Ao longo dos nossos comentários diários sempre contestamos de forma discreta na maioria das vezes e mais incisiva em algumas oportunidades a visão sobre a dinâmica da economia brasileira, foco de entusiasmadas abordagens e perspectivas exacerbadamente otimistas, pois entendíamos que havia interrompido o período de piora, mas ainda apresentava e continua a apresentar, inúmeras fragilidades que impedem que seus números possam ser considerados sustentáveis.
Sempre focamos na existência de muitas dúvidas e incertezas em perspectiva, problemas de natureza fiscal, visão mais cética a respeito da recuperação efetiva do emprego, renda e consumo, e nas projeções em torno do crescimento do PIB que se consubstanciaram exatamente no foco da melhora do consumo.
Afora isto, sempre enfatizamos a magnitude do risco político em perspectiva, seja pelo baixo apoio do Congresso as propostas de governo, seja pelo acirramento com intensas repercussões em torno da sucessão presidencial.
No nosso entender, o preço do dólar estava em patamar muito deprimido e projetamos, já em janeiro, que estaria em R$ 3,50 ao final do 1º trimestre, e que a alta da Bolsa vinha sendo impulsionada pelo capital estrangeiro fortemente especulativo que aportava o país em consequência da exuberante liquidez do mercado internacional.
O mercado financeiro brasileiro denotava estar inebriado pelo ambiente predominante no mercado internacional, embora houvesse como há, inúmeros fatores diferenciais que não sancionavam a suposta sinergia.
Com um pouco de atraso e impulsionado pelo agravamento dos impactos presumíveis do comportamento do mercado externo, em especial nos Estados Unidos, onde como consequência das diretrizes adotadas pelo governo americano a inflação se demonstra mais intensa e ocorrem impactos no mercado de juro conduzindo o titulo referencial T-Bond 10 anos a ser operado com juro de 3% e perspectiva que possa atingir 3,25%, afloram as fragilidades brasileiras e então se percebe que a economia torna efetiva a tese do “voo da galinha”, a geração de empregos está muitíssimo distante dos milhões que o governo propaga em seus discursos, que o consumo se retrai tendo em vista que a renda não evolui.
Afora esta percepção desapontadora, o risco politico se acentua e há um absoluto ceticismo sobre as perspectivas no campo sucessório embora faltem menos de 6 meses para as eleições, afora o ampla insegurança quanto as decisões que vem sendo adotadas pelo Judiciário, merecendo destaque ainda o “confronto” entre os poderes do Estado brasileiro, que cria níveis variados de insegurança.
Esta combustão de fatores e vetores, como salientamos em nosso post de ontem, coloca o preço da moeda americana de forma sustentável na rota do preço de R$ 3,50 ou mais e faz com que a Bovespa perca suporte e tenda a passar por um forte ajustado já iniciado.
Acreditamos mesmo que o BC/COPOM deva fazer uma reflexão e reavaliar sua propensão de reduzir a SELIC para 6,25% no momento em que o juro americano está em patamares elevados, pois isto pode fortalecer os ajustes no nosso mercado financeiro, fomentando a saída rápida dos recursos estrangeiros especulativos aqui presentes, seja pela perda de atratividade das operações de “carry trade” seja pelo interesse que os T-Bonds passam a exercer nas decisões de investimentos.
A conceituada agência Bloomberg enfatiza que o BC emergente deve segurar câmbio com inflação baixa. Esta leitura técnica nos parece equivocada no caso brasileiro. O Brasil tem problemas únicos e pontuais que o difere dos demais emergentes, pois é um ano eleitoral cercado de dúvidas e incertezas, continua com relevante problema fiscal, evidencia que a economia patina e que a redução do juro e a inflação baixa não se prestaram a estimular o investimento, e que não conduziram o sistema creditício a reduzir o custo do crédito.
Acreditamos que os próximos 6 meses serão muito tensos e impactantes para o Brasil, devendo haver um descolamento do comportamento dos seus ativos principais, dólar e Bovespa, do comportamento externo, sendo que este, dependendo do seu direcionamento, ainda poderá trazer impactos adicionais sobre o Brasil.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO