Dólar – complexidade e desinformação viabilizam ocorrência da especulação presente

Há inúmeros vetores de influência na formação do preço da moeda americana no mundo, e no Brasil que é um país emergente sujeito às intempéries das mais diversas origens, alguns a mais devido a fragilidades pontuais.

O câmbio habitualmente é o sensor mais rápido quando há sinais de que as coisas no país não vão bem e repercutem de imediato a sua fragilidade e vulnerabilidade perante o mundo, até porque os países emergentes, quase sempre, detém contas externas insuficientes face aos seus compromissos externos, o que os torna muito dependentes.

O Brasil em 2002 tinha uma situação de contas externas muito fragilizadas, pois até então nunca fora um país com substantivas reservas cambiais, o que o levou nas últimas décadas a ter enormes e difíceis negociações com os órgãos internacionais para financiar e refinanciar seus passivos até impagáveis em certas ocasiões.

Contudo, por mudança de estratégia o país através o aumento significativo da dívida pública, e não com superávits fiscais como seria natural, aproveitando um período muito favorável para as commodities que fomentaram grande fluxo de dólares para o país, afora o fluxo de investidores estrangeiros, entesourou um grande volume de recursos em dólares construindo soberbo volume de reservas cambiais.

Esta mudança altamente relevante, embora a custo alto pelo carregamento do passivo criado com aumento da dívida pública, promoveu um fortalecimento sem precedente na questão cambial, deixando o país numa situação de absoluto conforto e solidez, imune a ocorrência de crise cambial.

Os números deste potencial construído pelo país são disponibilizados pelo Banco Central do Brasil com extrema clareza no seu site na internet, de acesso público.

A expressividade das reservas cambiais, algo que não existia em 2002, mas que é a realidade do país em 2018, permite que o país esteja absolutamente imune a qualquer risco de crise cambial.

Valendo-se do seu lastro de reservas o BC tem operacionalizado a venda de contratos de swaps cambiais destinados a prover de proteção cambial os detentores no país de passivos em moeda estrangeira, e mais, dar liquidez ao mercado de câmbio à vista nos momentos de aumento da demanda por intensificação do volume de saídas de recursos do país.

O Brasil tem atualmente US$ 380,0 Bi de reservas cambiais, volume muito superior ao passivo do país, e tem mecanismos estratégicos operacionais para atuar no mercado de câmbio com absoluta credibilidade, sem mesmo reduzi-las em termos de liquidez internacional.

Por isso, embora o ambiente em alguns emergentes esteja confuso e preocupante na questão cambial, reservas e liquidez, o Brasil está extremamente à margem das consequências mais imediatas.

O Brasil é um emergente diferente neste quesito.

É uma situação extremamente contraditória, pois estando o país numa situação econômica bastante degradada, com reflexos diretos e negativos na questão fiscal, trabalho, renda e consumo, tem em contrapartida uma sólida posição nas suas contas externas, com déficit em transações correntes de tão somente 0,7% do PIB.

Não há quaisquer riscos de podermos ser confundidos com Argentina e Turquia e nem admitir qualquer sinergia do quadro atual com o prevalecente em 2002.

Mas a despeito da disponibilidade e acesso aos dados tabulados pelo Banco Central do Brasil, com total transparência e riqueza de detalhes, do volume de reservas cambiais que o país dispõe e a viabilidade de operações bem estruturadas para prover o mercado de câmbio, sem tensões, em todas as suas demandas, a realidade é que a grande maioria da população brasileira se nutre dos “achismos” em torno do assunto e não conhece a efetiva realidade e seus mecanismos, amplamente disponibilizados pelo BC.

Assim, acreditam em lendas e não se apercebem da realidade.

Este grau de desinformação sobre as minudências no entorno do câmbio no Brasil torna fácil a propagação de temores e situações absolutamente improcedentes, chegando ao cúmulo de requentar a visão do ocorrido em 2002 e identificar sinergia com 2018, ou correlacionar a situação da Argentina e Turquia com o Brasil, e catalisar supostos efeitos da guerra comercial entre Estados Unidos e China como promovedores de impactos imediatos no país.

Enfim, é uma gama de achismos e ilações infundadas que alimentam um ambiente predominantemente leigo quanto aos fundamentos do mercado de câmbio, que desta forma acreditam no que ouvem e desta forma, permite que aqueles que conhecem a fundo o assunto desenvolvam movimentos especulativos e crenças falsas de vulnerabilidades do país.

Então temores e tensões são fortalecidos e se cria o ambiente propício para dinamizar a especulação. E a partir o efeito “bola de neve” promove a propulsão da especulação aviltando o preço do dólar.

É neste momento que apontamos a omissão da comunicação do BC que, naturalmente, não deve intervir no mercado, pois acabaria validando um movimento sem fundamentos tornando-o crível, mas que deveria massificar suas manifestações visando esvaziar com argumentos e demonstrações de dados o movimento presente.

Então, quando os “motivos e razões” que alicerçaram os temores e tensões vão perdendo consistência e relevância como começa a ocorrer agora, o movimento especulativo tende a se deteriorar de forma gradual, ou quem sabe, podendo ser até abrupto.

Temos salientado exaustivamente que o quadro cambial do país está imune á crise cambial, já expusemos todos os números que fundamentam a afirmativa, e com base nas evidências concretas temos asseverado que seja quem for eleito Presidente do Brasil a situação cambial do país continuará imune.

Dúvidas e incertezas podem estar no radar com foco sobre a atividade econômica, crise fiscal, emprego, renda, consumo, etc., mas, no câmbio, por mais contraditório que possa parecer, o Brasil está muito bem e defendido.

Na medida em que os forjados temores e tensões utilizados para transformar o preço do dólar em sensibilizador de algo inexistente vão sendo desfeitos e/ou desacreditados, surge a insustentabilidade do quadro e então o preço da moeda americana, ainda que gradual passa a recuar.

Consideramos que o BC trabalha também com esta visão, razão pela qual não alterou a SELIC, considerando que a ocorrência do movimento especulativo sobre o dólar foi um evento episódico e que também não impactará sobre a inflação tanto quanto se vem prognosticando.

E, acreditamos, que veremos doravante o preço do dólar voltando ao entorno de R$ 3,80.


Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO

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