é um foco contínuo e mutante de perspectivas, repercutindo muito a inconstância do humor do Presidente americano, então é preciso muita acuidade nas considerações no entorno desta questão, fonte inesgotável de volatilidade e vulnerabilidade.
Naturalmente que o intervalo de 90 dias estabelecido entre as partes prejudica as exportações de soja brasileira, visto que a safra americana que está sendo colhida será em grande parte vendida para a China nesta janela, em detrimento das exportações brasileiras.
O COPOM ratificou a esperada manutenção da taxa SELIC e indicou que esta poderá ser mantida por um longo período, visto que o país tem inflação controlada e ainda atividade econômica fraca.
O ambiente externo pró emergentes tende a piora como mencionamos, e há muitos questionamentos sobre as perspectivas para a economia americana visto que a inversão das curvas de juros ocorrida reacendeu as expectativas de que possa ocorrer recessão num futuro próximo.
Há também muitas incertezas recentes sobre a dinâmica do FED no tratamento do juro, antes com forte convicção de mais elevações, porém agora já sem tantas certezas.
E mais, o que é bastante intrigante, o Brasil teve no mês de novembro o mais expressivo volume de saídas financeiras dos últimos 10 anos e este fato persistiu de forma moderada na primeira semana de dezembro, e este fato determinou que os bancos constituíssem “posições vendidas” no mercado de câmbio à vista da ordem de US$ 13,0 Bi e o BC só tem posição “em ser” de linhas de financiamento em moeda estrangeira com recompra, fonte de suporte da liquidez, de US$ 6,250 Bi. Este fato pode estar dando suporte à apreciação do dólar ante o real.
À margem do mercado à vista, há volumosas posições “compradas” e “vendidas” com mais de US$ 40,0 Bi de cada lado e que ensejam disputa de interesses que impactam na formação da taxa cambial de forma direta. Os “comprados” que especulam com a alta da taxa cambial continuam acentuando suas compras e elevando seus estoques de posições com a convicção de que o viés é de alta.
Então, ruídos do cenário político, prevalência de incertezas quanto às diretrizes efetivas para equalização das reformas, em especial previdenciária, AUSÊNCIA MAIS CONTUNDENTE DO BC SUPRINDO A OFERTA DE LIQUIDEZ NO MERCADO À VISTA, perspectivas de cenários externos menos favoráveis aos emergentes, incluso o Brasil, podem afastar a taxa cambial ao final do ano das projeções antigas e ainda presentes de fechamento entre R$ 3,70 a R$ 3,75 e a elevar para R$ 3,80 a R$ 3,85, ou até um pouco mais.
É preciso acompanhar, bem ao final do mês os volumes dos segmentos à vista e futuro do dólar podem sofrer retração e, então quem sabe, a taxa retroceder, mas neste momento o viés de alta, a despeito da volatilidade, parece predominante.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO