Fundamentos não sancionam real apreciado. Ambiente persiste adverso

Os fluxos líquidos de recursos para o país continuam ruins, situação persistente desde junho deste ano, e que já acumula no extrato do fluxo cambial saldo negativo de US$ 4,545 Bi até 25 deste mês, composto por US$ 7,957 Bi positivos no comercial e US$ 12,502 Bi negativos no financeiro, conforme divulgação de ontem do BC.

No ano passado, até a mesma data, tínhamos fluxo cambial com saldo positivo de US$ 21,707 Bi, o que representa que este ano, no comparativo, ocorre uma perda real de ingressos da ordem de US$ 26,252 Bi, do qual US$ 6,252 Bi no fluxo comercial e 20,0 Bi no financeiro.

Quando observamos a NFE (necessidade de financiamento externo) nos últimos 12 meses temos em setembro um montante de US$ 19,050 Bi, mas restringindo a somente os 9 meses deste ano temos US$ 16,799 Bi.

O BC, desde junho, concedeu aos bancos linhas de financiamentos (venda à vista e recompra futura) em moeda estrangeira de US$ 11,386 Bi que estão dando suporte às posições “vendidas” dos bancos no mercado à vista de US$ 11,235 Bi, dados apurados a partir dos números divulgados pelo próprio BC.

O montante das posições “vendidas” dos bancos – US$ 11,235 Bi – é exatamente o quanto está faltando de fluxo positivo para o país neste ano até o momento para gerar liquidez à demanda ocorrida no mercado à vista, e que vem sendo suportada pelos bancos através de suas posições a descoberto lastreadas com o suporte das linhas de financiamentos concedidas pelo BC. Esta estratégia protela a necessidade da autoridade de se expor como vendedor de cobertura ao mercado à vista.

A rigor, ao BC caberia gerar a liquidez faltante com a utilização das reservas cambiais, contudo, a estratégia adotada com os bancos fazendo o seu (do BC) papel e suportando as posições a descoberto com linhas de financiamento concedidas pela autoridade monetária, atenuam o impacto que ocorreria no mercado se assumida a postura por parte BC de que os fluxos estão insuficientes levando-o a realizar leilões de venda, o que poderia desencadear movimentos especulativos a partir desta fragilidade exposta do país.

Contudo, este não é um fato que passe despercebido aos “players” nacionais e estrangeiros presentes no nosso mercado, e, deixando de ser temporário, naturalmente a incapacidade do país de atrair recursos externos líquidos suficientes passará a impactar na formação do preço da moeda americana no nosso mercado.

Então, por que num ambiente tão desfavorável e desconfortável, o real segue apreciado ante a moeda americana?

Evidentemente porque o governo está induzindo esta situação e utiliza o real apreciado como antídoto (âncora) combinado com a elevação da taxa de juro Selic para conter as pressões inflacionárias presentes na economia do país.

Mas esta é uma estratégia de risco acentuado quando desenvolvida num ambiente em que se pontifica a carência de ingresso de recursos externos, visto que deixa em aberto a possibilidade de movimentos mutantes reversivos abruptos, e que acabam por ter intensidade bastante para atrair os eventuais benefícios obtidos pela contenção da alta ou apreciação do real, que acabam rapidamente exauridos.

É contumaz contar-se com a melhora de fluxos para o Brasil, considerando este ou aquele fator pontual fortalecido a partir da retomada da atratividade da rentabilidade que o país voltou a proporcionar com a retomada da alta da taxa Selic. Contudo, é preciso reconhecer que a precificação no preço da moeda americana no nosso mercado com base na perspectiva da melhora de fluxo que possa acontecer já ocorreu, e há vulnerabilidade agora que está atrelada na pressão que pode advir da não confirmação desta perspectiva ou mesmo da queda da liquidez no mercado internacional no momento em que o FED defina rever o seu programa de incentivo monetário.

Por ora, na reunião que se encerrou ontem, o FED por seu porta-voz, disse que aguardará um pouco mais para o “QE tapering”, ou seja, início da redução do programa de incentivo monetário, persistindo na observação dos dados da economia. A manifestação veio em linha com o esperado e já estava precificada pelo mercado.

Na realidade a perspectiva de melhora do fluxo vai se exaurindo na medida em que semana após semana o fluxo cambial se repete negativo e o tempo vai ficando curto em demasia até que seja retomada a discussão em torno das questões fiscais nos Estados Unidos, fato que por si só já provoca retração dos investimentos, ao qual se agregará a ação do FED reduzindo o seu programa de incentivo monetário, que deve se acentuar a partir do 1º trimestre de 2014. Ante os números de carência de fluxos positivos atuais, os US$ 4,0 Bi do bônus do campo de Libra perdem expressividade por estar longe de representar solução.

O fato concreto é que “o cobertor está curto” para satisfazer as nossas necessidades de recursos externos no curto prazo, e este fato não está ainda tendo repercussão na formação do preço da moeda americana no nosso mercado em razão das articulações/intervenções do BC no mercado, que, contudo, não podemos perder de vista que estão somente atenuando o problema, sem deter a capacidade de solução.

Na medida em que os posicionamentos “vendidos” dos bancos continuem em expansão, naturalmente ancoradas nas linhas de financiamentos em moeda estrangeira concedida pelo próprio BC, inevitavelmente haverá repercussão na formação do preço da moeda americana no nosso mercado à vista.

Consideramos preocupantes as articulações focando manter o real apreciado como ocorre no presente num ambiente amplamente desfavorável nas nossas contas externas. Os fatores que criaram perspectivas de melhora consequente da taxa cambial já foram precificados e não a sensibilizam mais como a postergação do início da redução pelo FED do seu programa de incentivo monetário, porém restaram os fatores que criam perspectivas de piora que podem sensibilizá-la de forma abrupta.

 

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