Este posicionamento de ausência de precaução num ambiente que evidencia, cada vez mais, riscos relevantes com que convive o país, que poderão ter reflexos generalizados politica e economicamente, provocando movimentos abruptos no comportamento dos preços dos ativos, na medida em que deixem de ser observações e transitem para a efetividade, é preocupante e poderá causar volatilidade intensa.
A questão da denominada “regra de ouro” causou desgastes ao governo e deixou latente a extraordinária fragilidade da política fiscal prevalecente, e o fato do governo ter recuado pela percepção do dano causado conceitualmente, amparado pela manifestação do BNDES, pontual e sincronizado, de retornar ao Tesouro Nacional recursos da ordem entre R$ 130,0 a R$ 150,0 Bi, “soluciona” o problema deste ano de 2018, mas arremete de imediato as discussões já focando 2019, cujo orçamento deverá ser montado neste ano corrente, e obrigatoriamente fará o tema retornar ao debate.
O governo sabe que precisará retomar o assunto para não deixar um orçamento irreal como legado para o próximo Presidente, e certamente o fará mais também com outras medidas, além das férias à regra de ouro, alterando a Constituição que revelem contenção de gastos, para assim ter melhor fundamento, embora nova rodada desgastante seja inevitável.
Parece irônico, mas 2018 no nascedouro já parece absorvido pelas preocupações em torno de 2019, pois se solução não for encontrada para a elaboração da peça orçamentária, o risco de calote em perspectiva ficará inconteste para 2019.
Por outro lado, os sinais em torno da votação da reforma da previdência no dia 19 de fevereiro ainda sugerem aprovação não resolvida e sem novas aderências de políticos favoráveis. Embora o Ministro Meirelles venha enfatizando que não haverá novas concessões, parece inevitável que o governo terá que ceder mais um pouco para tentar viabilizar a aprovação.
Outro aspecto relevante e que deveria estar preocupando o mercado financeiro de forma mais evidente é o julgamento do ex-presidente Lula. Os indicativos sinalizam que o mercado trabalha com a estimativa de 60 a 70% de probabilidade de que ele seja condenado. Mas ao que tudo indica este é um fato sobre o qual não restam duvidas, mas o fator desarticulador é a consequente repercussão reacionária que pode criar tensões que poderão sensibilizar os investidores estrangeiros, e até mesmo os nacionais, negativamente.
Embora venha sendo subestimado, este poderá ser um fator altamente relevante no humor predominante atualmente.
O comportamento do mercado e a formação de preços dos ativos parece não se sensibilizar com os riscos em perspectivas e todos os setores estimulam o otimismo inconsequente como se o país estivesse imune a todas as perturbações presumíveis que deveriam estar no radar, impondo maior precaução.
O país no contexto atual com os problemas em torno da séria crise fiscal pode sofrer um “downgrade”, que seria altamente negativo e afugentador dos investidores estrangeiros, até dos especuladores que são em maior proporção. A S&P já tem manifestado atenção e feito algumas sinalizações e a FITCH que em seu Relatório de Perspectivas Globais identifica uma melhora significativa desde a crise de 2008, salientando que vê um cenário melhor para ratings em 2018, destaca a existência de áreas geográficas com viés negativo para ratings soberanos como Oriente Médio, África, China e América Latina, destacando em particular as incertezas criadas pelas próximas eleições no México e no Brasil e que a América Latina é a região mais fraca para as perspectivas de rating corporativo.
A FITCH ainda vê possibilidade de o crescimento global alcançar 3,3% este ano, ancorado pelos investimentos, contudo, para 2019 destaca que poderá ocorrer reversão deste quadro devendo impactar causando a moderação no desempenho do PIB. Destaca que o fim dos QE´s (programa de expansão quantitativa) implicará em alta de juros e que isto poderá exercer pressão sobre os títulos soberanos, já que a dívida pública é elevada em muitos países.
Há uma postura de cautela por parte da FITCH, o que parece estar ausente atualmente no nosso mercado, a despeito de termos eleições que deverão ser tensas e acirradas, problemas de política fiscal, dívida pública elevada, e o governo, com base fragilizada, tentando aprovar reformas que não tem o apoio político necessário, e ainda precisando “construir” um orçamento para 2019 que requisitará alterações constitucionais relevantes.
Todas as projeções ainda permanecem superlativas, seria muito bom que fossem sustentáveis, mas não o são, e até o BNDES prevê que um cenário com crescimento de 6% na Formação Bruta de Capital Fixo, o que pressupõe a atividade econômica em ritmo acelerado.
Em nossa visão seria conveniente um grau mais acentuado de precaução por parte dos vários setores do mercado financeiro, e até mesmo dos setores produtivos da nossa economia, pois os riscos bastante transparentes em perspectiva poderão ser impactantes e desestabilizadores.
E são de tal porte que poderão provocar reversão de comportamento bastante expressivo, visto que há muitas dúvidas e incertezas no horizonte, e que podem provocar mudança de cenários de forma abrupta.
Continuamos com a percepção de que a BOVESPA mantém a alta menos por fundamentos e mais por movimentos especulativos, com a participação de investidores estrangeiros, que ao primeiro sinal negativo retiram seus capitais do país.
Entendemos também que, a despeito da forte intervenção do BC na formação do preço da moeda americana no nosso mercado, as perspectivas preocupantes deverão provocar a depreciação do real, que como já salientamos poderá estar em R$ 3,50 ao final deste 1º trimestre.