Câmbio: Maio deixa motivos para reflexões e sinais ruins

O câmbio e o seu preço devem ser em princípio, a síntese mais transparente resultante da influência de inúmeros fatores internos e externos na economia do país.

A rigor, deveria ser o sensor principal do quadro macroeconômico do país, mas, às vezes, como ocorre no Brasil, atualmente, não expressa bem o “status quo” sinérgico com a realidade.

O país registrou fluxo cambial acumulado negativo no ano passado da ordem de US$ 18,0 Bi que representava efetiva insuficiência de ingressos, correspondendo a um comprometimento em torno de 5% das suas reservas cambiais, momentaneamente suportado por posições passivas (vendidas à descoberto) dos bancos, que, no primeiro momento, tinham como financiador a própria autoridade monetária, o BC, que assim não assumia diretamente o comprometimento transparente das reservas cambiais, certamente, esperando que os fluxos em 2014 melhorassem e pudessem dar uma solução de mercado para a insuficiência de fluxos registrada em 2013, zerando as posições à descoberto dos bancos.

Mas, embora assumida esta insuficiência pelos bancos, estrategicamente evitando que o BC tivesse que fazer leilões de venda de divisas efetivas ao mercado à vista, reduzindo as reservas cambiais brasileiras de forma inequívoca, o fato concreto é que o país tinha uma insuficiência de ingressos que já comprometia o equivalente a 5% das reservas cambiais.

O Brasil registrou até o dia 23 ingressos de US$ 287,0 Bi e saídas concomitantes de US$ 283,0 Bi, obtendo fluxo cambial positivo de US$ 3,4 Bi, dos quais US$ 1,1 Bi de origem financeira, o que é muitíssimo pouco, considerando-se ainda que nos US$ 287,0 Bi há expressivo montante de capitais especulativos, que a rigor tem curta permanência no país.

Com este discreto fluxo cambial positivo de US$ 3,4 Bi, as posições passivas dos bancos foram reduzidas para US$ 15,0 Bi, algo como 4% das reservas cambiais brasileiras.

Contudo, já ocorrem sinais de reversão dos capitais especulativos ingressados e direcionados para a Bovespa e para o mercado de renda fixa, sendo que para este segmento houve ingressos no 1º trimestre da ordem de US$ 4,0 Bi/mês e abril já recuou para US$ 1,6 Bi e maio estava até o dia 21 com saldo negativo de US$ 261,0 M.

O BC já constatou este movimento reversivo, confirmado pela redução da demanda de “hedge” através as ofertas de contratos de “swaps cambiais”. Deixará de rolar em maio US$ 4,5 Bi da posição vincenda em 2 de junho no total de US$ 9,6 Bi, e assim mesmo tudo leva a crer que deverá interromper o seu programa de oferta diária de 4.000 contratos de “swaps cambiais” novos vincendo em 30 de junho próximo, passando a controlar a oferta a partir das rolagens nos montantes compatíveis com a demanda, que tende a ser cada vez menor.

Este é um sinal consistente de que os fluxos de ingressos já são menores do que os fluxos de saídas. Maio deverá ter fluxo cambial negativo no total, mas é importante observar que em abril o fluxo cambial financeiro já foi negativo.

Há efetiva probabilidade de que os fluxos cambiais mensais se tornem negativos até o final do ano, pois deverá ocorrer a reversão dos fluxos especulativos ingressados no país ao longo do 1º trimestre, tendo em vista ser a permanência breve a característica típica dos recursos especulativos forjados a partir da estratégia de “carry trade”, que também não convive bem em ambientes com às incertezas crescentes, como é o caso do Brasil no momento.

Este movimento já deverá impor elevação da insuficiência de fluxos para o Brasil, afetando as posições vendidas por parte dos bancos, que precisarão ter motivação de arbitragem favorável para que as ampliem e isto é incerto, caso contrário o BC precisará então fazer oferta efetiva de dólares via leilão de venda ao mercado.

Esta é uma atitude que o BC tem evitado assumir, pois a realização de leilões de venda ao mercado a vista deixará evidente e transparente a insuficiência de ingressos de recursos pelo país, obrigando-o a utilizar suas reservas cambiais, e, isto poderá fomentar movimentos especulativos sobre o real, sob o argumento da vulnerabilidade.

Parece-nos um equivoco nutrir expectativas de que o plano de incentivo monetário, se deflagrado pelo BCE visando a reativação da atividade econômica na euro zona, venha a promover outra onda de fluxos de recursos externos para o Brasil.

O mercado internacional parece já ter “carimbado” o destino predominante destes recursos, ou seja, os T-Bills do governo americano, opção pela garantia e qualidade de risco.

Também, não se deve ter a ilusória visão de que a queda de 1,0% no PIB americano no 1º trimestre ante projeção de 0,5% fragilizará a sua moeda, o dólar, de forma duradoura. Primeiro, porque a economia americana demonstra recuperação e já há projeções de crescimento do PIB americano a partir do 2º trimestre ao ritmo de 3,5%, e predomina o entendimento de que o resultado do 1º trimestre decorreu dos problemas climáticos que afetaram o país.

 Por outro lado, com o forte direcionamento de recursos para os T-Bills, que até já repercutiram com alta dos preços e queda forte do juro “yeld” para 2,44%, o dólar passará a ser demandado o que o valorizará em detrimento das demais moedas.

O Brasil será beneficiado pelo programa europeu pelo fato do juro “yeld” dos T-Bills americanos sofrer forte queda, o que posterga a saída de recursos de “melhor qualidade (não especulativo) ”, aqui locados em direção do mercado americano, o que é esperado para quando o FED alterar sua política monetária e elevar o juro. Assim, na melhor o plano do BCE retardará face as repercussões no mercado internacional a saída adicional de recursos não especulativos do Brasil, mas, não deve promover aumento de fluxo de recursos para o país.

Precisamos atentar para a realidade de que o Brasil com seu “status quo” é o grande empecilho para ele próprio e deixarmos de atribuir ao exterior os nossos problemas e comportamentos dos vários segmentos como câmbio, Bovespa, juros, etc.

O país tem um desempenho pífio de balança comercial com tendência de fechar o acumulado até maio em US$ 6,0 Bi negativos, é um exportador agrícola altamente dependente do comportamento da China e sem força exportadora nos manufaturados.

Investimentos externos?

Não dá para ser otimista. Temos um fato novo relevante. Notoriamente empresários e consumidores estão assumindo um estado de desânimo e isto tende a causar impactos nas projeções atuais do crescimento do PIB. Há uma sensação de que 2014 já faz parte do passado e assim é melhor esperar 2015.

O Índice de Confiança da Indústria (ICI) da FGV aponta recuo de 5,1% entre abril e maio deste ano. O Índice de Confiança de Serviços (ICS) também da FGV aponta recuo de 5,7% também entre abril e maio deste ano. O Índice de Confiança do Comércio (Icom) também da FGV apontou queda de 4,4% no trimestre até maio frente ao mesmo período de 2013, sendo o 3º mês consecutivo de piora nessa base de comparação. Até na construção o ICST da FGV aprofundou a queda registrando 9,8% em maio, 5,9% em abril e 3,3% em março.

A inflação está discretamente abaixo do teto da meta, mesmo com a elevação da SELIC ao longo do ano, interrompida na reunião com a manutenção em 11%, mas não quer dizer que não haja possibilidade de nova alta ainda neste ano, e, além disto, não tem sido menos importante a utilização da indução com sucesso da apreciação do real para ser coadjuvante da política de juro no enfrentamento das pressões inflacionárias.

O superávit fiscal que é um indicador muito observado pelos estrangeiros e agências de “rating” atingiu 1,81% com a postergação de pagamentos de despesas, e, o governo reviu esta projeção com uma série de comprometimentos, para 1,9%, e não está conseguindo cumprir com tranquilidade.

É bem provável que a projeção do governo de alcançar US$ 63,0 Bi de IED´s não seja alcançada neste ano, pois o país perde continuadamente atratividade ao investidor na conta capital.

O crescimento do PIB no 1º trimestre alcançou 0,2% em relação ao trimestre anterior e 1,9% em relação ao mesmo período de 2013 e já há projeções prevendo não crescimento no 2º trimestre, o que levará a novas projeções mais baixas de crescimento do PIB anual.

Déficit em transações correntes?

Tem um ritmo acelerado, sugerindo que possa alcançar ou até mais do que os US$ 80,0 Bi projetados pelo governo.

Os indicadores de todas as naturezas não sugerem otimismos, sendo que o negativismo decorre de perspectivas ruins bastante criveis e amplamente factíveis.

Este ano é eleitoral e momento está sinalizando que tudo poderá ficar estagnado esperando o ano que vem, e o setor externo poderá ser muito perturbador ao longo dos 7 meses que faltam para completar o ano.

Dólar a R$ 2,22 é cada vez mais uma absoluta irrealidade ante o momento e as perspectivas para o país no setor externo.

Atribuir-se o fato da taxa estar neste patamar a fluxos, etc, é desconsiderar e relegar a plano secundário a realidade de que o país tem no momento US$ 15,0 Bi de fluxo insuficiente que está sendo carregado nas posições vendidas dos bancos, sem perspectivas que o país encontre a solução no próprio mercado com a melhora dos ingressos.

 

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