Faz bem pensarmos que está tudo normal e que tudo ficará melhor se ignorarmos a dura realidade, e vivermos a ficção de nossos anseios.
É uma atitude que pode acarretar um ônus futuro que pode ser evitado no presente. Basta ser previdente, e não ignorar os fundamentos presentes e o cenário prospectivo que emite sinais cautelares, agindo para mitigá-los e influenciar na reversão das perspectivas negativas.
Ao governo cabe fomentar o otimismo em relação às perspectivas para a economia e com isto dar conforto e segurança à sociedade a qual governa, porém, é preciso ter cuidados para não cometer erros e promover decepções e desapontamentos irreparáveis, que podem vir na forma de perda de emprego e renda.
A inflação tem o poder de retirar o que foi conquistado nos últimos anos, por isso precisa ser tratada com foco rigoroso, não permitindo vacilo ou condescendência no seu enfrentamento.
Permitir o voo livre do preço do dólar, coisa rara e que não aconteceu nem nos melhores momentos do país, num contexto preocupante em que se tem inflação aquecida sendo coibida por elevação do juro e com o país mantendo barreiras tributárias para ingressos de recursos externos, num ambiente em que se tem uma queda brusca de fluxos imprescindíveis, é algo inconcebível e irracional.
Por isso repercutiram estranhas e contraditoriamente as declarações do Diretor de Política Monetária do BC, Aldo Mendes, ontem em Londres, bem como a do Presidente do órgão, Alexandre Tombini, no final de semana em Istambul, falando em despreocupação em relação ao comportamento do preço do dólar, etc., uma vez que são os responsáveis pelas atitudes do Copom que vem agindo para conter a inflação, elevando o juro.
Importante ressaltar que as declarações do diretor do BC ocorreram durante um “road show” sobre Brasil com investidores. Certamente, há na manifestação uma mensagem aos investidores estrangeiros que tem uma visão crítica às continuas intervenções do governo no mercado cambial, num momento para valorizar o dólar e noutro para deprimi-lo, gerando incerteza e insegurança.
Esta dubiedade de comportamento frente à inflação poderia resultar numa equação de resultado zero de eficácia, e, ocasionar o insucesso no enfrentamento da inflação e no objetivo de crescimento. Seria como dar com a mão direita e tomar com a esquerda.
O governo, que tanto falou em “guerra cambial” e “tsunamis”, vinha se mostrando resistente em não intervir no mercado de câmbio, para permitir o ingresso de recursos externos de curto prazo que repudiou com medidas tributárias dada a sua natureza especulativa. Mas, por fim, ante a clara deterioração das contas externas brasileiras, com o déficit em transações correntes superando 3% do PIB e com baixa expectativa de que o país obtenha volume de recursos externos suficientes para o financiamento, fato que repercute em pressão altista do preço da moeda estrangeira, resolveu então pela DESINTERVENÇÃO retirando a tributação de IOF de 6% que incidia sobre este fluxo de curto prazo direcionado a renda fixa.
Enfim, em tempos de necessidade não dá para escolher a qualidade, e esta, provavelmente, seja a última via de atração de recursos externos para o país que pode mudar as perspectivas presentes em relação às contas externas, pois coincide com a alta da taxa Selic.
Para conter a pressão altista com base nos fundamentos econômicos internos fragilizados não seria suficiente a prática contumaz de oferta de “swaps cambiais”, era necessário mudar efetivamente as perspectivas em relação aos fluxos de recursos.
Este é um tema que vimos abordando sua necessidade desde alguns meses atrás quando sinalizamos a clara deterioração gradual das contas externas. Vimos desde então que esta medida seria inevitável, por isso a consideramos até tardia.
Como já abordado anteriormente, não compartilhamos na tese de que a queda do preço das “commodities” atenuaria as pressões da alta do dólar, etc.
O dólar tem forte capacidade de influenciar nas pressões inflacionárias. Se permitirmos que a taxa se eleve num ambiente em que as “commodities” têm preço em queda, ocorre a equalização e o benefício desinflacionário nos preços dos alimentos se anula. A participação dos produtos importados é altamente relevante na nossa economia na forma de insumos e produtos acabados e este seria um foco de pressão inflacionária. Enfim, há inúmeros aspectos em que fica “evidente” a pressão inflacionária advinda do preço do dólar elevado num ambiente em que se adotam medidas de política monetária para sua contenção na economia.
A grande mudança de imediato é em relação às perspectivas em torno das nossas contas externas em razão da expectativa de que os fluxos de recursos financeiros aumentem para o Brasil.
Acreditamos que teremos dois momentos no nosso mercado. Inicialmente uma queda rápida não excessiva e depois gradual repercutindo o fluxo quando começar a ingressar e alguma resistência face aos posicionamentos no mercado futuro, indo então, para um preço próximo da neutralidade em termos de impacto inflacionário.