BC: Política cambial requer mais foco do que política monetária

O Banco Central do Brasil, costumeiramente, faz referência ao empenho em fazer convergir a inflação para o centro da meta de inflação, e nas reuniões do COPOM expõe, ainda que não de forma objetiva, quais as perspectivas e condicionantes sobre os próximos passos, o que, por vezes, provoca interpretações diversas por parte dos analistas, mais ainda assim permite ilações e interpretações em torno do tema, que acaba se afunilando em opinião mais efetiva e relativamente consolidada e consensual às vésperas da nova reunião do COPOM.

Basicamente foca a política monetária, deixa de lado a política cambial, porém a utiliza de forma contundente como instrumento coadjuvante, até por vezes como principal, da política monetária para coibir a expansão dos fatores de pressão inflacionária.

Mas, o Brasil tem este ano o setor externo como um fator que pode comprometer de forma substantiva os esforços da política monetária, podendo causar muitas trepidações até o final do ano.

A rigor, o setor externo já despontava preocupante desde o inicio do ano, visto que havia fechado 2013 com fluxos de recursos para o país insuficientes para cobrir o déficit em transações correntes. Tivemos US$ 64,0 Bi de ingressos de IED´s mesclados por IED´s efetivos e empréstimos “intercompanies”, enquanto o déficit em transações correntes suplantava os US$ 81,0 Bi.

O fluxo cambial fechado em 2013 ficou negativo em US$ 18,124 Bi, sendo que US$ 6,069 Bi inclusos já migrara de 2012 para 2013.

Fluxo de recursos externos insuficientes para financiar o déficit em transações correntes, que, em principio, deveriam ter sido cobertos no mercado à vista, mediante leilões de venda pelo BC de parte das reservas brasileiras para gerar liquidez.

O BC resolveu adotar linha alternativa transitória para resolver o problema. Fez com que os bancos gerassem a liquidez e deu ancoragem às posições vendidas (vendas a descoberto) assumidas pelos bancos com a concessão de linhas de financiamentos em moeda americana a partir das reservas cambiais brasileiras. Com esta estratégia tem postergado a necessidade de ter que dispor definitivamente de parte das reservas cambiais, esperando provável melhora de fluxos para o Brasil em 2014 que possa prover com solução de mercado o montante faltante de fluxo em 2013, mas tudo indica que não logrará sucesso nesta expectativa.

Adicionalmente, renovou parcialmente o programa de oferta diária de contratos de “swaps cambiais” diminuindo para 4.000 contratos e complementando a sua intervenção com a rolagem das posições vincendas destes mesmos instrumentos colocados anteriormente.

Com esta estratégia de intervenção e com os bancos com posições vendidas, o que os torna interessados, também, na apreciação do real para que com os reais oriundos da captação decorrente do posicionamento vendido, arbitrassem o custo das linhas de financiamento versus juro do cupom cambial.

Esta era para ser uma estratégia temporária, provavelmente com a expectativa de que pudessem melhorar os fluxos positivos de recursos externos para o Brasil.

A rigor, esta seria uma estratégia que no nosso ponto de vista teria “vida curta”, pois sempre tivemos uma perspectiva ruim para o setor externo brasileiro para 2014, baseado nos problemas internos do país que o faz pouco atraente aos investidores externos.

Contudo, como o FED americano, embora iniciando a redução de compras de títulos do mercado o que implica em redução gradual da liquidez, deixou transparecer que o ritmo de retomada de atividade econômica americana, principalmente o emprego, não atendiam a expectativa e portanto dando a entender que as mudanças (alta do juro) de política monetária aconteceriam somente no 2º semestre de 2015, ocorreu a possibilidade de montagem de operações de “carry trade” gerando capitais especulativos que fluíram para o Brasil atraídos outra vez pelo juro elevado que havia sido restabelecido e pelos preços das ações bastante baixos.

Este fluxo especulativo inquestionavelmente atenuou a evidência logo ao inicio do ano de que o nosso setor externo deve ter um perfil desafiador e comprometedor da política monetária este ano.

Com o fluxo melhorado, a forte intervenção excessiva do BC com oferta de swaps cambiais novos e rolagens e com os bancos como aliados em manter o real apreciado para tornar interessante manter posições vendidas face ao ganho de arbitragem, foi possível à autoridade monetária manter o real extremamente apreciado ante o dólar, e assim, os ruídos causados na Bovespa e no mercado de ações com estes recursos foi atribuída a causa da apreciação, não deixando transparecer a efetiva causa que era o excesso de intervenção do BC no mercado.

Afinal, até o dia 16 de maio ultimo ingressaram no país US$ 273,651 Bi, mas saíram US$ 270,168 Bi, quase imperceptíveis dado ao alarido em torno dos ingressos, e desta forma só restou um fluxo cambial positivo de US$ 3,483 Bi, dos quais somente US$ 1,649 Bi de origem financeira.

Assim, o fluxo cambial insuficiente migrado de 2013 para 2014 foi reduzido para US$ 14,641 Bi, que continuam sendo suportados pelas posições vendidas dos bancos, dos quais ainda US$ 10,401 Bi financiados pelo BC.

Ocorre que, os números do setor externo divulgados pelo BC são bastante preocupantes. O déficit em transações correntes de abril ficou negativo em US$ 8,291 Bi, acumulando no 1º quadrimestre US$ 33,476 Bi. Nos últimos 12 meses atingem US$ 81,075 Bi, algo como 3,64% do PIB, pior resultado desde 2001. Por outro lado, os IED´s em abril registraram somente US$ 5,233 Bi, insuficientes para financiar o déficit do mês. No 1º quadrimestre acumulam US$ 19,404 Bi. O déficit de US$ 33,476 Bi já supera os IED´s de US$ 19,404 Bi em US$ 14,072 Bi.

As projeções para os demais meses do ano não são favoráveis. O BC projeta o déficit em US$ 80,0 Bi e os IED´s em US$ 63,0 Bi, por enquanto um diferença de US$ 17,0 Bi, que, contudo, tem ampla possibilidade de ampliação.

Por outro lado, o país deverá ter a reversão do expressivo montante de capitais especulativos que ingressaram no país no 1º quadrimestre, e isto representará demanda. Este é o tipo de recurso de rápida permanência no país. Entraram recursos externos para a renda fixa de janeiro a março em média de US$ 4,0 Bi mês, caindo para US$ 1,6 Bi em abril e maio está negativo até o dia 21 em US$ 0,2 Bi, o que demonstra que já pode ter começado o movimento de saída.

O BC, por sua vez, aponta que a demanda por “swaps cambiais” é cadente e este tem sido o seu principal instrumento para induzir o real à apreciação e manter os bancos estimulados a continuar gerando a liquidez insuficiente no mercado à vista com posições vendidas lastreadas em financiamentos, principalmente do próprio BC. A queda é reflexo da redução nos ingressos, que assim diminui a demanda por swaps cambiais e acentua a demanda no mercado à vista, onde o segmento financeiro já está pelo segundo mês negativo.

Não acreditamos que eventuais programas de incentivo monetário da Europa e até mesmo o do Japão carreiem fluxos intensos de recursos para o Brasil.

Se os “swaps” perderem demanda e for reduzida a oferta, o preço do real tende a ser depreciado e isto pode tirar o interesse em manter as posições vendidas, pois pode exaurir a margem de ganho na arbitragem ao afetar o juro do cupom cambial.

Em razão disto, poderá haver mais um foco de pressão já que os bancos estão vendidos em US$ 14,641 Bi.

A balança comercial tem projeções ruins para este ano, pode ter saldo negativo, e ainda temos passivo liquido de comércio exterior a resgatar.

Ainda há em perspectiva possível elevação do juro americano, por enquanto para o ano que vem, mas se o juro dos T-Bills sofrerem elevação pode motivar novo deslocamento de recursos externos que aqui estão para o exterior.

As projeções atuais variam de R$ 2,45 (FOCUS) a R$ 2,60, projetam então correção do preço da moeda americana no nosso mercado entre 10% a 17%, o que é significativo faltando 7 meses para o término do ano.

O câmbio é algo muito sensível a qualquer tipo de comentário por parte do governo, porém o nível de apreciação do real é preocupante frente a inúmeros fatores de pressão altista em perspectiva.

O BC precisa abordar mais este tema, se não for por palavras então que seja por atitudes deixando o preço da moeda americana ir subindo gradualmente, já que nos parece algo irreversível este ano. É preciso falar menos focando o exterior, as causas presentes que exercerão pressão de apreciação do preço da moeda americana são preponderantemente internas.

Tudo leva a crer que haverá necessidade do BC intervir ofertando moeda efetiva ao mercado. Até o momento a autoridade tem evitado, mas com a baixa expectativa de melhora do fluxo cambial poderá se tornar inevitável.

 

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