É bem verdade que o acordo temporário e frágil alcançado nos Estados Unidos para a questão do teto do endividamento retira o estado de “sufoco” e perspectiva de “default” da maior economia do mundo, mas o euforismo observado pode estar fora da curva.
O mercado americano se manteve tolerante ao longo da convivência com as disputas políticas entre republicanos e democratas e evitou o “stress”, que naturalmente contaminaria globalmente todos os mercados, mantendo a convicção de que seria impensável a não ocorrência de um acordo, mesmo de curto prazo como ocorreu, que permitisse tempo para que o assunto continue na pauta de discussões.
Provavelmente a experiência de um passado não tão distante com disputas semelhantes tenha determinado o equilíbrio ao invés da precipitação.
Mas, é preciso considerar que o acordo só financiará o governo até 15 de janeiro e eleva o teto da dívida até 7 de fevereiro. Então dá um tempo, mas não dá folga, pois no início do ano o problema estará sobre a mesa.
Este contexto sugere como certo que o FED postergará o início de mudanças no programa de incentivo monetário, mas será mais um problema requentado para o próximo ano, que poderá ocorrer com um “timing e intensidade” diferente do que seria se iniciado este ano.
Então, o “replay” dos mesmos problemas está garantido para o ano que vem, a começar de janeiro, e pode até encontrar um Brasil com um contexto no setor externo/cambial pior do que o atual.
Uma visão rigorosa sugere que não há tanto para reações excessivas.
E o Brasil?
O Brasil tem no presente um “gap” enorme entre a projeção de déficit em transações correntes e os IED´s, algo em torno de US$ 20,0 Bi e vem sustentando a tendência de fluxo cambial negativo, a despeito de todas as expectativas de que possa melhorar com a intensificação de ingressos de capitais especulativos atraídos por nosso juro em tendência ascendente na renda fixa e a Bovespa com preços deprimidos em alguns papéis interessantes na renda variável.
O BC divulgou hoje o fluxo cambial até 11 de outubro último com resultado negativo de US$ 4,340 Bi, sendo US$ 2,492 Bi no comercial e US$ 1,848 Bi. Na semana de 7 a 11 este resultado negativo intensificou-se em US$ 1,168 Bi no comercial e US$ 961,0 M no financeiro.
Com estes dados conclui-se que os bancos registravam até 11 de outubro posições “vendidas” de US$ 10,85 Bi, parcialmente ancoradas no exterior em linhas de financiamentos concedidas pelo BC no total de US$ 7,68 Bi.
O montante de US$ 10,85 Bi é exatamente o montante faltante até o momento de fluxo para a suficiência necessária para o Brasil financiar o seu déficit em transações correntes, visto que não há registro de intervenção do BC comprando ou vendendo moeda americana efetiva neste ano.
Os bancos com suas “posições vendidas” no ambiente atual estão substituindo o BC na geração de liquidez do mercado com venda de moeda efetiva.
Este volume de “posições vendidas” neste momento tem viés de alta, salvo se ocorrer a melhora do fluxo cambial para o país.
Então o que se observa como cenário prospectivo é a possibilidade de fechamento das contas externas com insuficiência de recursos para fazer face ao financiamento do déficit, que deverá ser suprida pelo BC com venda de parte das reservas cambiais ou mantendo a estratégia dos bancos suprirem esta insuficiência com a manutenção de “posições vendidas”.
Não será um bom sinal para 2014, ainda mais quando se vislumbra que o BC com o seu programa de oferta diária de liquidez mínima no mercado futuro de dólar, com “swaps cambiais” (que não é dólar divisa), possa estar no entorno do expressivo montante de US$ 100,0 Bi, e com todos os problemas do Estados Unidos postergados colocados outra vez sobre à mesa.
Tudo isto deixa muito evidente que a taxa cambial a R$ 2,15 ou R$ 2,17 é absolutamente irreal no mercado de câmbio brasileiro, havendo forte indício que está sendo fruto de especulação por parte dos “vendidos” no mercado à vista e futuro de dólar.
Aliás, a especulação presente ficou muito evidente ontem. O fato do BC não ter anunciado o leilão de lote de 10.000 contratos de “swaps cambiais” no horário contumaz provocou recuperação do preço da moeda americana que havia transitado abaixo de R$ 2,16 e acabou por fechar o dia no entorno de R$ 2,18.
E mesmo que se preste adicionalmente a mitigar as pressões inflacionárias, descasamentos de preços da Petrobrás, sejam qual forem os motivos e razões, estará representando um risco relevante dada a ausência de fundamentos para este comportamento, o que deixa em aberto a possibilidade de uma alta de 6% a 7% quando as circunstâncias fundamentadas conduzirem o preço à sua realidade.
Movimentos bruscos podem precipitar “efeito manada” acentuando repentinamente a demanda, levando o preço da moeda americana a superar o que se considera razoável para o fechamento do ano, ou seja, R$ 2,30.
Por isso, entendemos que o BC deva continuar com o seu programa de oferta mínima de liquidez diária, pois o interrompendo afetará sua credibilidade, mas precisa deixar de rolar as posições de “swaps cambiais” vincendas não integrantes do programa e com isto impactar na especulação presente e trazer o preço para perto de R$ 2,25.
O vencimento de 1º de novembro no montante de US$ 8,9 Bi se configura como excelente oportunidade do BC atingir o movimento especulativo, simplesmente deixando de realizar a rolagem.
Evidentemente, há perspectiva de que o fluxo de recursos especulativos melhore para o Brasil, embora o prazo para alcançar solução para os problemas fiscais atuais que envolvem disputas de natureza política seja bastante curto e os temores acerca do posicionamento do FED sobre a redução do seu programa neste ano continuarão perdurando no próximo ano.
Contudo, não há como ser otimista a ponto de supor que estes fluxos atingirão o montante que o Brasil ainda precisa captar para fazer face ao financiamento do déficit em transações correntes.
O Brasil tem problemas que devem impulsionar a taxa cambial que são somente seus, sem qualquer simetria com o exterior, e este é um diferencial ruim para o país neste momento e que pode avançar ao longo de 2014.