“Dólar alto” está perdendo sustentação “muito alto”, tende a ceder!

É inquestionável que o “câmbio alto juro baixo” é parte integrante do programa de governo e foi incentivado com o objetivo de “baratear” o país ao investimento externo, motivar o setor exportador e seus investimentos, tornar os programas de privatizações atraentes, etc…, focando a geração de emprego e renda, numa estratégia reabilitadora da atividade econômica que se mostrava combalida, lenta e contrariando as expectativas governamentais.

Efetivamente, não parece ter logrado os anseios maiores, a despeito dos benefícios para o agronegócio e para o governo que vendeu parte diminuta das reservas cambiais a preço aviltado e com o juro baixo, consequente da inércia irrecuperável da atividade econômica com reduzida inflação, aliviou o custo de carregamento da Dívida Pública.

Muito pouco face à abrupta mudança e o discurso governamental eloquente.

Na realidade o governo foi um bom “trader” e é possível acreditar que desejaria vender mais reservas cambiais a preço aviltado do que conseguiu efetivamente, pois isto teria reduzido a Dívida Pública de forma real e irreversível.

Neste “ínterim motivacional” desde a virada do ano com o preço do dólar em R$ 4,00, arrastado por especulação que tomou carona no discurso estimulador do governo o preço chegou a indesejáveis R$ 6,00, assustou e impôs ao BC intervenção retórica e também efetiva mais contundente que o trouxe ao intervalo de R$ 5,00 a R$ 5,50, que parecia tranquila e sustentável,  mas que neste momento evidencia ser mais tendente à proximidade R$ 5,00, já que face ao cenário externo e ao ambiente interno calmo em torno das demandas previstas para o mercado de câmbio a vista, podemos até afirmar que mesmo assim ainda estará “alto”, provavelmente agregando na precificação já os impactos da deteriorada situação fiscal do país.

Apostar contra o real na atualidade pode ser efetivamente um mau negócio e a tendência é acentuar o desmonte de posições nesta linha.

Na realidade ocorre a fragilização dos alicerces em que foi montada a tese do câmbio alto, que não tendo gerado os benefícios maiores objetivados, nesta altura pode exercer pressão contributiva contrária ao juro baixo, ao ser fomentador de inflação.  

Há muitas incertezas ao longo deste quadrimestre que se inicia, e embora a queda do PIB de 9,7% no 2º trimestre após 2,5% (revisado) no 1º trimestre, tenha sido recebida com tranquilidade, é importante não se perder de vista que “caiu pouco porque já estava no chão na pré-pandemia”, algo como 1% positivo em 2019.

Internamente apurada a dimensão da queda do PIB já se realizam revisões nas perspectivas para o 2º semestre deste ano, que resulta  como mediana queda de 5,3% no ano,  prospectando uma coletânea de melhoras em quais assentam o otimismo, menosprezando contudo alguns riscos efetivos e relevantes na trajetória, como o risco fiscal presente que é neutralizante as ações de governo em áreas fundamentais e também a redução dos programas assistenciais emergenciais  do governo que tem suprido com renda e capacidade de consumo uma expressiva massa de beneficiários carentes, e que deverá ter reflexos na demanda no varejo e por conseguinte na indústria.

Romper o teto de gastos, seja com qual “bicicleta” for, será um risco relevante que poderá atingir o driver mais importante que é o juro baixo, que já tem curva insinuando fragilização em outubro e que dá relevância  a declaração do Ministro Guedes “condições para rolagem da dívida estão se agravando”, que é um sinal ruim.

Oportunisticamente o Ministro Guedes “planta” a percepção de que há sinalização de recuperação em “V”, mas como consideramos que a base antecedente é muito fraca para promover reimpulsão rápida preferimos continuar avaliando que a colocação do Presidente do BC, Campos Neto, de que poderá ser em “V mais aberto”, que traduzido deve ser igual a “U”, portanto mais lenta e gradual, sendo plausível admitir-se que o “novo normal” do consumo, excluído o consequente dos programas assistenciais, será bem diferente do antecedente à pandemia e, face à experiência vivida, pelo menos em princípio a população deve acentuar a poupança de recursos e não o dispêndio.

Será interessante observarmos as novas projeções, normalmente menos contaminadas por anseios normais internos, do FMI e do Banco Mundial após a divulgação do PIB do 2º trimestre do Brasil, que estavam para o ano em 9,1% e 8,0% respectivamente.

Com a atividade econômica em frangalhos e sem homogeneidade e perspectivas sustentáveis, certamente, os recursos estrangeiros, seja para investimentos em conta capital seja em renda variável, não sentirão atratividade no país.

Nossa visão a respeito da Bovespa não é otimista em relação a este quadrimestre final do ano. A economia como um todo não ajuda e a Bovespa já foi beneficiada por expressivo volume de recursos de investidores pessoas físicas deslocados da renda fixa para a variável e não encontrou sustentabilidade para a “grande arrancada” tão decantada e, agora, pode ter até um refluxo deste capital para a renda fixa debilitada por não ter “entregue as expectativas”.

Ocorrem “espasmos” ancorados em anúncios do governo, tais como programa de privatizações, reforma tributária e, agora, reforma administrativa, mas a gestão dos mesmos e tramitação política não tem a rapidez que se buscar repercutir no mercado financeiro, em especial Bovespa.

No fundo o que predomina é  certa tensão sobre como o governo vai equacionar a absoluta necessidade de manter o auxílio emergencial à população carente, também por interesses políticos, sem extrapolar o teto orçamentário, num ambiente de “cobertor curtíssimo”.

O Brasil está precisando de perspectivas novas e contundentes e, em realidade, não há esta percepção no curto prazo.


Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO

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