O nível de atividade da economia brasileira sinaliza evolução e mantendo a direção certa, mas a intensidade denota estar pouco abaixo das projeções que alimentaram de forma intensa as perspectivas otimistas para o início do ano.
A inflação do mês de dezembro, ainda que houvesse justificativas com fatos pontuais, que conduziu o IPCA do ano de 2019 a ponto superior à meta, inquestionavelmente impactou no ambiente de forte otimismo e induziu a percepção sobre as perspectivas a serem atenuadas, visto que viraram o ano muito aquecidas.
Dados do varejo menos auspiciosos no mês de novembro, contrariando as expectativas de grande desempenho face ao “Black Friday”, adicionaram mais cautela, e a despeito do IBC-Br de novembro ter revelado alta de 0,18% pouco acima da projeção de 0,10%, mas chamou mais a atenção a revisão do dado de outubro de 0,17% para 0,09%, que redundou em avanço no acumulado em 12 meses de 0,90%.
Enfim, a resultante deste ambiente mais cauteloso e menos alvissareiro se confirmou na não intensificação de fluxos de recursos externos que eram aguardados de imediato para o início do ano.
A frustração ofuscou o otimismo e assim a Bovespa repercutiu com ajustes negativos e o dólar ganhou força, contraditoriamente quando o fluxo cambial, após longos meses, deu sinal de resultado positivo até o dia 10 deste mês.
A cena externa se tornou mais tênue com o acordo em sua fase preliminar entre China e Estados Unidos, e as retaliações entre Irã e Estados Unidos entraram em fase menos tensa, então deixou de ser a justificativa contumaz dos nossos males, que assim deixaram exposto que as causas estão aqui mesmo e é importantíssimo que haja reação reconduzindo o cenário ao otimismo, inegavelmente abalado.
O dólar cumpriu trajetória soberba saindo do R$ 4,01 da virada do ano para as proximidades do R$ 4,20, absolutamente sem quaisquer intervenções do BC ao longo da quinzena.
O sentimento é de que o BC desde agosto de 2019 encetou forte intervenção no mercado de câmbio, mas somente agora fica a percepção de que “controlou a consequência maior, a febre, sem prover com cura a doença”, enfim muita transpiração e pouca efetividade no combate à disfuncionalidade na formação do preço do câmbio, já que intervindo na forma “neutra”, não se limitando a prover de solução objetiva a carência de liquidez no período de queda forte do fluxo cambial, pode ter errado ao intervir conjuntamente de forma casada, dita neutra, no mercado de câmbio à vista e futuro de dólares.
Enfim, foram quase 10% das reservas cambiais e a disfunção está presente, o que se acredita teria sido evitado se a intervenção ocorresse tão somente com oferta de liquidez num mercado que era carente somente de liquidez no segmento à vista, simples assim, equacionando o preço à realidade.
E, então, uma vez colocada “ordem na casa” a autoridade monetária passaria a intervir de forma neutra, que acabaria dando sustentabilidade ao preço, num ambiente de taxa cambial equalizada com a realidade cambial do país, que não tem quaisquer riscos de crise cambial.
Agora, como se estivesse numa fase sabática em reflexão, a autoridade se mantém ausente do mercado, o que passa uma sensação de que o câmbio, importante fator de fomento inflacionário, está, grosseiramente falando, praticamente largado nesta primeira quinzena do ano.
É provável que tenha permitido que a exacerbação de momento tenha ido além do razoável, e que retome as intervenções somente com oferta de liquidez no mercado à vista, aguardando que ocorra recuperação gradual do fluxo.
O câmbio sensibiliza muito rapidamente o sentimento dos negócios no país, e quando seu preço foge do razoável transparece que algo não vai bem e gera incertezas e intranquilidade, além de ter capacidade inflacionária de grande contundência.
“Pagar para ver” não é uma boa postura da autoridade monetária, é melhor atuar pontualmente e com o mecanismo e forma precisa e adequada.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO