O comportamento do mercado de câmbio ainda não sugere necessidade de quaisquer intervenções por parte do BC, a recuperação de preço da moeda americana ocorrida ontem decorreu do realinhamento do preço aos fundamentos presentes, dos quais, inexplicavelmente, se afastou na última sexta e terça feira, já que tanto o ambiente externo com o dólar em alta no exterior, com a melhora acentuada do mercado americano por causas próprias dos Estados Unidos, quanto interno com as impertinências jurídico-politicas não sugeriam que ocorresse apreciação do real frente a moeda americana.
Mas ocorreu sem que houvesse fundamento evidente para tanto e ontem o preço foi recomposto face à realidade presente que impacta na sua formação, de vez que o dólar manteve a tendência de valorização ante a cesta das 6 principais divisas do mercado global, com o índice dólar em torno de 94,51 alta de 0,70%.
Certamente, haverá quem atribua o fato ao reaquecimento da disputa comercial entre Estados Unidos e China, mas o fato é que este embate não sofreu esfriamento em nenhum momento desde que iniciado, está e tem estado no radar do mercado internacional e já está relativamente precificado.
Na margem desta disputa, em que normalmente ambas as partes tendem a perder, o comércio internacional observa e avalia suas repercussões nos vários segmentos.
Como temos salientado, entendemos que o equilíbrio do preço do dólar nesta fase, considerando os fatores de influência, está entre R$ 3,85/R$ 3,95 e é para este intervalo que voltou de forma natural ontem.
Exacerbação para além deste parâmetro será factível se houver acirramento em torno da sucessão presidencial que gere maior insegurança.
Mais uma vez salientamos que o Brasil é neste momento um emergente diferenciado para pior, pois tem um ambiente reversivo de todas as projeções otimistas propagadas anteriormente e que não se sustentaram, trazendo a cena fragilidade substantiva da atividade econômica e todas as suas consequências em cadeia, como não recuperação do emprego, renda e consumo, e pior com sinais contundentes de retorno acima da expectativa da inflação, agravamento da crise fiscal e um imbróglio cada vez mais intenso em torno da eleição de sucessão presidencial e muita insegurança jurídica no entorno desta questão.
O fluxo cambial divulgado pelo BC até o dia 6 indica que está positivo tanto no comercial quanto no financeiro. No total está positivo em US$ 2,03 Bi, dos quais US$ 1,7 Bi no segmento financeiro, o que revela que não há nenhuma pressão de demanda mais acentuada no mercado à vista.
O BC mantém um total de US$ 2,925 Bi de linhas de financiamentos em moeda estrangeira com recompra concedida aos bancos no mês passado, que no último dia 6 detinham posições vendidas no total de US$1,368 Bi.
O BC deve manter a rotina de rolar 14.000 contratos de swaps de posição vincenda próxima, e continuar a “assistir sem intervir”, pois seria ineficaz enquanto não for observado aumento de demanda no mercado a vista, já que tudo leva a crer que o mercado está bem atendido, até com excesso, não demandando contratos de swaps cambiais novos, a menos que perceba presença de algum movimento especulativo.
Profilaticamente, não como necessário, poder-se-ia admitir que o BC realize leilão de linha de financiamento em moeda estrangeira com recompra focando deixar o mercado à vista bem líquido com antecedência e com isto balizando melhor os parâmetros de preço.
Contudo, é absolutamente razoável admitir-se que ao final deste mês e início de agosto ocorra à intensificação de saída de recursos do país, movimento que vem sendo retardado visto que estão protegidos por “hedge”, mas que previdentemente deverão sair para mitigar riscos que se acentuarão com a proximidade do momento das definições mais agudas em torno do processo sucessório.
Evidentemente há muitos analistas, nacionais e internacionais, que sugerem que com a queda a Bovespa se torna atraente, porém o grau de dúvidas e incertezas deverá se acentuar o que, face ao risco, deverá impulsionar o “fly to Quality” para o mercado americano de grande parte dos recursos estrangeiros aplicados no Brasil.
Entendemos que o cenário inflacionário tende a aquecimento e isto coloca no radar para observação a possibilidade do COPOM vir a elevar a taxa SELIC, que acreditamos poderá fechar o ano no centro da meta ou até um pouco mais.
O quadro cambial para o Brasil parece bastante claro. O país não tem o risco de crise cambial, mas como existem fatores imponderáveis os mais diversos o BC não tem como evitar os impactos dos mesmos na formação do preço, cabendo-lhe prover de liquidez o mercado, mas com baixa capacidade de interferência na formação do preço da moeda americana.
E esta percepção por parte da autoridade monetária parece bastante evidente, razão pela qual não tem atuado com intervenções como muitos esperavam, e, certamente somente realizará intervenção quando os fatores presentes forem sensíveis a suas ações.
Sidnei Moura Nehme
Economista e Diretor Executivo da NGO