O mercado de câmbio à vista no Brasil está sob relativa intervenção do BC, que previdentemente supre a liquidez à vista face à carência de fluxos cambiais positivos e consistentes para o país, e, adicionalmente age no mercado futuro de dólar ancorando a formação da taxa dando-lhe sustentação, comportamento que temos destacado de forma contumaz nos nossos comentários diários.
Contudo, ontem, a despeito dos “ecos maiores do que o fato em si” decorrentes da China ter desonerado 16 produtos americanos, de seu inteiro e pontual interesse, de tarifas e das expectativas em torno do pronunciamento do Presidente do BCE que ocorrerá hoje e pode anunciar programas de incentivo focando a atividade econômica dos países da comunidade, além dos destemperos do conflito do Presidente Trump com o Presidente do FED americano exigindo redução da taxa de juro americana para “zero”, ocorreu no Brasil movimento atípico no comportamento do real frente ao dólar.
A rigor somente o real e a lira turca se valorizaram frente ao dólar, sendo que todas demais moedas de países desenvolvidos ou emergentes sofreram desvalorização frente a moeda americana.
Os efeitos imediatos consubstanciados nas expectativas sobre as decisões do BCE a serem anunciadas hoje e da atitude da China retirando tarifas sobre um número muito restrito de produtos americanos e de seu interesse, não foram capazes de impactar a favor do dólar que se fortaleceu inclusive frente ao yen e o franco suíço, deixando evidente que a moeda americana ainda perdura como refúgio principal em momentos de insegurança.
Ontem, destacamos a nossa percepção de que o mercado global está sinalizando movimento de afastamento da euforia decorrente da sinalização de reunião entre China e Estados Unidos trafegando para uma postura de cautela, maior sensatez, e isto a despeito dos ruídos iniciais de ontem pela “gentileza” da China de desonerar 16 produtos americanos de seu interesse, que não se sustentaram.
Então o que aconteceu no mercado de câmbio brasileiro, onde o real tem, por vezes, se apreciado mais do que as demais moedas e se depreciado menos em outras ocasiões, mas que ontem, destacadamente, quase ficou isolada na apreciação frente ao dólar.
O que teria acontecido?
Fluxo intenso de recursos externos imprevistos e que agregados a oferta do BC no mercado à vista pressionaram a taxa “para baixo”? Não se sabe o BC não torna este dado disponível!, ou
Venda intensa no mercado de dólar futuro adicionalmente ao volume de swaps cambiais reversos ofertados e colocados pelo BC?
Seja um ou outro evento, somente hoje saberemos, quem sabe, com maiores detalhes, mas o fato concreto é que houve uma atipicidade no comportamento do preço do dólar no nosso mercado.
Mas, a impressão que fica é que a apreciação ocorrida do real é insustentável, e só ocorreu por razão ou razões pontuais.
Queremos acreditar que a apreciação do real frente ao dólar não seja objetivo do BC neste momento, pois abriria um “gap” para ser estimado de variação cambial que poderia afetar em demasia a formação do preço do cupom cambial, podendo criar embaraços para que o COPOM reduza a SELIC como é esperado por todo o mercado.
Além de considerarmos como uma necessidade para incentivar as exportações de commodities e focar a melhora do fluxo cambial.
O nosso mercado como um todo convive com um cenário incomum, pois têm juro baixo, inflação baixa, CDS excelente, fluxo cambial ruim (US$ 1,591 Bi negativo líquido em setembro e US$ 8,117 Bi negativo no ano) e baixa atratividade ao capital estrangeiro dado a inércia da atividade econômica, até mesmo o especulativo pela inviabilização das operações de “carry trade”, e perspectivas de retomada da atividade econômica somente no médio/longo prazo.
Para o Brasil é tempo de ter paciência e tolerância com o baixo crescimento e desemprego elevado. O país dá evidências de que está na rota certa, mas na velocidade mínima.
No nosso entender para o COPOM ter ambiente tranquilo para realizar o corte da taxa SELIC, independente do que o FED possa reduzir na taxa de juro americana, o preço do dólar deverá estar no intervalo de R$ 4,10 a R$ 4,15, por isto o movimento atípico de ontem causa surpresa.
A leitura do movimento global de ontem em torno das moedas deixa o entendimento que o dólar continua sendo o refúgio principal nos momentos de insegurança, e como destacamos no nosso post de ontem, há a percepção de que após a euforia os mercados globais tendem a retomar a cautela, a sensatez.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO