A manchete é provocativa com o intuito de chamar a atenção para o fato de que preço da moeda americana é depreciado no nosso mercado, assim como nos demais países emergentes, por sua fragilização decorrente de fatores próprios de sua economia, a americana, e não por méritos destas emergentes que continuam convivendo com ambientes extremamente nebulosos e incertos, não sabendo nem mesmo se já atingiram o pico da pandemia do coronavírus.
A absoluta nebulosidade ainda predominante sobre o “status quo” das economias emergentes, se bem que há também insegurança quanto a retomada em economias desenvolvidas, não permite que se vislumbre perspectivas confiáveis e fundamentadas, visto que até ocorre ainda o aumento dos danos da crise e não se tem vislumbres de como sair desta situação desalentadora.
A moeda americana além de repercutir os sinais de retomada da atividade econômica, embora lenta e com retrocessos em alguns estados importantes, é também o “porto-seguro” do mercado global e desta forma é o termômetro que sinaliza os agravamentos e os alívios da economia mundial.
Naturalmente, aos Estados Unidos a fragilização de sua moeda ante as demais, em especial as das economias mais relevantes, nesta fase de busca de retomada do ritmo de atividade econômica é extremamente importante visto que eleva fortemente a capacidade exportadora americana concorrencial, impulsionando tanto a sua atividade do agronegócio quanto a industrial, e, na mesma intensidade neutraliza a sua demanda internacional de produtos e/ou insumos pelo encarecimento, levando ao fortalecimento da indústria nacional.
Guardada as devidas proporções, o Ministério da Economia e o BC buscaram num certo momento ao estimularem o impulso do “câmbio alto e juro baixo” uma resultante semelhante, porém não lograram o sucesso almejado de dar competitividade ao setor produtivo nacional com foco na atividade exportadora com o preço aviltado do dólar, elevar a contenção das importações pelo encarecimento deslocando a demanda para a indústria nacional (evitando o que o Ministro Guedes nominava de desindustrialização do país), e tornando o país atraente para investimentos no mercado de renda variável, já que o país perdera o atrativo da renda fixa com a queda do juro, e tornando o “país barato” para os investimentos estrangeiros em conta de capital e atrativo no programa de privatizações.
Infelizmente houve muitos contratempos e pouco houve de reação dentro do esperado pelo governo em relação ao capital estrangeiro e mesmo em relação ao setor privado que não reagiu ao estímulo, e isto teria sido fundamental visto que o governo federal não dispunha, como continua não dispondo, de recursos para investimentos na infraestrutura.
Então, o fato do real se apreciar frente ao dólar nas circunstâncias atuais não enseja euforismos e nem sugere otimismos relacionados ao desempenho da economia do país, que continua muito fragilizada e ainda não permite com clareza se estimar qual a magnitude do impacto na decadência do PIB.
Até certo ponto se ultrapassar o intervalo de R$ 5,20 a R$ 5,40 poderá ser prejudicial ao país nos seus objetivos ainda presentes, já que entendemos que o dólar alto é o preço do “novo momento” da moeda no nosso mercado dentro da visão do governo.
Se nenhum estresse fortíssimo de natureza política ocorrer, entendemos que nenhum reflexo da economia afetará o preço da moeda americana neste patamar, visto que não se espera grandes fluxos de ingressos e nem mesmo de saídas de recursos do país, sendo que neste quesito a dimensão da “fuga de capitais” parece ter sido contida naturalmente.
Neste nível de taxa cambial não se espera crescimento com dispêndios de viagens como outrora e o cenário econômico não sugere remessas grandiosas de lucros e dividendos, e devemos continuar exportando produtos do agronegócio e importando menos, melhorando sobremaneira o saldo em transações correntes.
O mercado trabalha com a ideia de que a mediana do preço dos swaps negociados pelo BC esteja dentro desta faixa de preço do dólar, o que deixa pouca margem para perdas por parte da autoridade no quesito específico operacional.
Desde dezembro, o BC já realizou vários movimentos com suas intervenções ou não intervenções quando necessárias ou mesmo com intervenções “neutras” questionáveis, mas doravante parece que o dólar manterá parâmetros mais previsíveis, mesmo com a SELIC cedendo mais e aumentando o prêmio de risco.
Não esperamos nenhum “boom” na B3 por falta absoluta de atratividade fundamentada de papéis com perspectivas auspiciosas, até porque a capacidade de consumo da população está comprometida, e, nem movimentos abruptos na taxa cambial pois, não vislumbramos nenhuma intensificação de demanda ou de oferta, salvo, como ressaltamos, se houver perturbações políticas de grande repercussão, ou como neste momento decorrente da fragilização da moeda americana no mercado global.
Há absoluta necessidade de fatos novos, como o enfrentamento pelo governo da propositura das reformas, materializando-as e não somente as fazendo objeto de manifestações aqui ou acolá para ganhar manchetes de jornais, e, dinamizar o programa de privatizações que certamente envolverão conflituosos debates ideológicos e requererá marcos regulatórios extremamente detalhistas para serem críveis.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO