Após despender quase 10% das reservas cambiais brasileiras (US$ 36,861 Bi) equacionando o déficit do fluxo cambial em 2019 de US$ 44,768 Bi, a autoridade monetária desde 26 de dezembro passado interrompeu suas intervenções no mercado de câmbio e o preço da moeda americana que havia recuado a R$ 4,01, com volatilidade, voltou a aproximar-se do R$ 4,20.
É possível admitir que o BC tenha certa frustração com o fato de ter comprometido parcela significativa das reservas cambiais e não ter logrado sucesso em conter a disfuncionalidade no preço da moeda, embora tenha gerado liquidez para o mercado à vista de câmbio, que, contudo, não repercutiu esta equalização (fluxo negativo/oferta de liquidez) devido a conjugação com oferta de swaps cambiais reversos impediu que o fato corrigisse o preço o preço aviltado, que dá sustentação ao preço.
A este tipo de intervenção se nomina como neutra, mas a dúvida que persiste é sobre a correção desta forma de intervenção naquele momento em que a taxa cambial apresentava disfunção decorrente de fluxo cambial, ao qual cabia ao BC suprir a deficiência com as reservas cambiais.
Certamente, o BC não deseja, a despeito de ter até anunciado que continuaria a intervenção em 2020, continuar fazendo mais do mesmo, notoriamente sem obter resultados efetivos, até porque os 10% despendidos das reservas cambiais passaram a ser observados de forma mais crítica.
O mercado de câmbio é um segmento complexo do mercado financeiro e surgindo oportunidades surgem os focos especulativos rapidamente e criam atipicidades no comportamento dos preços.
As perspectivas para o Brasil 2020 eram extremamente otimistas e além de sinalizarem crescimento do PIB da ordem de 2,5%, fomentaram expectativa de os fluxos de investidores estrangeiros ganhasse intensidade logo a partir do início do ano, primeiro para a Bovespa e depois para investimentos dentro do programa de privatizações estruturado pelo governo.
Sabidamente, grande parte dos recursos financeiros que deixaram o país o ano passado tinham a característica de especulativos e sofreram frustração com a queda acentuada do juro, que inviabilizou o “carry trade”, e a dinâmica da atividade econômica que só se fortaleceu mais próximo do final do ano.
Muito provavelmente o BC, como grande parte do mercado, aguardava intensificação do fluxo cambial, mas até o último dia 15 deste mês houve a saída de R$ 5,9 Bi de recursos da Bovespa e o dólar com o seu “preço solto” ficou a mercê da especulação e valorizou-se quase 4% colocando o real com o pior desempenho dentre 33 rivais.
Há fundamentos para estes movimentos?
Certamente não, embora a dinâmica da atividade econômica tenha revelado números menos alvissareiros, mas não frustrantes, e o Brasil tem reservas cambiais suficientes para conter qualquer risco de crise cambial.
A alta exponencial de R$ 4,01 para R$ 4,20 pode ter sido provocativa por parte dos especuladores para “chamar” o BC para o mercado da forma que vinha praticando as intervenções, mas a autoridade monetária parece que não deseja fazer mais do mesmo.
O ambiente externo, ao qual eram atribuídas as repercussões no preço da moeda americana no nosso mercado, entrou em temporada de calmaria e então o dólar ficou com a formação do preço à mercê das condições internas do país.
Havendo fluxo cambial negativo é necessário que o BC realize intervenção objetiva, somente ofertando liquidez no mercado à vista, corrigindo a disfunção diretamente, simples assim, até que o fluxo cambial se revele positivo de forma consistente, nada que conjugar o mercado de moeda efetiva, que é o que falta, com derivativos.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO