Quando os espaços são pequenos para acomodar todos os interesses conflitantes, ocorrem abraços, mas também inúmeras cotoveladas, o que deixa claro que não se pode esperar quase nada de solução concreta da reunião do G-20, podendo haver…
Quando os espaços são pequenos para acomodar todos os interesses conflitantes, ocorrem abraços, mas também inúmeras cotoveladas, o que deixa claro que não se pode esperar quase nada de solução concreta da reunião do G-20, podendo haver convergências nos temas genéricos, mas nenhuma nos temas essenciais.
Divulga-se que os participantes estão costurando um acordo sobre “parâmetros indicativos” que possam cooperar em política cambial, monetária e comercial que sustentem a recuperação econômica e reequilibrem a demanda global. Pretensão pomposa mas claramente de difícil aplicabilidade já que na crise recente ficou evidente que os dados de inúmeros governos não eram críveis.
Este mais parece um objetivo de limitar o crescimento dos emergentes e em desenvolvimento, visando evitar a queda acentuada dos até a pouco grandes, desenvolvidos e inquestionáveis.
Enquanto o cenário econômico global favoreceu os ditos desenvolvidos nunca foi sugerido algo que os permitisse aos emergentes e em desenvolvimento avançar na direção dos grandes, mas agora parece que o temor é a ocorrência de inversão de posições.
Neste contexto, é oportuno observar-se as colocações recentes do ex-economista chefe do FMI, Raghuram Rajan, que sinalizam que “sem políticas adequadas, países hoje desenvolvidos poderão regredir a status inferiores de desenvolvimento”. Conhecido como profeta do infortúnio de fala mansa, Rajan, adicionou ” se não agirem para reparar rachaduras que ainda permeiam a economia mundial, condenarão o mundo a outra crise financeira devastadora”. Rajan tem a seu crédito o fato de em 2005 e 2006 ter expressado seus alertas visionários de que os riscos aumentavam para o sistema financeiro.
China e Estados Unidos se atacam às vésperas da reunião G-20 é destaque como notícia. Aqui, prevalecem as cotoveladas.
A China brada que os Estados Unidos devem se dar conta de sua responsabilidade e obrigações como país emissor de moeda de reserva e adotar políticas macroeconômicas responsáveis, alegando que a medida recente do FED de colocar mais US$ 600,0 Bi provocará liquidez excessiva nos emergentes, entendendo que ao contrário de 2008, quando os Estados Unidos adotaram medida semelhante, o mundo “não precisa de mais capital, e sim de confiança”.
Cautelarmente, a China já começou a adotar medidas para conter fluxos especulativos e aumento de liquidez, blindando-se, ainda mais, fortemente.
A China vem rejeitando propostas americanas de teto para superávit ou déficit em transações correntes, alegando que os desequilíbrios mundiais ocorrem por motivos “estruturais”.
Os Estados Unidos acusam os chineses de manipular a moeda e assim potencializar a sua participação no comércio exterior, construindo enormes reservas cambiais com os superávits comerciais, em detrimento das demais economias.
A Alemanha acusa ambos, China e Estados Unidos, por manipulação do câmbio, um por decisão governamental que mantém o Yuan desvalorizado e o outro pela emissão substantiva de dólares que inundam o mercado financeiro mundial e baixam artificialmente o dólar.
Todos reclamam dos Estados Unidos e da China, mas não confessam também os seus “pecados”, como o Brasil que, independentemente do aumento da liquidez em dólares nos mercados financeiros, já estimulava a apreciação da sua moeda, o real, para utilizá-la como antídoto das pressões inflacionárias. Além disto, se ocorre enxurrada de recursos para o Brasil é porque ofertamos rentabilidade acima dos parâmetros normais prevalecentes no mercado internacional, já que estes recursos buscam somente renda e não se destinam a investimentos produtivos.
Culpa nossa e não dos Estados Unidos.
Enfim, não há “inocentes” neste cenário global que envolve o G-20, mas a grande realidade é que o risco presente dos grandes ficarem menores e os menores ficarem grandes parecem ser o pano de fundo não dado a transparecer ainda por ser inconfessável pelos grandes, que normalmente tem mais espaço na mídia internacional, e todo o esforço parece focar conter a expansão desta inversão.
Os Estados Unidos busca desvalorizar sua moeda de forma a compensar o que a China realiza com o Yuan, e, assim, corremos o risco de ter não mais um concorrente “desleal” mas sim “dois”. E ao que parece, afora a retórica, nenhum dos dois está preocupado com os demais.
O quadro consequente é que cada país terá que amoldar-se a este cenário desestruturado e de difícil superação.
No curto prazo, o governo brasileiro precisa imediatamente colocar o BCB na linha de atuação focando o suporte do preço da moeda americana no nosso mercado, interrompendo a sua dinâmica indutora a apreciação do real através os leilões de compra que retiram mais do que o excedente. Além disto, deve restringir duramente os limites de transações com exposição a variação cambial dos bancos e a utilização de linhas externas que estão suportando as posições “vendidas” no mercado à vista.
A única forma de uma ação contundente do FSB ou do BCB comprando no mercado à vista revelar eficácia é limitando o acesso dos bancos as linhas externas que financiam as posições “vendidas” no mercado à vista, pois se não o fizer, como já mencionamos em outras oportunidades, resultará em maior apreciação do real, até porque, acreditamos, que os bancos disponham de maior volume de linhas externas do que o FSB de recursos para adquirir dólares.
A medida normativa correta é limitar o acesso dos bancos as linhas de financiamentos das posições “vendidas” e o BCB alterar a sua dinâmica de comprar além dos excedentes do fluxo cambial, portanto alinhando-se com o propósito que o governo vem alardeando fortemente.
Também pode tomar medidas normativas estimulando ou priorizando as captações externas em reais, já que os endividamentos das empresas sendo predominantemente de longo prazo, habitualmente estão “hedge” no curto prazo, expondo-as a riscos caso ocorra uma mudança abrupta de cenário externo, principalmente para aquelas que não são geradoras de dólares em suas transações. Bom para o país e preventivo para as empresas.
Nos parece oportuno também buscar equalizar mais as taxas de rentabilidade obtidas no país com as prevalecentes no exterior, através o agravamento do IOF e mesmo com a aplicação do IR.
Operacionalmente, o governo brasileiro não dispõe de instrumentos eficazes, salvo se estabelecer os normativos limitantes que mencionamos acima.
Acreditamos mesmo que o mercado esteja “alerta” para fatos novos, por isso houve uma depreciação do real ontem.
Contudo, será fundamental que o novo governo brasileiro direcione suas preocupações para o tripé fiscal – câmbio – juros, que precisa de mudanças radicais, para que o país possa, de forma natural, mudar o contexto atual e dar um novo perfil com rigor fiscal, câmbio equilibrado e juro compatível com um país “investment grade”.
Quando ocorrem insinuações de que os atuais membros destas áreas do governo poderão permanecer no novo governo, uma espécie de “ancoragem” a nova Presidente, o mercado fica cético sobre a efetivação da necessária mudança.
Mais do mesmo, provavelmente não dará certo, os ventos que ventavam a favor podem começar a ventar contra!