A euforia é a contraposição da sensatez e pode conduzir à precipitação de projeções menos sinérgicas com a efetiva realidade, digamos com a nossa economia real e os sinais que se observam no mercado de câmbio.
Já se leu projeções de dólar a preço de R$ 3,20, mas no nosso entender ainda estamos distantes desta possibilidade, e entendemos que, por enquanto, o preço da moeda americana no nosso mercado tende a se situar no entorno de R$ 3,70, com discreta volatilidade, até porque o que se vê de efetivo no mercado de câmbio, que podemos interpretar como sinais, não sugerem tendência sustentável de apreciação e nem mesmo de depreciação do real frente ao dólar.
Os bancos que detinham substantiva posição vendida de dólar no mercado futuro de dólares no mês de dezembro a reduziram drasticamente neste início de janeiro. Se houvesse convicção de que o viés é confortável de apreciação do real frente ao dólar seguramente teriam mantido a posição para liquidá-las com lucro maior, se não o fizeram é porque a convicção é frágil.
Por outro lado, após o mês de dezembro com substantivo volume de saídas de recursos financeiros na ordem de US$ 14,6 Bi, registrando fluxo cambial negativo de US$ 12,7 Bi naquele mês, os bancos autorizados a operar em câmbio passaram a acumular posição vendida total (vendas a descoberto) de US$ 26,1 Bi até o dia 4 de janeiro último, que estão ancoradas por tão somente US$ 12,2 Bi de linhas de financiamento em moeda estrangeira com recompra concedidas pelo BC, sendo que a diferença deva estar ancorada por linhas externas de banqueiros correspondentes.
O montante de posição vendida de US$ 26,1 Bi é expressivo e esta para ser coberta precisa de fluxo cambial positivo, o que não vem ocorrendo, até porque há retração face às expectativas de investidores estrangeiros na Bovespa ao início do ano, sinalizando que estão observando a materialização de medidas pelo novo governo brasileiro, visto que as grandes questões persistem e a economia real está fragilizada. A Bovespa está subindo como consequência dos investidores locais, e isto faz com que o movimento ainda não possa ser considerado sustentável.
É absolutamente improvável que o BC promova oferta efetiva de dólares das reservas para cobrir as posições dos bancos caso a adversidade do fluxo cambial persista, até porque seria um fato com extremos ruídos negativos num ambiente em que o país tem absoluta tranquilidade face as contas externas equilibradas, adequado déficit em transações correntes e soberbo estoque de reservas cambiais.
O quadro poderá induzir o BC a realizar oferta maior de linhas de financiamento em moeda estrangeira com recompra para dar suporte a este quadro pontual que se observa no momento.
Naturalmente, estrategicamente esta exposição de posição vendida deve estar adequadamente protegida por derivativos, mas é um fator de contingenciamento do preço da moeda americana nos parâmetros atuais, não interessando nem a apreciação e nem a depreciação do real frente ao dólar, mas sim a manutenção em torno de R$ 3,70, que é tecnicamente a taxa compatível com o momento atual.
É imperativo que sejamos céticos ao observar o momento atual focando o efetivo quadro da economia real e todos os desafios postos ao atual governo para superar as questões centrais e que além de grandiosos demandarão um período que a ansiedade deseja curto, mas que certamente será longo.
Por outro lado, o mercado global já sinaliza menor expansão, e até desaceleração, este ano de uma forma quase unânime pelas inúmeras fontes, e há dúvidas e incertezas em torno das questões comerciais China-USA, Brexit-U.E. , política de juro do FED americano, etc…
O conjunto de contextos interno e externo poderá não promover todos os benefícios e promissores sinais acreditados pelos emergentes, como o Brasil, em 2019, por isso não é boa política colocar a euforia antecipada sobre a necessária sensatez.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO