Renda sucumbe à inflação

A inflação chegou ao contracheque dos trabalhadores. Nos três primeiros meses deste ano, os brasileiros conseguiram apenas acompanhar, com muito custo, a alta dos preços e se viram obrigados a frear o consumo. O rendimento real cresceu 0,18% frente ao trimestre imediatamente anterior (entre outubro e dezembro de 2012), avanço praticamente nulo, que coloca em xeque a política de expansão e de distribuição de renda do governo Dilma Rousseff. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quando a avaliação é dividida por grupos de empregados, os funcionários públicos

A inflação chegou ao contracheque dos trabalhadores. Nos três primeiros meses deste ano, os brasileiros conseguiram apenas acompanhar, com muito custo, a alta dos preços e se viram obrigados a frear o consumo. O rendimento real cresceu 0,18% frente ao trimestre imediatamente anterior (entre outubro e dezembro de 2012), avanço praticamente nulo, que coloca em xeque a política de expansão e de distribuição de renda do governo Dilma Rousseff. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quando a avaliação é dividida por grupos de empregados, os funcionários públicos e os sem carteira assinada, contudo, estão bem acima dessa variação. Os servidores tiveram ganho real de 2,43%, e os informais, de 4,51% (veja gráficos).

Para o governo, diante desse quadro, segurar a carestia voltou ao topo da lista de prioridades. Tanto que o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central deve, na próxima semana, elevar os juros básicos (Selic). Na avaliação de economistas e de integrantes do Executivo, a instituição não tentará, porém, levar a inflação para o centro da meta, de 4,5%, em 2013. O ajuste, que, se confirmado, será o segundo do ano, teria como objetivo apenas dar algum alívio ao orçamento das famílias e, por conseguinte, garantir ainda que o consumo, pilar mais robusto da economia, continue a ser o principal combustível do crescimento.

Além da inflação, o ritmo incerto de expansão da atividade econômica e de setores importantes, como a indústria, tem afetado negativamente os ganhos salariais para algumas categorias. Os empréstimos e financiamentos mais difíceis, em função de bancos privados estarem seletivos nas concessões, também contribuem para que a venda de bens duráveis esfrie. “A renda real das famílias em desaceleração e o comportamento do crédito seguram o consumo e, por isso, esse não pode ser mais a base de sustentação do crescimento econômico do país”, argumentou Mariana Hauer, economista do banco ABC Brasil.

Sidnei Nehme, economista e diretor executivo da NGO Corretora, faz avaliação semelhante. Ele explica que o encarecimento do custo de vida tem afetado principalmente a população de menor renda. “A quantidade de preços em alta é grande, e não podemos perder de vista que a inflação ainda é algo muito presente no DNA do brasileiro, o que pode incentivar remarcações”, ponderou.

Estagflação

Na avaliação de Nehme, o Brasil sofre de estagflação, ou seja, tem baixo crescimento e carestia em alta. “O governo tem insistido em tentar controlar a inflação e o crescimento, mas essa estratégia pode resultar em duplo insucesso pela incompatibilidade das decisões”, disse. Para ele, é difícil conciliar estímulos fiscais e monetários para impulsionar o crescimento sem, com essas medidas, jogar mais combustível na inflação. O diretor executivo da NGO e outros especialistas lembram ainda que preços em alta diminuem a previsibilidade da atividade e afeta negativamente os investimentos.

O IBGE divulga hoje a prévia da inflação de maio, o IPCA-15. Para o mercado financeiro, não será nesse indicador que os trabalhadores devem encontrar algum alívio para o orçamento. A estimativa é de que a alta do índice seja de 0,49% no mês, o que o deixará, no acumulado de 12 meses, em 6,58%, muito próximo do teto da meta, de 6,50%.

“O Banco Central deve subir a Selic na próxima reunião para controlar os preços, mas essa gestão já mostrou claramente que a preocupação dela é com o emprego, a renda e o crescimento (da economia), não com a inflação”, criticou Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating. “Esse modelo é adotado em países desenvolvidos, mas não cabe ainda no Brasil, porque temos um setor produtivo em recessão e baixa capacidade de alimentar a demanda”, argumentou.

Enquanto o governo estimular o crescimento sem conseguir elevar o nível de investimento, o brasileiro continuará a pagar uma elevada fatura sempre que for ao supermercado ou precisar de algum serviço. Se, por um lado, a inflação no acumulado de 12 meses chegou a 6,49%, praticamente cravada no limite de tolerância, por outro, o custo de alimentos e bebidas disparou. Esse grupo de itens de consumo acumula elevação de 14% até abril — mais que o dobro do registrado em igual mês do ano passado.

Paradoxo nacional

A despeito dos avanços desde a estabilização da economia, com a criação do plano real, em 1994, o Brasil amarga uma situação não muito comum se comparado ao restante do mundo. O país ostenta um dos juros básicos mais elevados — 7,50% ao ano — e, ao mesmo tempo, uma das inflações mais pesadas do planeta, de 6,49% no acumulado de 12 meses. Deficiências em infraestrutura e um setor produtivo defasado e pouco competitivo, além de um deficit fiscal elevado, ajudam a explicar essa disparidade. Em 19 anos, a carestia brasileira acumula uma alta de 330,73%. Nos Estados Unidos, esse número é bem inferior: em torno de 50%.

Alguns produtos e serviços, porém, registraram elevações muito superiores à média nacional no período. O preço do aluguel, por exemplo, subiu 826,45% — ou seja: se, em 1995, morar em um apartamento que custava R$ 500, hoje, no mesmo imóvel, o inquilino precisaria desembolsar R$ 4.132,25. Em países desenvolvidos, um avanço dessa magnitude seria impossível. Não à toa, o Brasil ocupou, por anos, o posto de a maior inflação do mundo. Em uma lista de 38 nações, a bandeira verde e amarela tem um custo de vida melhor apenas que o da Índia — que este ano, até maio, registra carestia de 11,44% — e o da Rússia (7,26%).

Contas públicas

O posto de terceira maior inflação do mundo, ocupado pelo Brasil, já foi da Turquia. O país euro-asiático, no entanto, conseguiu diminuir a sua taxa para 6,13% e, ao contrário da situação brasileira, mantém juros bem inferiores, de 1,75% ao ano. Para diminuir a Selic, especialistas explicam que seria necessário melhorar as condições das contas públicas.

Alguns economistas defendem uma meta de redução do deficit fiscal em vez de o país perseguir um superavit nominal (economia para pagar juros da dívida). Na prática, o governo teria de gastar menos do que tem em caixa, situação oposta à atual. Como os desembolsos são muito superiores aos recursos disponíveis, o Estado precisa emitir títulos para arcar com todos os custos da máquina pública. Quanto mais dinheiro é necessário pegar emprestado, maiores serão os juros.

Para o mercado financeiro, o Banco Central deve elevar a Selic até 8,25% ao ano. Quando chegar a esse nível, deve deixar a taxa intocada pelo menos até o fim de 2014. O Itaú Unibanco, porém, estima que o BC intensifique, na semana que vem, o ajuste monetário. Em vez de uma elevação de 0,25 ponto percentual, deve subir 0,50. Caso esse movimento se confirme, o processo de alta pode ser maior que o esperado pelo mercado, situação que levaria a taxa para 9% ao ano.


ngo na midia diario pernambuco Fonte: Diário de Pernambuco
Link: http://migre.me/eFAdL
Autor: Correio Brasiliense
Data de publicação: 22/05/2013

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